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Conheci Gabriel Campagnolo, proprietário da Reserva do Uru, na Lapa, em 2003. Ele me enviou uma carta com ar de "poucos amigos", comentando que, enquanto os conservacionistas que trabalham nas cidades falavam muito, ele era um exemplo de resultados concretos. E dizia que, se eu quisesse conhecer um verdadeiro trabalho de conservação do que restava de nossos pinheirais, ele era um exemplo disso. Era sabido que coibir a continuada destruição da então quase inexistente Floresta com Araucária representava uma prioridade. O empresário Giem Guimarães, nas nossas buscas por soluções, expunha sempre seu descontentamento pela ausência de uma ação mais orquestrada nessa direção. Assim, apesar de certa resistência pela forma como Gabriel se apresentou, fui visitá-lo.

Chegamos ao Uru e, ao nos aproximarmos da casa onde ele nos aguardava, chamava atenção o velho Lada vermelho estacionado debaixo de uma jabuticabeira, e seu inseparável cachorro, deitado na varanda. Nada representava mais a rotina de 18 anos em que Gabriel permaneceu neste local, protegendo a floresta.

A hostilidade do primeiro contato diminuiu na picada por dentre as araucárias centenárias. Identificamos imediatamente nossa agenda comum. Angustiado pela premência do tempo e pela solidão de poucos parceiros, quem poderia ajudar Gabriel a conservar aquela área que, sozinho, assumiu como missão? Resolver aquele questionamento não foi tão difícil. Só havia uma resposta: Giem, o outro lado da corda, igualmente crítico e incomodado pela inércia de tantos anos.

Este "casamento" que aproximou proprietário e empresário conservacionistas gerou a primeira experiência de adoção de uma área de Floresta com Araucária no Paraná, e uma das primeiras ocorridas no Brasil. Firmamos contrato, tiramos fotos, fomos à imprensa. Poucos meses depois, Gabriel faleceu. Viu, no entanto, seu trabalho ser finalmente reconhecido, com a certeza de que de sua empreitada seria continuada pelos familiares, agora com um lastro mínimo para as ações de conservação dos 130 hectares da Reserva do Uru.

Nesses mais de dez anos, a Reserva continua sendo apoiada voluntariamente pelo Grupo Positivo e outras 30 áreas bem conservadas de Campos Naturais e Florestas com Araucária, com um total de mais de 4,5 mil hectares, vêm sendo preservadas a partir da participação também pioneira de outras empresas com visão de futuro. Muito pouco, sem dúvida, diante do desafio da conservação da biodiversidade. Mas um exemplo que demonstra a viabilidade em conciliar conservação e outros usos da terra. E de colocar outros setores da sociedade na agenda da proteção de áreas naturais.

Um passo muito importante para aumentar a escala desse trabalho foi dado com a aprovação de uma Lei Estadual sobre Pagamento de Serviços Ambientais, sancionada em 2012. E há indícios de que, finalmente, haverá uma regulamentação de mecanismos financeiros para um amplo reconhecimento aos proprietários privados de áreas naturais bem conservadas. Pelo menos, a promessa foi feita e a gestão atual garante resultados já no curto prazo.

Seja a partir de ações voluntárias de empresas, seja por mecanismos de governo, valorizar áreas naturais e seus indispensáveis serviços representa uma demonstração de maturidade e avanço. Revela que não estamos limitados a produzir a qualquer custo, nem a abrir mão, irresponsavelmente, de nosso patrimônio natural. O papel exercido por esses atores que não abaixam a cabeça garante a realização das mudanças para as quais tanto trabalhamos.

E, se o governo já prometeu, o que temos de fazer agora é manter nossa pressão para que o Paraná seja retirado do cenário de negligência com suas áreas naturais, situação que ainda hoje reflete uma dura realidade. Estamos pagando para ver.

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