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Cacilda e as filhas Michelle e Kelly em seu “ponto” na Rua XV: viagens a cada 15 dias para a capital | Fotos: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
Cacilda e as filhas Michelle e Kelly em seu “ponto” na Rua XV: viagens a cada 15 dias para a capital| Foto: Fotos: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

Conselho Estadual

O Paraná tem agora um Conselho Estadual de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais, criado por lei sancionada pelo governador Beto Richa em 19 de janeiro. O conselho, ligado à Secretaria de Estado da Justiça, será composto de 29 membros, entre representantes de secretarias e de várias comunidades. Há uma vaga para índios guarani e uma para caingangue. A primeira reunião deve ocorrer após o carnaval.

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O fluxo de índios que vêm a Curitiba vender artesanato sempre existiu, mas a rede de assistência social tem observado aumento no número de migrantes temporários. Pelos dados da Fundação de Ação Social (FAS), apenas nas imediações da BR-277, no bairro Orleans, foram identificadas cerca de 30 crianças e 20 mulheres em um mês. Também há indígenas comercializando suas peças na região central e em outros locais de movimento. O ponto de encontro deles é na rodoviária da cidade, onde dormem em situação precária, embaixo de escadas.

Como as crianças ficam em situação de vulnerabilidade, a FAS estuda tomar medidas mais coercitivas para barrar a prática. O tema é delicado, já que cada tribo indígena tem uma cultura que precisa ser respeitada.

O novo diretor de Proteção Social Especial da FAS, Antônio Carlos Rocha, afirma que se reunirá com a coordenadoria regional da Fundação Nacional do Índio (Funai) para se informar melhor sobre o caso. "Em se tratando de proteção à criança e ao adolescente, os direitos não podem ser violados, independentemente do respeito aos costumes indígenas", declara.

Ir e vir

De acordo com o coordenador técnico da Funai em Curitiba, João Luiz Serpa Silvério, a maioria das famílias são da tribo caingangue e provenientes das cidades de Nova Laranjeiras e Laranjeiras do Sul, na Região Centro-Oeste do estado. "Fazemos a conscientização e explicamos sobre os riscos de levar as crianças junto. Mas, como todo brasileiro, o índio tem o direito de ir e vir", diz.

No período de férias escolares o problema se agrava, mas ele explica que faz parte da cultura a mãe levar os filhos consigo. Segundo ele, a concorrência com outros artesãos acaba levando as famílias a locais cada vez mais longe. "A região perto de Guarapuava está saturada."

Sebastião Tavares, cacique da aldeia Rio das Cobras (região de Nova Laranjeiras), de onde partem muitas famílias com direção a Curitiba, diz que cada índio tem seus direitos e deveres. "Aqui na aldeia também aparecem muitos brancos para vender coisas. Os índios também podem ir a qualquer lugar."

Para o antropólogo Ricardo Cid Fernandes, professor da UFPR, o poder público faz um jogo de empurra. "Não há uma iniciativa institucional de cuidar do índio fora da aldeia. É preciso preparar o indígena para conviver no ambiente da lei", diz.

Casa indígena não sai do papel

A Funai planeja, há anos, erguer uma casa de passagem em um terreno no bairro Vila Isabel, originalmente doado para abrigar uma casa de saúde indígena. "Precisamos de aprovação de uma lei no Legislativo porque houve mudança de propósito", explica o coordenador técnico da fundação João Luiz Serpa Silvério. Desde 2009 a Funai fala dessa área, mas até agora nada foi feito.

O cacique Sebastião Tavares conta que algumas cidades já têm essa estrutura, que abriga os índios por um período predefinido. Ele disse que Cascavel deve começar a construir uma casa até o fim de março.

De acordo com o antropólogo Ricardo Cid Fernandes, professor da UFPR, além de providenciar estrutura, é preciso articular ações que visem a valorização da cultura indígena. "O trabalho de cestaria é muito importante, mas do jeito que a venda é feita atualmente, fica completamente desvalorizado", observa.

OportunidadeFérias escolares potencializam vinda de indígenas a Curitiba

As escadarias da rodoviária de Curitiba abrigam colchões, cobertores, algumas roupas e carrinhos de bebê. Quando o dia vai chegando ao fim, as donas dos objetos chegam, levando nas costas dezenas de balaios coloridos, outras peças de artesanato e os filhos a tiracolo.

Alheios à discussão sobre vulnerabilidade e risco social, as indígenas são gentis com a reportagem, mas muito tímidas. Entendem a maioria das perguntas, mas delas pouco se ouve. Com poucas palavras, resumem a situação: vêm a Curitiba para vender artesanato e fazer um pouco de dinheiro; trazem as crianças porque é período de férias escolares; não têm medo de ficarem na rua ou dormirem em tão precárias instalações, mas admitem que um abrigo seria melhor.

Comerciante

O "ponto de venda" de Cacilda, 30 anos, é o calçadão da Rua XV. Ela tinha cerca de 100 itens expostos, entre cestas de vários tamanhos, chapéus e arcos. "Vendi um hoje", conta. Às vezes ela consegue negociar cinco peças em único dia. Diz que fica em Curitiba até vender tudo, o que leva aproximadamente duas semanas. Depois, volta à aldeia, onde produz mais peças e dá o acabamento com tinta. Aí ela volta. Cada trecho de ônibus custa R$ 75.

Cacilda estava acompanhada das filhas Michelle, 10 anos, e Kelly, 7 anos, que disseram não ter medo de ficar no centro ou de dormir na rodoviária. De dia, ela compra marmitas. "Não tem ajuda nenhuma." Mesmo assim, ela não pede nada à reportagem. Nem dinheiro, nem insiste para que compre um balaio.

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