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Estamos assistindo a uma dura empreitada no caminho de um ajuste fiscal, com aumento de impostos e grandes negociatas políticas. O alinhamento com as exigências das agências de risco internacionais e o realismo fiscal, com reajuste no preço da água, gasolina, energia (esta com aumento de 60% nos últimos 12 meses) e transporte público, completam o pacote de “maldades” necessárias para a normalização dos fundamentos econômicos. Em meio a tais acontecimentos, o nível da poupança bancária neste ano tem tido o maior movimento de retração desde a estabilização econômica, em 1994.

A série histórica disponível no site do Banco Central mostra os saques recordes da caderneta de poupança neste ano, acumulando R$ 38,5 bilhões no primeiro semestre, o que, com os constantes choques de juros – a Selic foi recentemente elevada para 14,25% –, podem diminuir a competitividade da poupança, favorecendo a alocação em fundos de investimentos de renda fixa.

A simplória caderneta de poupança é uma de nossas jabuticabas

Isso gera um grande problema: a caderneta de poupança é o principal instrumento de funding para o crédito imobiliário, pois as instituições precisam direcionar ao menos 65% das captações para este fim. Se a demanda por crédito habitacional cresce a taxas maiores que as captações da poupança, a captação para crédito imobiliário será insuficiente. O indicador Fipe ZAP, o de maior confiança no mercado imobiliário brasileiro, mostra uma valorização dos imóveis abaixo do IPCA – ou seja, descontada a inflação, os preços médios dos imóveis apresentaram desvalorização, o que mostra um desaquecimento do setor civil, sobretudo por parte de grandes investidores e fundos de investimento especializados.

Este cenário forçou os bancos a adotarem outros instrumentos mais caros de captação, aumentando as taxas de juros e diminuindo a porcentagem de financiamento dos imóveis. O mesmo se repete na zona rural, onde o custeio da safra também fica mais caro, pois pode ser financiado por parte dos recursos da poupança.

As formas alternativas de financiamento nos quais os bancos estão se apoiando são emissão de Letras de Crédito Imobiliária e do Agronegócio (LCI e LCA, respectivamente), que, apesar de serem mais custosas na captação, remuneram o capital investido próximo ao CDI e têm isenção de Imposto de Renda. O número de aplicadores praticamente dobrou de 2013 para 2014, saindo de 540 mil para 1 milhão. O fato coloca as instituições em um dilema estratégico, pois precisam ofertar cada vez mais letras para atender seus limites de funding, retroalimentando o movimento de resgate da poupança existente.

A simplória caderneta de poupança é uma de nossas jabuticabas e está claramente conectada por todo o sistema de financiamento da economia, e tem impactos reais, sobretudo em um setor ainda mais importante como o crédito no mercado imobiliário, cuja participação no PIB do Brasil é de apenas 9,7%, bem abaixo dos padrões internacionais, considerando principalmente a carência habitacional do país.

O Brasil está entrando numa sinuca de bico: expectativas de inflação extrapolando os limites civilizados, aumento da taxa de desemprego e restrição crescente do crédito direto ao consumidor. O brasileiro, portanto, está perdendo cada vez mais a capacidade de se alavancar no mercado de crédito devido ao alto custo do dinheiro na economia, optando por diminuir o consumo, pois, se já está difícil honrar suas dívidas, a saída agora é tentar ao menos amenizar os impactos no bolso.

Lara Siqueira de Oliveira, graduanda em Economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é colaboradora do site Terraço Econômico .
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