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 | Keith Negley/
| Foto: Keith Negley/

A Escola Secundária de Palo Alto, uma das mais prestigiosas dos EUA, fica imprensada entre dois caminhos definidos e ilusórios.

A oeste, a Universidade Stanford atrai como o ideal platônico, um símbolo do caminho para o Google, para o sucesso fabuloso. A leste fica a estrada de ferro onde três meninos deste distrito escolar se suicidaram este ano.

O surto de suicídios é o segundo que ocorre nesta cidade. Cinco alunos ou recém-formados da Escola Secundária Gunn, na região, se mataram desde 2009.

Especialistas dizem que esses surtos, embora raros, geralmente ocorrem quando o suicídio parece um mecanismo viável para enfrentar a realidade.

Mas isso não impediu esta comunidade de refletir: a cultura de supervalorização das conquistas pessoais merece alguma culpa pelas mortes?

A resposta é complexa: não, a pressão para ter sucesso não é única, nem causa um surto de suicídios por si só, mas a intensa reflexão que ocorre aqui revelou uma realidade séria sobre como a cultura da conquista pessoal no Vale do Silício está influindo nas escolas.

Além de os estudantes sofrerem pressão para ter êxito, a cultura é intensificada por algo mais insidioso: o discurso contraditório de pais e diretores de escolas.

Muitas vezes eles usam a linguagem certa sobre querer que os estudantes sejam felizes, saudáveis e resistentes, disse Madeline Levine, uma psicóloga que trata executivos, trabalhadores e seus filhos deprimidos e com tendências suicidas.

“Eles dizem: ‘Só me importa que você seja feliz’, e depois o jovem chega em casa e a primeira pergunta é: ‘Como você foi na prova de matemática?’”, disse Levine.

Denise Pope, uma especialista em educação em Stanford, chama esse abismo entre o que as pessoas dizem e o que elas realmente pensam de “a mensagem oculta da criação de filhos”.

Mas aqui, e em muitas outras comunidades de alto nível de realização e escolas de todo lugar, segundo Pope, o que as crianças ouvem é a mensagem predominante de que só os melhores servirão.

“Em tudo”, disse ela. “Ouço estudantes dizerem que se não entrarem na faculdade X, Y ou Z acabarão fritando hambúrgueres no McDonald’s.”

Pope afirmou que essa ideia errônea se torna uma ameaça emocional e fisiológica quando multiplicada por pelo menos outros três fatores: a tecnologia, que faz os adolescentes estudarem e se sociabilizarem até tarde da noite, privando-os do descanso essencial; as crescentes obrigações das aulas de preparação para os exames e atividades extracurriculares; e pais ocupados demais para participar de atividades com suas famílias.

“Não somos adolescentes”, escreveu Carolyn Walworth, do terceiro ano na Escola Secundária de Palo Alto, em um editorial no jornal local sobre os suicídios.

Ela descreveu os estudantes como “corpos sem vida em um sistema que gera competição” e escreveu que já foi ao pronto-socorro para enfrentar o estresse, teve falta de menstruação e sofreu “um ataque de pânico no meio de uma classe de 30 pessoas, sendo obrigada a se controlar”.

Houve muitas conversas na comunidade sobre o que fazer, ela escreveu, mas nenhuma ação real. (O distrito está oferecendo serviços de aconselhamento e um kit de prevenção de suicídios, e pede que os professores limitem a carga das lições de casa.)

A jovem escreveu: “Somos o produto de uma geração de moradores de Palo Alto que querem desesperadamente que tenhamos sucesso, mas não compreendem nossas necessidades”.

Glenn McGee, o superintendente do distrito, também parecia lutar para manter o equilíbrio entre comemorar a situação excepcional dessa área e pedir que os estudantes se descontraíssem.

Sentado em seu escritório e olhando para o campus de Stanford do outro lado da rua, ele lamentou que alguns pais sintam que essa universidade seja o único caminho aceitável.

“Em muitos casos, as pessoas fizeram um grande sacrifício para viver nesta comunidade”, disse McGee, referindo-se aos custos exorbitantes da moradia (o preço médio de uma casa em 2014 era de US$ 3,3 milhões).

Caracterizando a atitude de muitos pais, McGee disse: “Resumindo: qual é o retorno do meu investimento?”

“Meu trabalho não é colocar vocês em Stanford”, ele disse que explica aos pais e alunos. “É ensiná-los a aprender a aprender, a pensar, a trabalhar em grupo, aprender a explorar, a colaborar, a ser curiosos e criativos.”

O padrão de sucesso acadêmico tornou-se tão elevado que mesmo um bom desempenho pode parecer medíocre. Há uma enorme pressão sobre a escola ou a comunidade quando uma grandeza tão consistente, em todos os níveis, se torna uma espécie de linha de partida —o que Alan Eagle, do Google, cujo filho está no terceiro ano em Gunn, descreve como uma cultura de “não apenas excelência, mas uberexcelência”.

Talvez isso explique em parte o discurso contraditório: os pais procuram uma linguagem para incentivar seus filhos e até pressioná-los, mas não esmagá-los.

Uma solução, segundo Pope, é “tempo de descanso e de brincadeira, tempo em família”. Para os pais também. Em outras palavras: dê um salto de fé (bem apoiado pela ciência) de que o tempo de descanso levará a uma perspectiva mais saudável.

O doutor Morton Silverman, psiquiatra e assessor científico do Centro de Recursos para Prevenção do Suicídio, uma instituição nacional, sugeriu que outra resposta é reconhecer que as mensagens dúbias também revelam uma sensação de terror do futuro entre estudantes e pais.

Com a economia em fluxo e as diferenças de renda crescentes, os pais não veem um caminho claro para a estabilidade financeira —mesmo aqui, e talvez especialmente aqui, onde as coisas se movem depressa e a concorrência é acirrada.

Além disso, muitas das fortunas feitas aqui se basearam na criação de coisas que desestabilizam as empresas tradicionais.

Silverman sugeriu que os pais deveriam dizer coisas como: “Não posso lhe dizer que caminho deve tomar ou como chegar lá, mas vou apoiá-lo”, disse ele. “Eu estou aqui para apoiá-lo.”

É uma mensagem difícil de se ouvir em um lugar como este. Caminhando perto da ferrovia onde as crianças se deitaram, McGee disse que esta é uma comunidade que deveria ter respostas.

“Podemos colocar sensores lá?”, ele me perguntou pensativo, talvez para alertar os maquinistas de que há alguém nos trilhos. “Este é o Vale do Silício. Deve haver algo que possamos fazer.”

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