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O governo Dilma tem tido a ingrata tarefa de receber de bandeja os resultados econômicos que ele mesmo criou nestes últimos quatro anos. Tem número ruim para todos os gostos: desde inflação mais elevada que em 2010 até déficit em conta corrente acima de 4% do PIB, algo que não se observava havia muito tempo. No meio desse mar de dados negativos, o de maior destaque certamente é o fiscal. Não apenas pelos números fracos em si, mas também pelas tentativas que houve para mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal.

A entrada de Joaquim Levy teve o papel de impedir que a deterioração institucional e numérica continuasse, o que de fato tem acontecido desde a posse do novo ministro. Entretanto, fica a dúvida ainda sobre a capacidade que o ministério tem de fazer todas as mudanças necessárias, especialmente aquelas com o objetivo de aumentar o superávit primário para 1,2% do PIB neste ano. Será uma virada fiscal de 2014 para 2015 nada trivial. Além do 1,2% esperado para este ano, tem de ser somado o déficit de 0,6% do PIB no primário do ano passado, mais um provável ajuste de 0,2 ponto porcentual na receita. Isso porque a primeira estimativa foi feita quando se imaginava que o PIB fosse crescer em torno de 0,8% neste ano. Com nossa estimativa de queda de 1%, será necessário rever também a projeção de arrecadação.

A presidente busca soluções compartimentadas para seus problemas. Falta visão estratégica e ampla dos diversos problemas pelos quais passa o país

Somando tudo, há praticamente 2% de ajuste a fazer de um ano para outro, algo que aconteceu apenas em 1999. A grande diferença em relação àquele período – e que coloca o desafio maior para Levy – é que no início do segundo mandato de FHC foi implementado o tripé macroeconômico. Ali de fato houve um trabalho coordenado entre Fazenda e Banco Central para resgatar a credibilidade que ameaçava se perder com a crise cambial. Mas para aquela crise cambial havia instrumentos de política macroeconômica que podiam reverter a trajetória de piora, como de fato ocorreu. Mas que instrumentos há para reverter um possível racionamento de água e energia e os rescaldos da crise do petrolão? Isso não depende da Fazenda, nem do BC. Caberá à presidente Dilma ser a coordenadora da mudança de rumo necessária.

A dificuldade para isso é que a presidente busca soluções compartimentadas para seus problemas. Falta visão estratégica e ampla dos diversos problemas pelos quais passa o país. Isso aconteceu no caso da energia (em que o objetivo único era baixar a tarifa a qualquer preço) e ocorreu agora novamente, na escolha de Levy. Seu perfil técnico e fortemente voltado ao fiscal encaixou no desejo da presidente de resolver o que ela acredita ser o estritamente necessário agora: reverter o déficit primário para não perder o grau de investimento. Entretanto, todo o entorno de crise que se avoluma sobrepuja a simples melhora da situação fiscal. Ainda corre-se o risco de o país perder a nota de investimento, especialmente se não ficar claro o que o governo de fato fará para resolver todos os demais problemas.

Não há muito tempo para esperar uma reação, e abril deverá ser o mês-chave, quando se saberá o que restará de água nos reservatórios para passar pelo período de seca; a parte política da Operação Lava Jato já estará em andamento, deixando claro em que pé de desorganização o Congresso se encontrará; e certamente haverá mais clareza sobre a situação da Petrobras. A expectativa sobre esses três elementos, infelizmente, é negativa e, por isso, abril poderá ser o mês das notícias amargas que estão a caminho, com a volta da discussão sobre perder ou não a nota de investimento.

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, é especialista do Instituto Millenium.
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