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Agentes da Guarda Municipal de Campina Grande do Sul e da Polícia Militar do Paraná.
Agentes da Guarda Municipal de Campina Grande do Sul e da Polícia Militar do Paraná.| Foto: Divulgação / Guarda Municipal de Campina Grande do Sul

Na semana que vem, representantes da Secretaria Estadual de Segurança Pública (Sesp) do Paraná e da Federação Nacional dos Sindicatos de Guardas Municipais (Fenaguardas) devem se reunir para discutir uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que pode afetar diretamente o trabalho das Guardas Municipais. A 6ª Turma do STJ determinou que a Guarda Municipal, por não estar entre os órgãos de segurança pública previstos pela Constituição Federal, não pode exercer atribuições das polícias civis e militares.

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A repercussão junto ao Estado do Paraná se deu depois de a Polícia Civil em Matinhos, no litoral, supostamente ter se recusado a receber um preso encaminhado à delegacia por guardas municipais. O relato foi publicado pela Fenaguardas em site oficial e nas redes sociais. A postagem aponta que tal recusa teria se dado por conta de uma interpretação da decisão da 6ª Turma do STJ por parte do delegado. Tal decisão judicial, porém, não tem caráter vinculante, e por isso não vale em outros casos além daquele julgado naquele tribunal.

Na postagem, a federação afirma que apresentou denúncia sobre o ocorrido à Sesp e que, em um primeiro momento, a possibilidade de um encontro foi descartada pelo secretário Wagner Mesquita. Em resposta ao ofício encaminhado à Sesp, em vez de uma reunião, a Fenaguardas recebeu um despacho da Corregedoria da Polícia Civil na qual o órgão afirma não conhecer nenhum caso de recusa de recebimento de flagrantes ou outras ocorrências oriundas de ações da Guarda Municipal.

Corregedoria reconhece "livre convencimento motivado" dos delegados

Além disso, a Corregedoria da polícia reforçou no despacho o entendimento da 6ª Turma do STJ de que “está vedada a atuação da Guarda Municipal como força policial”. Por fim, a Corregedoria reconhece o que chamou de “livre convencimento motivado” dos delegados em serviço – na prática, um delegado poderia recusar o recebimento de um flagrante por ter “liberdade para, motivadamente, adotar a posição que melhor entenda cabível ao caso concreto”.

Procurada pela Gazeta do Povo, a Fenaguardas confirmou que só deve se pronunciar sobre o caso após o encontro na Sesp, na próxima semana. À reportagem, a assessoria de comunicação da Polícia Civil reforçou o fato descrito pela Corregedoria, de que a corporação desconhece qualquer situação de recusa de recebimento de flagrantes. “Não há nenhuma orientação dirigida às autoridades policiais, no tocante à recusa do recebimento de ocorrências apresentadas por integrantes das Guardas Municipais nas Unidades da PCPR”, reforçou a assessoria.

Depois da publicação da reportagem, a assessoria da Polícia Civil, mais uma vez, afirmou que depois de ter feito contato com delegados da região não foram encontrados indícios a respeito de recusa de recebimento de flagrantes encaminhados pela Guarda Municipal. "A Polícia Civil do Paraná (PCPR) verificou os registros e não localizou nenhuma ocorrência do tipo. Foi solicitado detalhes a Federação Nacional dos Sindicatos de Guardas Municipais para poder averiguar internamente, mas a Federação não retornou até o momento com nenhuma informação sobre a suposta ocorrência", diz a nota encaminhada à reportagem nesta sexta-feira (4).

A Sesp, também em nota, explicou que desde a criação da Polícia Penal e da retirada de presos de delegacias, as prisões em flagrante realizadas pelas polícias estaduais e pela Guarda Municipal já são encaminhadas diretamente para a Polícia Civil, conforme prevê a legislação federal. “Prisões resultantes de cumprimento de mandados de prisão”, explicou a Sesp, “são recepcionadas diretamente pela Polícia Penal”.

Como foi o caso que deu origem ao julgamento

O caso julgado pelo STJ se refere a um homem que foi condenado por tráfico de drogas. A corte julgou um recurso do réu, entendeu que as provas foram colhidas de forma ilícita e anulou a condenação. Naquele caso, os guardas municipais passavam em uma viatura quando viram o homem sentado em uma calçada. Ele se levantou e o movimento chamou a atenção dos guardas, que pararam a viatura e foram revistar o suspeito.

O homem tinha escondido uma sacola plástica com drogas, que foi encontrada pelos guardas municipais durante uma ação de revista. E foi exatamente este o ponto atacado pelo ministro Rogerio Schietti Cruz, relator do caso, na decisão. Para o relator, seria potencialmente caótico "autorizar que cada um dos 5.570 municípios brasileiros tenha sua própria polícia, subordinada apenas ao comando do prefeito local e insubmissa a qualquer controle externo".

O ministro explicou que a Guarda Municipal não está impedida de agir quando tem como objetivo tutelar o patrimônio do município, realizando, excepcionalmente, busca pessoal quando estiver relacionada a essa finalidade. Essa exceção, entretanto, não se confunde com permissão para realizar atividades ostensivas ou investigativas típicas das polícias no combate à criminalidade.

Consórcio de Guardas Municipais da RMC aponta que decisão do STJ não é definitiva

Em nota encaminhada à redação, o Consórcio das Guardas Municipais da Região Metropolitana de Curitiba (Coin) aponta que a decisão tomada pelo STJ não é definitiva, e que caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF) julgar recurso apresentado pelo Ministério Público de São Paulo e dar a última palavra sobre as funções das Guardas Municipais trazidas no texto constitucional.

O consórcio afirma também que há várias decisões do STF no sentido de reconhecer como válidas prisões em flagrante feitas por guardas municipais “por se tratar de ato permitido a qualquer do povo, nos termos do art. 301 do Código de Processo Penal”.

Confira a íntegra da nota do Consórcio das Guardas Municipais da Região Metropolitana de Curitiba (Coin):

O Consórcio das Guardas Municipais da Região Metropolitana de Curitiba (COIN), que engloba as guardas de Curitiba, Campo Largo, São José dos Pinhais, Araucária, Pinhais, Mandirituba, Fazenda Rio Grande, Colombo, Quatro Barras e Campina Grande do Sul, manifesta-se no sentido de reafirmar a competência das guardas municipais em matéria de segurança pública, no estrito cumprimento dos deveres previstos na Lei Federal n.º 13.022/14 (Estatuto Geral da Guarda), em prol da manutenção da ordem pública e na prevenção e enfrentamento à criminalidade, como órgãos previstos expressamente no Sistema Único de Segurança Pública, conforme artigo 9º, da Lei Federal 13.675/18.

Cumpre ainda esclarecer que a decisão da 6ª Turma do STJ tem efeito restrito ao caso concreto de operação realizada por guardas municipais de São Paulo e não é definitiva, já que o Ministério Público de São Paulo recorreu ao Supremo Tribunal Federal, a quem compete dar a última palavra sobre a interpretação adequada do artigo 144, §8º, da CF, que trata das competências das Guardas Municipais.

O STF já julgou vários Habeas Corpus, compreendendo que não há ilegalidade na prisão em flagrante efetuada pela Guarda Municipal em casos de tráfico de drogas, ainda que não esteja inserida expressamente no rol das suas atribuições constitucionais (§ 8º do art. 144 da Constituição da República), por se tratar de ato permitido a qualquer do povo, nos termos do art. 301 do Código de Processo Penal. Inclusive em casos envolvendo atuação de guardas municipais de São Paulo, o STF já afirmou a possibilidade de integrantes da Guarda realizarem prisão em flagrante delito por tráfico de drogas em razão do recebimento de denúncia anônima.

O ministro do STF, Alexandre de Moraes, ao votar no RECURSO EXTRAORDINÁRIO n.º 846.854/São Paulo, já firmou o entendimento de que: “As Guardas Municipais são previstas constitucionalmente no artigo 144, do Capítulo III, Título V (Da segurança pública), portanto, cumprem papel nas atividades estatais de segurança pública, conforme expressa previsão constitucional e regulamentação legal, desempenhando função pública essencial à manutenção da ordem pública, da paz social e da incolumidade das pessoas e do patrimônio público, em especial de bens, serviços e instalações do Município.”

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