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A tarefa está muito longe de ser trivial. E a ampulheta já começou a contar o tempo, que é curto. O presidente interino Michel Temer sabe disso. Seu discurso de quinta-feira (12) mostrou que, pelo menos no plano das intenções, Temer parece ter a noção exata do desafio e da chance única de entrar para a história.

Seu sucesso político depende de confiança da população e da entrega de resultados. E o cenário é adverso. Temer assume o governo com uma grave crise política e econômica, com o peso de ter apoiado o PT, com ministros citados na Lava Jato e um Estado inchado, caro, ineficiente, intervencionista e patrimonialista alicerçado numa tradição política autoritária.

A nossa história foi orientada por uma cultura política intervencionista e por uma mentalidade estatista. O senso comum no Brasil baseia-se na crença de que o governo deve ser o grande agente do desenvolvimento social, político e econômico. Isso tem um enorme custo financeiro e psicológico. No primeiro caso, a conta terá que ser quitada pelos pagadores de impostos; no segundo, aprofunda a dependência e a servidão voluntária.

As promessas de não aumentar impostos e aprofundar o processo de privatização são ótimas, mas não são suficientes.

Tanto no discurso inaugural de sua presidência quanto no documento “Uma Ponte para o Futuro”, publicado pelo PMDB, existe uma intenção clara de reduzir não o tamanho do Estado, mas a participação do governo na vida econômica. Mesmo os pretendidos cortes de gastos e redução dos cargos de confiança são apenas uma forma de adequar o orçamento às altíssimas e crescentes despesas da máquina estatal. É imperativo, contudo, que a lei seja alterada para permitir a extinção de empresas e de órgãos públicos e reduzir drasticamente os cargos de confiança.

No caso da economia, há um sinal claro de que o atual governo pretende deixar que a iniciativa privada se desenvolva sem certos obstáculos e estímulos criados pelo PT via benefícios e subsídios. Assim como aconteceu com Fernando Collor de Mello, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff, Temer deve adotar certas medidas pró-mercado somente em virtude da urgência conjuntural.

As promessas de não aumentar impostos e aprofundar o processo de privatização são ótimas, mas não são suficientes. Já passou do momento de acabar com os monopólios estatais. Porque não adianta, por exemplo, ter postos de combustíveis privados com o governo tendo o poder de definir o preço dos produtos; não adianta ter um setor privado de distribuição de energia elétrica com o governo tendo o poder de estabelecer o preço das tarifas; não adianta ter um setor privado de telecomunicações com o governo tendo o poder de determinar oligopólios empresariais. Tais atribuições distorcem a economia com os estragos que estamos vendo e pagando.

Mas as grandes e fundamentais reformas não deverão sequer ser debatidas. Exemplos? A previdência social é um doente terminal à espera da extrema unção; os gastos fixos do governo são um Belzebu guloso que engessa o poder Executivo; a carga tributária asfixia a prosperidade do país; a CLT prejudica quem está desempregado, atrapalha quem está empregado, imobiliza a economia.

É improvável que o governo Temer coloque essas mudanças na sua agenda de prioridades. Porque, se confirmado o afastamento definitivo de Dilma Rousseff, terá apenas dois anos e meio para minimizar as consequências desastrosas da gestão irresponsável do PT, que teve apoio do PMDB.

A seu favor contará o fato de que a sociedade não espera grandes mudanças, mas correção de rumo. Se o pouco que fizer restabelecer a confiança interna e externa, a economia deverá voltar aos trilhos e não tardará a apresentar sinais positivos. Porque nós reagimos de forma muito mais rápida e eficiente na gestão dos recursos escassos. Se o governo parar de atrapalhar, lidaremos adequadamente com os desafios que nos competem.

Mas, repito, o momento é dificílimo e uma parcela significativa da sociedade mantém a crença de que cabe ao governo resolver todos os problemas e recusa-se a assumir a responsabilidade individual que nos cabe. É a hora, portanto, de conduzirmos o debate político e de não sermos ingênuos nem imprudentes com a inevitável euforia advinda da queda provisória do PT. Porque a ampulheta não para.

Bruno Garschagen é mestre em ciência política e relações internacionais e autor de “Pare de Acreditar no Governo” (Ed. Record)
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