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Malafaia
O pastor Silas Malafaia, ao lado de Bolsonaro: multidão demonstrou revolta ao Malafaia chamar pela responsabilidade do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD).| Foto: Reprodução canal Silas Malafaia no YouTube

As críticas feitas pelo pastor Silas Malafaia ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), na manifestação no Rio de Janeiro, neste domingo (21), indicam que o religioso está se comportando como "porta-voz" do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Para especialistas ouvidos pela reportagem, seria uma forma de o ex-mandatário fazer ecoar seu discurso contra o magistrado - que é relator de seus processos no Judiciário -, mas sem se expor ou ser alvo de novas punições.

A situação jurídica vivida pelo ex-mandatário fez com que ele adotasse uma postura de cautela durante o ato. Em vez de falar sobre Moraes, Bolsonaro preferiu centrar suas críticas no presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ele afirmou que quem está no poder é "um cara que é amante da ditadura, que é amante do falecido Fidel Castro, que venera o ditador Nicolás Maduro, e que está agora ao lado do Irã neste conflito do outro lado do mundo".

Por outro lado, Malafaia não economizou críticas ao ministro do STF, principalmente no que diz respeito aos inquéritos conduzidos por ele na Corte, como o das fake news e o dos atos antidemocráticos. O pastor classificou as investigações como “aberrações jurídicas”.

“A partir de março de 2019, Alexandre de Moraes assume o inquérito imoral e ilegal das fake news. Por que é imoral e ilegal? Porque ele [Moraes] é vítima, delegado, procurador, investigador e juiz. Uma aberração jurídica. E por que é ilegal? Porque não tem a participação do Ministério Público”, disse Malafaia. Segundo o pastor, o ministro criou o “crime de opinião”.

Ao defender Bolsonaro das acusações feitas pela investigação Tempus Veritatis, que apura suposta tentativa de golpe de Estado, o religioso classificou Moraes como "ditador da toga" e disse que iria provar com leis que o ministro seria uma "ameaça à democracia". Ele citou, então, artigos da Constituição que garantem a liberdade de expressão e de consciência. Além disso, na opinião de Malafaia, a minuta do golpe “é a maior fake news da política do Brasil”.

Influência no meio religioso blinda Malafaia de retaliações

O título de pastor de Silas Malafaia é avaliado por analistas políticos como um fator importante para sua postura combativa na arena política. Líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo (ADVC), ele conta com 15 mil membros em sua denominação evangélica e possui presença na televisão por meio de seu programa “Vitória em Cristo”.

Nesse contexto, a influência de Malafaia também se estende aos mais de 22 milhões de membros da Assembleia de Deus, principal denominação pentecostal no país. A leitura é de que uma possível retaliação por parte do Supremo em relação às falas do pastor seria mais difícil, já que ele representa um segmento importante da sociedade.

Para o cientista político Adriano Cerqueira, docente do Ibmec de Belo Horizonte, a postura mais comedida de Bolsonaro pode ser fruto de uma orientação de seus advogados. “Bolsonaro está sob investigação e com certeza ele deve ter tido alguma orientação da parte do seu departamento jurídico para evitar ao máximo entrar em falas ou em atitudes que possam ser consideradas mais agressivas”, afirmou Cerqueira.

O cientista político concorda com a avaliação de que o fato de Malafaia ser pastor confere a ele uma proteção que o ex-presidente não possui.

“Para o Bolsonaro, é interessante essas falas do Malafaia. É uma oportunidade que ele tem até mesmo de desabafar, não de modo mais direto, mas através do pastor, que também está se expondo bastante. Acredito que o fato de ser uma liderança religiosa dá a ele uma certa proteção. O fato do Malafaia participar dos eventos e deixar esses recados não deixa de ser uma forma do Bolsonaro se sentir moralmente retribuído, porque com certeza ele poderia estar falando dessas coisas", disse.

O cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), comentou que Malafaia serviu como “tropa de choque verbal” para elevar a temperatura da manifestação.

“Bolsonaro e seu grupo político agem estrategicamente ao usar Silas Malafaia por conta de sua posição [de pastor]. Ele acabou usando uma figura que tem um escudo muito maior para ser a "ponta de lança", uma "tropa de choque" verbal. Hoje em dia, a multiplicação de discursos nas redes sociais conta muito”, disse Gomes.

Discurso de Bolsonaro foi considerado contido por manifestantes

A percepção dos manifestantes acerca da diferença dos discursos de Bolsonaro e Malafaia também é um indício da estratégia utilizada pelo ex-presidente para passar um recado a Moraes e não se prejudicar. Pessoas ouvidas pela Gazeta do Povo no domingo consideraram o ex-mandatário “contido” ou “light” em suas falas na comparação com o pastor evangélico.

A psicóloga Sonia Cordeiro, 67 anos, disse ter achado o discurso de Jair Bolsonaro objetivo. "Não dava para demorar muito, mas falou as verdades”, reforça. “Vários [políticos] falaram em favor da liberdade de expressão”, afirmou.

Bolsonaro fez um discurso mais incisivo contra a censura, em comparação à manifestação realizada em fevereiro em São Paulo, mas não mencionou diretamente os ministros do STF.

Malafaia também criticou Pacheco e comandantes das Forças Armadas

Além de criticar Moraes, Malafaia chamou o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado e do Congresso Nacional, de "frouxo, covarde e omisso" por não pautar o impeachment do ministro do STF. "O senhor até aqui é um frouxo, covarde e omisso, envergonha a honra do povo mineiro que o elegeu. O senhor vai ser acusado de prevaricação", afirmou o pastor.

Ele ainda fez um discurso contra os atuais comandantes das Forças Armadas. Além disso, Malafaia opinou que os militares investigados nos inquéritos de Moraes estão sendo tratados como “delinquentes”. "Militares com folha corrida de serviços prestados à nação sendo tratados como delinquentes e com a Polícia Federal na porta deles. Se esses comandantes honram a farda que vestem, renunciem a seus cargos", afirmou.

Musk também foi tema da manifestação no Rio

Além do apoio a Bolsonaro e as críticas diretas a Moraes, as revelações de documentos internos do Twitter e de um relatório da Câmara dos EUA, que mostram pedidos de censura feitos pelo Judiciário às redes sociais, foram tema da manifestação no Rio de Janeiro.

Discursando na orla de Copacabana, Bolsonaro classificou o magnata sul-africano radicado nos EUA como um “homem de coragem” e pediu uma salva de palmas para Musk. “É o homem que teve a coragem de mostrar – já com algumas provas, outras virão com certeza – para onde a nossa democracia estava indo. O quanto de liberdade já perdemos. E eu peço agora, respeitosamente, uma salva de palmas para Elon Musk”, afirmou o ex-presidente.

Além de Bolsonaro, Musk também foi elogiado pelo deputado federal Nikolas Ferreira (PL-GM). “Sei que isso aqui vai rodar o mundo, peço uma salva de palmas pela luta pela liberdade do nosso país (…). A luta pela nossa liberdade depende de cada um de nós”, disse Ferreira.

A população também destacou o papel de Musk no embate pela liberdade de expressão com cartazes e toalhas à venda. “Thank You, Elon Musk” (Obrigado, Elon Musk), dizia uma faixa pendurada em uma escada.

Musk virou o herói da direita depois que o jornalista Michael Shellenberger divulgou documentos internos do Twitter, repassados a ele pelo empresário após comprar a rede social e transformar no atual X. Parte desse material continha e-mails trocados entre a plataforma e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com ordens de retirada de conteúdos por “desinformação”.

Outra série de decisões e ofícios mais recentes, revelada na semana passada em relatório parcial de uma Comissão na Câmara dos EUA, mostra ainda que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes mandou retirar do ar cerca de 150 perfis nas redes sociais. O documento diz ainda que outros 300 perfis correm risco de serem censurados.

Discurso de Malafaia endossa pressão da oposição sobre STF

As críticas feitas por Malafaia a Moraes também apontam que a oposição seguirá confrontando o ministro, apesar da movimentação do Supremo acerca do Twitter Files Brasil.

Após a repercussão do caso, Moraes chegou a ir ao Congresso para a apresentação do anteprojeto do Código Civil e defendeu mais uma vez a regulação das redes sociais no plenário do Senado. O gesto foi visto por congressistas e analistas como uma reação às críticas feitas ao Supremo e uma tentativa de impor a visão do STF sobre o assunto.

Para o cientista político Juan Carlos Arruda, CEO do Ranking dos Políticos, a liberdade de expressão virou um tema central no debate público com as revelações do Twitter Files, o que pode fortalecer a direita.

“A escalada do STF e a liberdade de expressão têm sido temas centrais no debate público nas últimas semanas. O sucesso das manifestações deste domingo evidencia um STF cada vez mais distante do apelo popular e, paradoxalmente, suas ações têm alimentado o fortalecimento da direita brasileira”, disse o analista.

A manifestação ocorre em um momento em que a oposição tenta emplacar uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o abuso de autoridades de membros do judiciário, a "CPI da Lava Toga". Nos bastidores, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), teria sinalizado que daria andamento à proposta, mas a reunião com Moraes, ocorrida na quarta-feira (17), teria dissuadido o deputado de avançar com a instalação do colegiado.

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