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Presidente Lula (PT) e vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB)
Presidente Lula (PT) e vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB)| Foto: Ricardo Stuckert/PR

A dependência do Brasil na importação de fertilizantes vem sendo debatida há décadas e ganhou destaque novamente após o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Geraldo Alckmin, defender a exploração de potássio na Amazônia. Em reunião recente do Conselho Administrativo da da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), ele disse que a mina no Amazonas "pode ser um dos maiores investimentos do país" e pode ser uma oportunidade para o Brasil diminuir sua dependência de importação de potássio – atualmente, 98% do que o país precisa vêm de outros países.

O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, também demonstrou interesse pelo tema ao defender que a produção de fertilizantes seja tratada como assunto de segurança nacional e dizer que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) determinou que a Petrobras retome a produção do insumo. Ele fez as afirmações em entrevista ao jornal O Globo, ainda em seus primeiros dias à frente da pasta. Na entrevista, Fávaro afirmou também que a Petrobras deve retomar a construção de três fábricas de fertilizantes no país.

O tema da exploração de agrominerais no Brasil, considerados estratégicos para o agronegócio, também gerou preocupações no começo de 2022, com a crise de fertilizantes desencadeada pela guerra entre a Rússia e Ucrânia. Com o conflito, 50% da importação de potássio, que vem da Rússia e de Belarus, por exemplo, ficou comprometida.

O alto percentual de importação de insumos para o agronegócio quase comprometeu a safra brasileira no ano passado. No entanto, a visita do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao presidente russo, Vladimir Putin, poucos dias antes do início da guerra com a Ucrânia, ajudou a manter as remessas de fertilizantes para o Brasil. A ação da ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PP-MS), atualmente senadora, de negociar com o Canadá também contribuiu para a manutenção no fornecimento dos fertilizantes.

O Brasil é o único polo agrícola que tem dependência de importação de fertilizantes, de acordo com Carlos Cogo, sócio-diretor da consultoria Cogo.

Apesar da sinalização de Alckmin, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, destacou a parceria comercial com a Rússia para o fornecimento de fertilizantes químicos ao agronegócio brasileiro.

“Um quarto dos fertilizantes utilizados no Brasil são de produção russa. Tratamos de um acordo para garantir o fluxo deste insumo de vital importância para nossa agricultura”, disse Vieira, em declaração após o encontro com o chanceler russo Serguei Lavrov, em 17 de abril.

Ausência de planos estratégicos atrasa o setor 

Durante a crise de 2022, o governo Bolsonaro apresentou o Plano Nacional dos Fertilizantes (PNF). Com o objetivo de diminuir a dependência externa, o plano buscava a implementação de propostas legislativas para facilitar a produção dos insumos no país.

No entanto, esta não foi a primeira iniciativa de governos brasileiros ao longo das décadas. A criação de um Marco Regulatório para o setor de potássio vem sendo debatida, pelo menos, desde 2009. À época, Lula, em seu segundo mandato, defendia a necessidade de regular o setor.

Naquele momento, o ex-ministro da Agricultura Reinhold Stephanes já falava sobre a dependência do Brasil no setor e apontava a necessidade de mais estudos sobre a exploração de potássio no Brasil. Ele havia recebido informações da empresa Falcon, uma multinacional do ramo da mineração, de que a terceira maior jazida de potássio do mundo estaria localizada na região amazônica. Naquela época, Stephanes chegou a afirmar que a autossuficiência do Brasil em potássio poderia ser alcançada em 10 anos.

Mas os planos não avançaram. Em 2010, Stephanes diz que chegou a convencer Lula e a então ministra-chefe da Casa Civil Dilma Rousseff sobre a criação de um novo marco regulatório. Posteriormente, porém, ele deixou o ministério para ser candidato nas eleições e o novo titular da pasta não deu andamento ao tema.

Ao assumir o mandato de deputado federal, em 2014, Stephanes protocolou o Projeto de Lei (PL) 8.065/2014, que pretendia estabelecer o novo marco legal. O PL acabou apensado a outra matéria que dispõe sobre pesquisa e lavra de minerais e nunca avançou.

Os anos se passaram, mas a situação não mudou. O Plano Nacional dos Fertilizantes de Bolsonaro está parado desde o fim de 2022. Até agora, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva não indicou os nomes dos novos gestores para o Conselho Nacional de Fertilizantes e Nutrição de Plantas (Confert), órgão responsável por coordenar e acompanhar a implementação do PNF.

Inicialmente ligado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, o Confert vai passar para a alçada do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, chefiado por Alckmin, que indicará o presidente do colegiado. O ministério comandado por Carlos Fávaro terá assento na Secretaria Executiva.

“Bolsonaro infelizmente não avançou na matéria. Ficou na conversa, e não sabemos por que ficou parado isso, se afinal é tão estratégico para o país”, afirma o engenheiro agrônomo, Xico Graziano. Ele já alertava, em artigo publicado em 2015, para a “ausência de uma política agrícola para o setor, sem plano estratégico a longo prazo”. Para Graziano, tanto no caso do Marco Regulatório do segundo mandato de Lula quanto no caso mais recente do Plano Nacional de Fertilizantes, não avançar no tema gera “uma perda de soberania roubada pelo descaso governamental. Falta planejamento sobre o futuro do nosso país”.

Falta de conhecimento da geologia brasileira impede avanços na exploração 

Para o porta-voz do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Rinaldo Mancin, o Brasil precisa, antes de mais nada, expandir os conhecimentos sobre a geologia do território. “Até o momento, só tivemos foco no solo cristalino que abriga os materiais metálicos. Precisamos saber mais sobre os terrenos sedimentares”. Mancin ressalta que a maior prova da necessidade de investimento nas pesquisas é que as reservas de potássio descobertas recentemente foram encontradas em estudos que almejavam o petróleo.

A afirmação é comprovada em um levantamento publicado pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM), instituição vinculada à Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral (SGM) do Ministério de Minas e Energia (MME), em 2020. O estudo, motivado pela crescente demanda brasileira por potássio, impulsionou o governo a potencializar novas descobertas na Bacia do Amazonas, e foi baseado em informações cedidas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

“Temos apenas cerca de 3% do território adequadamente mapeado. Defendemos o modelo público-privado para acelerar a busca por mais conhecimento geológico. Nós temos uma informação ainda precária. O Brasil tem que aumentar o conhecimento dessas áreas”, pontuou o porta-voz do Ibram.

Apesar do potencial já mapeado, atualmente, somente uma mina de potássio é explorada no Brasil. Trata-se do Complexo Mineroquímico de Taquari-Vassouras, em Rosário do Catete (SE), descoberto em 1963, mas com exploração iniciada apenas em meados da década de 1980. Desde 2017, a operação de exploração foi comprada pela Mosaic Fertilizantes. Recentemente, a empresa anunciou investimentos de aproximadamente R$ 800 milhões para manter a extração de silvinita, minério usado no beneficiamento de potássio, com previsão de extensão da operação para, pelo menos, até 2030.

Interlocução do setor com o governo Lula

Entidades ligadas à mineração, associações de produtores de fertilizantes e empresas têm procurado o atual governo para tratar das demandas do setor.

A Associação Brasileira dos Produtores de Remineralizadores de Solo e Fertilizantes Naturais (Abrefen), que teve participação na Câmara Técnica de Cadeias Emergentes do Confert durante o governo Bolsonaro, buscou o Ministério da Agricultura para uma reunião com Fávaro, do governo petista.

Embora ainda não tenha recebido retorno sobre a agenda, o presidente da Abrefen, Frederico Bernardez, acredita que medidas devem ser tomadas pelo governo em atendimento às demandas expostas pela entidade. “Estamos aguardando em conjunto com outras entidades agenda oportuna para alinhamento com o ministro Carlos Fávaro. Mas, por conversas anteriores, acreditamos muito na possibilidade de redução da dependência e na possibilidade deste atual governo ajudar e apoiar desenvolvimento de políticas públicas neste sentido”.

Apesar das recentes declarações do ministro da Agricultura destacando a importância da exploração do potássio, a atuação do ministério no debate, no entanto, ainda não foi definida. Em tentativa de contato com a pasta sobre o tema, a reportagem foi direcionada para o Ministério de Minas e Energia e não obteve retorno.

Em outra frente, o Ibram busca uma agenda com Alckmin para debater, dentre outros assuntos, a questão dos fertilizantes. “A gente precisa de um grande esforço nacional neste assunto. Uma parte importante vem para poder ofertar fertilizantes para nossa sociedade”, destacou Rinaldo Mancin, do Ibram.

Em visita a Manaus, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, foi questionada sobre o motivo da exploração de potássio “estar travada por incongruências em questões ambientais”. "A gente tem que pensar que ele [projeto] tem que ter viabilidade econômica, viabilidade social e viabilidade ambiental. Quando você tenta viabilizar todas essas questões, não é que está travado, é que você tem que resolver o problema", justificou Marina.

Projeto Potássio Autazes

O Projeto Potássio Autazes prevê a exploração de um local próximo de terras indígenas e, por isso, precisa passar por um processo de pré-consulta aos indígenas, que faz parte do licenciamento ambiental Ele pode elevar o estado do Amazonas ao patamar de maior produtor do fertilizante no Brasil, segundo a empresa Potássio do Brasil.

Executivos da empresa já se encontraram com Alckmin para apresentar o projeto. O empreendimento, que atualmente está em fase de licenciamento ambiental, tem vida útil estimada em aproximadamente 23 anos.

Ainda de acordo com a empresa, “quando atingir a produção anual média de 2,2 milhões de toneladas de Cloreto de Potássio, a oferta deste insumo corresponderá a cerca de 20% do volume consumido no Brasil”. Estudos preliminares indicam, entretanto, um potencial de aumento da capacidade de produção, podendo atingir até 45% das necessidades brasileiras.

O projeto, no entanto, tem sido questionado na Justiça Federal por supostamente violar essa etapa. Em 2016, o MPF já havia pedido à Justiça Federal que suspendesse a licença concedida pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) à empresa Potássio do Brasil para atividades de pesquisa e exploração no território Soares/Urucurituba.

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