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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Há 70 anos a Segunda Guerra Mundial findou. Muitos ainda têm memória pessoal dos acontecimentos. A perseguição a italianos, japoneses e alemães pela polícia política de Getúlio volta e meia aparece nas histórias dos ancestrais. A inocência analfabeta da minha avó paterna, brasileira que não sabia falar português, foi alvejada pela brutalidade discriminatória que bradava, na jardineira entre Sarandi e Carazinho, “volte para a Alemanha”.

Meu pai, então com 8 anos, entendia as palavras, mas não os motivos da agressão. Como agricultores paupérrimos, pés rachados no frio dos cafundós do planalto gaúcho, voltariam para lugar que não era deles? Essa indagação, em português capenga com sotaque germânico – semelhante ao modo atual de falar em Marechal Cândido Rondon –, resultou em detenção de mãe e filho por um dia.

Meus amigos nipônicos do interior do Paraná se angustiavam com a pecha de makegumi. Na infância, não entendi a conotação de traidor e como a guerra que aconteceu do outro lado do planeta podia mexer tanto com as emoções. Alguns velhos na comunidade não acreditavam na rendição e morreram sem entender que nascera o Japão da paz.

A existência de recordações vivas serve para evidenciar a proximidade temporal do armistício na Europa e na Ásia. Guerras simultâneas, mas que em comum pouco tinham, exceto pretensão de superioridade racial de alemães e japoneses sobre os povos de suas respectivas áreas de influência.

A narrativa dos horrores é despicienda. Todas as guerras são feias, brutais, sejam antigas, atuais ou futuras. Só a paz é bela. Não existe poesia na destruição. Explicá-la como parte da natureza humana, tal qual os biólogos demonstram a belicosidade dos chimpanzés, não significa admitir valor positivo na violência. Explicar e justificar são ações muito distintas. Claro, é justo defender-se, mas é triste porque denota imersão na barbárie. Mesmo as guerras justas não ensejam celebração.

Todas as guerras são feias, brutais, sejam antigas, atuais ou futuras. Só a paz é bela

Comemorar o fim da Segunda Guerra Mundial é lembrar que houve a Primeira e não a Terceira, ainda. A ONU é mais relevante do que creem os pessimistas. As bases de cooperação internacional substanciadas na Liga das Nações e depois convoladas nas Nações Unidas propiciaram sete décadas sem que o mundo pegasse fogo.

Steven Pinker, ao afirmar o declínio da violência ao longo da história da civilização, demonstra estatisticamente que a quantidade de mortos na Grande Guerra foi proporcionalmente menor do que as usuais nas remotas guerras tribais, quando era comum morrer metade da população. Se mantida essa proporção, teria morrido mais de 1 bilhão de pessoas. Acredita-se que 3% das mortes no curso do século 20 foram decorrência direta ou indireta de atos bélicos.

Embora o senso comum dê a impressão de que a violência aumenta dia a dia, os fatos indicam diminuição. Bom, mas insuficiente. A humanidade tem aptidão para melhorar a convivência, tornando-a menos bruta. Sem imaginar paraísos ou infernos, admitindo a existência de centenas de países com interesses conflitantes, é possível fazer engenharia política que evite guerras totais.

O fim está distante.

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