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Marina Silva está certa em suas críticas ao BNDES
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Em um artigo publicado hoje na Folha, Fábio Kerche, que é assessor da Presidência do BNDES e foi secretário de Imprensa da Presidência da República durante o governo Lula, tentou rebater a acusação que Marina Silva fez ao banco de fomento em sua entrevista no “Bom Dia Brasil”. Não foi nada convincente, demonstrando como é possível contar uma grande mentira usando meias verdades.

Para começo de conversa, o autor se pegou em uma questão semântica ao dizer:

Em primeiro lugar, o BNDES não “dá” dinheiro a ninguém, ele empresta. Isso significa que o banco recebe de volta, corrigidos por juros, os seus financiamentos. Sua taxa de inadimplência é de 0,07% sobre o total da carteira de crédito, segundo o último balanço, sendo a mais baixa de todo o sistema bancário no Brasil, público e privado.

Ora, é lógico que ele oficialmente não “dá” o recurso, e sim empresta. Mas empresta a uma taxa absurdamente subsidiada, que em muitos casos fica em torno da metade da própria inflação! Ou seja, pela ótica do custo de oportunidade, é dinheiro dado sim, pois toda a torcida do Flamengo e do Corinthians gostaria de pegar dinheiro a 3% ao ano. Bastaria aplicar em títulos públicos que rendem quase 11% ao ano e ganhar uma fortuna sem esforço algum. É ou não é dado, na prática? Mas ele continua:

Em relação aos empresários “falidos”, talvez a candidata, em um esforço de transformar em regra a exceção, esteja se referindo ao caso Eike Batista. Se isso for verdade, temos mais uma imprecisão: seja por causa de um eficiente sistema de garantias das operações, seja porque grupos sólidos assumiram algumas empresas, o BNDES não sofreu perdas frente aos problemas enfrentados pelo empresariado.

Qualquer economista conhece o processo de crédito contínuo para empresas ou países falidos. O próprio FMI padece desse mal, pois nenhum burocrata ou analista gosta de reconhecer o erro e o prejuízo. Logo, acaba emprestando mais recursos ainda para grupos em dificuldade, na esperança de que não seja preciso reconhecer o calote, ao menos não por enquanto. Mas quem poderia negar que os bilhões todos emprestados ao grupo de Eike Batista foram um enorme erro? Tem mais:

Por fim, nada mais falso do que dizer que o BNDES empresta para “meia dúzia”. No ano passado, o banco fez mais de 1 milhão de operações, sendo que 97% delas para micro, pequenas e médias empresas.

Usar o volume de operações é ridículo, uma vez que nada diz sobre o montante. Eu posso fazer mil operações de R$ 1 e uma só de R$ 1 milhão. Daria para alegar que emprestei para mil e uma pessoas e, portanto, diversifico bastante minha base de clientes? Piada. Mas ele tenta melhorar depois:

Embora o BNDES não tenha a capilaridade dos bancos de varejo, a instituição aumentou seus desembolsos para as pequenas empresas de cerca de 20% do total liberado na primeira década de 2000 para mais de 30% no ano passado. Se retirássemos as típicas áreas onde os pequenos não atuam (setor público, infraestrutura e comércio exterior), os financiamentos para os menores representariam 50% dos desembolsos do banco.

Pois bem: vamos aos números! Basta ver no próprio site do BNDES as estatísticas disponíveis por porte de empresa:

Fonte: BNDES Fonte: BNDES

Notem que a partir de 2010 foi criada uma nova categoria de empresa média-grande, o que mais parece um malabarismo do banco para reduzir a proporção de grandes no total. Bem típico do governo Dilma fazer algo assim. E mesmo com esse subterfúgio, o fato é que algo como 70% do total é direcionado para empresas grandes, e de forma bastante estável ao longo do tempo:

Fonte: BNDES Fonte: BNDES

Ou seja, é inegável que o BNDES canaliza o grosso de seus desembolsos para grandes grupos nacionais, justificando plenamente a alcunha de “Bolsa Empresário”. Apenas Eike Batista recebeu sozinho mais de R$ 10 bilhões, e o mesmo vale para o grupo JBS, que retribuiu doando mais de R$ 100 milhões para a campanha eleitoral, boa parte para o PT. Como negar os fatos tão escancarados?

Desde que o PT assumiu o governo foram destinados algo como R$ 1,2 trilhão pelo BNDES, e mais de R$ 800 bilhões foram para grandes empresas. O banco mudou de magnitude: desembolsava menos de R$ 40 bilhões por ano, e agora chega a quase R$ 200 bilhões.

É a alegria dos “amigos do rei”. É o maior esquema de transferência de riqueza do povo trabalhador para os ricos empresários. E é o que o PT defende, e Marina Silva critica, com toda razão. Só mesmo muito malabarismo para justificar o papel atual do BNDES, distorcendo totalmente a alocação de recursos da nossa economia e tornando o “investimento” em lobby em Brasília mais importante do que aquele produtivo.

Rodrigo Constantino

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