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O cartunista Glauco em dois momentos: produzindo as tiras que diariamente eram lidas em todo o país | Otávio Dias de Oliveira/Folha Imagem
O cartunista Glauco em dois momentos: produzindo as tiras que diariamente eram lidas em todo o país| Foto: Otávio Dias de Oliveira/Folha Imagem

Cartunista deixou o PR aos 18 anos

Glauco começou a desenvolver seu estilo em Jandaia do Sul, na região Centro-Norte do Paraná, onde nasceu. Ele viveu na cidade até os 18 anos, quando seguiu para o interior de São Paulo.

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Depoimentos

"Foi uma perda tremenda. Diante dessa verdadeira tragédia, quero expressar meu sentimento de pesar a familiares, amigos e admiradores", presidente Lula.

"Fiquei arrasado com a morte do Glauco. Uma morte estúpida acima de tudo. Além de prema­tura, estúpida. Nós perdemos um excelente cartunista. Um analista e um crítico com humor leve, agudo, do cotidiano, dos usos e costumes da vida brasileira", José Serra, governador de São Paulo.

"Ele tinha um modo muito pessoal, particular de trabalhar, que a gente costumava comparar com o Garrincha, o Jorge Ben, um trabalho intuitivo, o sujeito segue o próprio faro, a linha dele, o prazer de estar fazendo aquilo. O Glauco sempre trabalhou assim", Laerte, cartunista.

"Ele apareceu com um humor leve, anárquico, moleque, uma coisa fora dos padrões do cartum da época, e isso daí foi uma influência muito grande no meu trabalho. Eu acabei me influenciando por esse tipo de humor", Angeli, cartunista

Espocando a Cilibina

Essa é a primeira vez que o Glauco me deixa muito, muito triste. Desde que o li pela primeira vez, ele sempre me garantiu diversão e fascínio. "De nariz grande a pau pequeno, tenho todos os complexos", dizia Geraldão, o personagem mais famoso dele. Leia a homenagem de Benett

- Leita também a homenagem de Los Três Inimigos e Tiago Recchia

  • Glauco ao lado do filho Raoni, em meados da década de 80

São Paulo - Morreram de forma trágica, na madrugada de ontem, o cartunis-ta paranaense Glauco Villas Boas, 53 anos, um dos mais conhecidos e importantes do país, e o filho dele, Raoni Pires Villas Boas, 25 anos, em Osasco (SP). Glauco e Raoni foram mortos com quatro tiros cada, na chácara em que viviam, no bairro Jardim Santa Fé, em Osasco. O principal suspeito é Carlos Eduardo Sundfeld Nunes, 24 anos, ex-frequentador da Igreja Céu de Maria, da doutrina do Santo Daime, fundada há 17 anos por Glauco. Até o fechamento desta edição, Sundfeld estava foragido.

Ontem pela manhã, o advogado da família do cartunista, Ricardo Handro, informou que as mortes ocorreram durante uma tentativa de assalto. À tarde, depois que parentes das vítimas e testemunhas foram ouvidos na Delegacia Seccional de Osasco, a versão mudou. Segundo os relatos, Sundfeld queria que Glauco e sua família fossem até a casa da mãe do rapaz, no Pacaembu, zona oeste da capital paulista, para informar que ele era Jesus Cristo.

Cadu, como é conhecido, era amigo de Raoni e chegou a frequentar a Igreja Céu de Maria, mas estava afastado há oito meses. Segundo testemunhas, ele chegou pouco antes da meia-noite à chácara onde Glauco morava e onde construiu a sede da igreja, com um ou dois amigos, em um Gol cinza. Havia um culto no local. Ele parou o carro atrás do veículo de Juliana, enteada de Glauco, e a obrigou a chamar o restante da família. A mulher do cartunista, Beatriz Galvão, 48 anos, abriu o portão. Visivelmente transtornado e com os olhos esbugalhados, dominou Alva (outra enteada de Glauco), Gecila (mulher de Raoni), um neto e o próprio cartunista.

Glauco tentou acalmá-lo e foi agredido com uma coronhada. O cartunista propôs a Sundfeld que as mulheres fossem deixadas e ele o levasse. Sundfeld apontou a arma para a própria cabeça e disse que ia se matar. "Não faça isso!", disse Glauco. Quando Raoni chegou e se assustou ao ver o pai ensanguentado, Sundfeld atirou contra os dois. Glauco foi atingido a queima roupa no rosto. Outros dois tiros o atingiram no tórax e um no abdome. Já Raoni foi ferido por dois tiros no tórax e dois no abdômen. O estudante entrou no Gol e sumiu. Pai e filho foram encaminhados ao Hospital Albert Sabin, em São Paulo, mas não resistiram aos ferimentos.

O velório de Glauco e Raoni ocorre na chácara da família. O sepultamento está marcado para hoje, às 9 horas, no Cemitério Gethsemani Anhanguera, em Santa Cecília.

Drogas

Os policiais estiveram ontem na casa de Sundfeld, no Alto de Pinheiros, em São Paulo, e fizeram buscas nas casas do pai e da mãe do suspeito, mas não localizaram o rapaz nem a arma do crime. Ele foi reconhecido por cinco testemunhas. Segundo elas, o suspeito é usuário de cocaína, crack e maconha e frequentou a igreja para tentar se livrar do vício de drogas. A última vez em que esteve na chácara teria sido no dia 25 de janeiro, durante uma festa.

Filhos de pais separados, Sundfeld e o irmão vivem desde pequenos com os avós paternos. O único trabalho que ele teve foi como garçom. Em 2007, ingressou em Artes Visuais da Faculdade Belas Artes, mas trancou a matrícula. "Ele requer cuidados especiais. Não o vi depois do que aconteceu, nem sei com quem ele estava", disse o pai do estudante, Carlos Gricchi Nunes.

A comunidade Céu de Maria fica em uma área de mata na Estrada Alpina, perto do Pico do Jaraguá, na altura do km 18 da Via Anhanguera. Para chegar até o local é preciso percorrer cerca de 2 km de estrada de terra. A comunidade tem cerca de 400 adeptos. Glauco e a mulher Beatriz Galvão conduziam os rituais. O cartunista teve o primeiro contato com o Santo Daime há 20 anos.

Carreira

Glauco nasceu em Jandaia do Sul, no Paraná, em 1957. No colégio, era daqueles alunos que ficam no fundo da sala desenhando os professores de forma pouco abonadora. Ia fazer vestibular de Enge­­nharia, mas já em Ribeirão Preto (SP), em 1976, o jornalista José Hamilton Ribeiro o chamou para desenhar no "Diário da Manhã". O paranaense passou a publicar lá a tira "Rei Magro e Dragolino", sobre um rei que fumava baseado.

No ano seguinte ganhou seu primeiro prêmio no Salão do Humor de Piracicaba e passou a publicar tiras no jornal "Folha de S. Paulo", que em 1984 se tornariam diárias. Um de seus personagens mais famosos até hoje é Geraldão, criado em 1981: um solteirão virgem, bebedor e fumante inveterado, assaltante de geladeira, viciado em remédio e morando com a mãe até hoje. Os movimentos de Geraldão dão a impressão de que ele tem vários braços, que seguram vários cigarros, sanduíches e copos ao mesmo tempo.

Outros peronsagens são o Casal Neuras, no qual o homem posa de antimachista, mas exagera no ciúme; Dona Marta, solteirona que ataca os homens; Zé do Apocalipse, um profeta que antevê o brasileiro como o futuro da raça humana; e Doy Jorge, junkie inspirado nos cocainômanos da noite de São Paulo.

Em 1987, Glauco passou a publicar a revista "Geraldão" (pela Circo Editora). Em seguida, no início dos anos 1990, formou com os cartunistas Angeli e Laerte a tirinha "Los 3 amigos". Nela, o trio brincava com os mexicanos do universo de filmes de bang-bang. O cartunista também participou da redação dos programas "TV Pirata" e "TV Colosso", da Rede Globo.

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