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| Foto: Evaristo Sá/AFP

Parte da esquerda brasileira que costumava estar ligada ao ex-presidente Lula, inclusive setores do PT, começou a discutir um projeto alternativo de poder que não tenha necessariamente ele como seu principal expoente e candidato à Presidência em 2018. A movimentação irritou Lula, que pretende unificar não apenas os petistas em torno de seu nome (ou de quem ele escolher apoiar), mas também um amplo leque de movimentos e partidos de esquerda e centro-esquerda.

O estopim da insatisfação do ex-presidente foi uma reunião realizada no último dia 16 entre representantes de alas mais à esquerda do PT, do PSol, do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e da Frente Povo Sem Medo. A reunião, que “oficialmente” apenas teve como objetivo discutir um programa de longo prazo para a esquerda, era para ter sido reservada. Mas a realização do encontro foi noticiada pelo jornal Folha de S.Paulo . Lula ficou sabendo pela imprensa e se irritou. Viu na movimentação uma tentativa de construir um projeto alternativo que não passe por ele.

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Divisão da esquerda

A reunião evidenciou um racha interno no petismo que se estende a toda a esquerda brasileira. De um lado, quem acha que Lula é o único nome capaz de viabilizar o retorno do chamado campo progressista ao poder neste momento. Do outro, aqueles que acreditam que insistir na candidatura do ex-presidente vai conduzir a um inevitável enfraquecimento da esquerda, pois ele não reconhece enfaticamente os erros das gestões petistas na Presidência.

A divisão ficou clara na eleição interna para escolher o novo presidente do PT. Lula não conseguiu impor, como nome de consenso, sua candidata: a senadora Gleisi Hoffmann (PR). Gleisi venceu, mas teve de disputar o cargo com o também senador Lindbergh Farias (RJ), ligado às alas mais à esquerda da sigla – que já falam inclusive em desembarcar do partido.

Segundo interlocutores do ex-presidente, ele teria procurado Lindbergh para pedir que desistisse da candidatura em nome da união do partido. Ouviu um “não” de resposta. E, irritado, teria desabafado: “Esse menino não tem futuro”.

O discurso de Lula na convenção do PT que elegeu Gleisi também desagradou à esquerda petista. Ao contrário do que muitos esperavam, ele não defendeu as “diretas já” – uma tese cara à militância. A avaliação da cúpula partidária é de que será melhor para o partido esperar por 2018 e ver o presidente Michel Temer (PMDB) e seu projeto político “sangrarem” até lá.

Além disso, Lula deixou em aberto a possibilidade de o PT “ter de fazer aliança com outros partidos” se voltar ao governo. A política de alianças com partidos de direita, adotada pelos governos de Lula e Dilma Rousseff, é rechaçada pelas alas mais à esquerda do partido.

Lideranças na reunião “secreta”

Lindbergh esteve na reunião “secreta” de setores da esquerda apenas duas semanas depois do discurso de Lula e de perder a eleição interna do PT. Outra liderança do partido, o ex-governador gaúcho Tarso Genro, também participou. Ele tem sido um crítico dos rumos do PT. Há muito tempo defende, em vão, a refundação da sigla.

Na quinta-feira passada (22), em entrevista à Folha de S.Paulo, Tarso preferiu não comentar sobre a reunião que desagradou Lula, justificando que era para ter sido “reservada”. Mas voltou a tecer críticas aos rumos do PT. “Seria necessário examinarmos em profundidade as escolhas econômicas e políticas que fizemos e que nos tornaram reféns de uma confederação de investigados e denunciados, que eram nossos aliados, e aderiram, sem pudor, a um programa liberal-rentista”, disse.

Tarso também não descartou a hipótese de deixar o partido, embora considere não haver hoje “um instrumento melhor do que o PT, com suas grandezas e misérias, para atuar politicamente com realismo e esperança”.

União improvável

O deputado federal Chico Alencar (PSol-RJ) não participou da reunião do dia 16. Mas acredita ser possível unificar as esquerdas para 2018 em torno de um projeto. Apesar disso, ele acha que Lula é um grande problema nessa empreitada.

Para Alencar, há vários entraves, sobretudo a possibilidade admitida por Lula de firmar aliança com partidos que hoje o próprio PT considera “golpistas” e a falta de autocrítica da sigla em relação ao seu envolvimento com corrupção. “O PT não pode achar toda a corrupção que apareceu é um complô de procuradores, juízes e da mídia. É uma compreensão equivocada.” Além disso, embora reconheça que os petistas tiveram bons programas quando ocuparam o Planalto, o deputado do PSol afirma que o PT não mudou o modelo político e econômico – uma bandeira da esquerda.

As chances de Lula atrair amplos espectros da centro-esquerda também não são grandes atualmente. No fim do ano passado, o PDT começou a liderar um movimento para formar uma frente de siglas de centro e esquerda. Mas o partido não vê Lula como cabeça de chapa, e sim o ex-governador do Ceará Ciro Gomes (PDT). “O Ciro será candidato independentemente das circunstâncias”, diz Carlos Lupi, presidente nacional do PDT.

Pontos em comum

Apesar das divergências em torno de Lula, a esquerda brasileira compartilha hoje uma série de pontos em comum. O primeiro e mais evidente é a oposição a governo Temer e às reformas trabalhista e da Previdência.

Há outros. Lupi fala, por exemplo, num projeto nacional-desenvolvimentista que não priorize o capital especulativo. É o mesmo discurso do PT. Chico Alencar afirma ser preciso “radicalizar a democracia política, econômica, de informação, de educação, saúde”. Os petistas também estão defendendo as mesmas causas.

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