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A pergunta de Bob Dylan, Nobel de Literatura de 2016, sobre “quantas balas de canhão precisam voar até serem para sempre banidas?” ecoa na mente de qualquer pacifista. Apesar de apenas duas bombas nucleares terem sido lançadas, estima-se mais de 2 mil testes nucleares e 2,5 milhões de mortes pelos efeitos da radiação, além de todo o impacto ambiental. Por isso, é muito celebrada a atribuição do Prêmio Nobel da Paz deste ano à Campanha Internacional para Abolição das Armas Nucleares (Ican, em inglês).

Dado seu peso simbólico, o Nobel da Paz vem, desde sua primeira atribuição, em 1901, promovendo temáticas relacionadas à paz tão diversas quanto controle de armas e desarmamento, mediação e negociação, direitos humanos, educação, democracia, humanitarismo, movimentos sociais para a paz, não violência e meio ambiente. Por isso, o Nobel da Paz é talvez um dos mais importantes termômetros do cenário internacional. Consequentemente, dentro do rol dos diferentes prêmios Nobel, o da Paz é aquele com mais anos sem a atribuição do prêmio. As duas guerras mundiais são a principal razão.

É desassossegador ver que ainda se necessita advogar pela completa erradicação das armas nucleares

Neste ano, o Prêmio Nobel da Paz certamente não se distanciou do papel ao nos recordar do desarmamento nuclear. Por um lado, chama atenção para o fato de que vivemos em um cenário internacional marcado por uma perigosa escalada na confrontação entre lideranças políticas de dois Estados possuidores de armas nucleares (desta vez, Estados Unidos e Coreia do Norte). Por outro lado, reconhece e premia um bem-sucedido esforço realizado pela Ican para a adoção, em julho deste ano, nas Nações Unidas, do Tratado sobre Proibição de Armas Nucleares. Esse é um feito sem precedentes. Aprovado por 122 votos a favor, um contra e uma abstenção – para além do boicote dos países possuidores de armas nucleares –, o Tratado é definitivamente um passo em direção ao banimento das armas nucleares. Em menos de um mês desde a abertura para assinatura, 51 países já o assinaram e três já o ratificaram. O feito é extraordinário, sobretudo para uma instituição com apenas dez anos de fundação.

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Além disso, a atribuição do Prêmio Nobel da Paz à Ican chama atenção para o grande potencial da sociedade civil global para pautar e influenciar a agenda política internacional. A Ican é uma coalizão internacional global formada por mais de 400 entidades e organizações não governamentais, com representação em mais de 100 países. Considerando a impossibilidade de a organização ser parte do tratado sobre proibição das armas nucleares, a atribuição do Nobel representa o reconhecimento do papel realizado e esperado da sociedade civil global na construção do cenário internacional.

Há um lado desalentador da atribuição do Prêmio Nobel da Paz desse ano. É desassossegador ver que, mesmo após o período da Guerra Fria, em pleno século 21, se necessita advogar pela completa erradicação das armas nucleares.

Ramon Blanco e Gustavo Vieira são, respectivamente, professor e reitor pro-tempore da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), onde coordenam o Núcleo de Estudos para a Paz, Cátedra de Estudos para a Paz e do projeto de extensão Desarmamento Humanitário (membro da Ican).
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