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Ativista indiana participa de vigília em homenagem a vítima de estupro coletivo, em Calcutá. A imagem é de 2012. | Dibyangshu Sarker/
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Ativista indiana participa de vigília em homenagem a vítima de estupro coletivo, em Calcutá. A imagem é de 2012.| Foto: Dibyangshu Sarker/ AFP

Um juiz indiano anulou a condenação por estupro de um famoso diretor, escritor e roteirista do país. A justificativa do magistrado foi de que um “não fraco” pode significar “sim” quando o assunto é sexo. O caso reacendeu, na Índia, o debate a respeito do significado de consentimento em casos de violência sexual.

No último dia 25, o juiz Ashutosh Kumar, que atua na Suprema Corte de Nova Deli, anulou a condenação por estupro de Mahmood Farooqui, considerado culpado, no ano passado, por ter estuprado, em sua casa, uma estudante universitária. Na decisão, Kumar anotou que o escritor “não fazia ideia” de que a suposta vítima não queria receber sexo oral, muito porque ela chegara, inclusive, a ter um orgasmo. 

De acordo com a decisão, a jovem foi apresentada a Farooqui em 2014 por uma amiga em comum, que esperava que o roteirista pudesse ajudá-la com seus estudos. A mulher é estudante na Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, mas passava um tempo na Índia após receber bolsa de estudos na Universidade de Deli. A vítima e Farooqui fizeram amizade e já haviam trocado beijos em duas ocasiões anteriores, de acordo com testemunhas. 

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Em 2015, a estudante foi até a casa de Farooqui, na capital indiana, por acreditar que acompanharia o diretor e sua esposa, Anusha Rizvi, também cineasta, a um casamento. Farooqui, porém – solitário e “tristonho”, segundo Kumar –, estava sozinho. Ele tentou beijar a jovem e implorou por sexo oral, colocando-se sobre ela. Assustada, ela contou ter fingido um orgasmo para que o ato acabasse logo. 

“Eu achei que você era meu amigo”, a mulher escreveu em um e-mail que enviou a Farooqui após a situação. “Mas você me manipulou. Você me machucou. Eu disse ‘não’. Eu disse ‘não’ várias vezes”. 

A jovem acabou retornando aos Estados Unidos, onde denunciou a situação junto à universidade. Quatro meses depois, voltou à Índia para o registro formal de um boletim de ocorrência policial. 

O juiz, na sentença, escreveu que era muito duvidoso que o incidente tivesse ocorrido conforme descrevera a vítima – ou seja, sem o consentimento dela. “Nessas circunstâncias, o benefício da dúvida deve ser concedido ao réu”. 

Segundo Kumar: 

“Há níveis do comportamento feminino que não são muito bem conhecidos. Um ‘não’ fraco pode significar um ‘sim’. Se os envolvidos são estranhos, talvez essa teoria não se aplique. Mas se são conhecidos, pessoas letradas, estudadas, com quem, no passado, já trocaram contato físico... Nesses casos, seria muito difícil entender se pouca ou nenhuma resistência acompanhada de um ‘não’ fraquinho seria uma negativa de consentimento”. 

“Eu estou preocupadíssima com essa linguagem. Trata-se de uma interpretação absolutamente incorreta acerca do significado de consentimento, que já foi definido oficialmente”, afirmou ao jornal Times of India a advogada Rebecca John. “Não é uma linguagem legal, mas também não é uma linguagem leiga. É só a mesma resposta misógina contra a qual lutamos há anos”. 

Do outro lado, amigos e admiradores de Farooqui, pertencentes à comunidade artística da Índia, celebraram a decisão judicial. 

“Toda a família e amigos de Mahmood Farooqui estão aliviados”, afirmou a esposa do diretor em um comunicado. “Nós seguimos a lei estritamente. Depositamos nossa fé no sistema judiciário do país. Ficamos chocados quando ele foi condenado e por isso levamos o caso à Suprema Corte. As evidências o absolveram”. 

Tradução: Mariana Balan.

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