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Alfredo Augusto Becker, renomado tributarista, na década de 60, registrou na sua famosa obra “Carnaval Tributário”: “A tributação irracional dos últimos anos conduziu os contribuintes (em especial os assalariados) a tal estado que, hoje, só lhes resta a tanga. (...) Porém, se a estes contribuintes tributarem até mesmo a tanga, então, perdidas estarão a fé e a esperança. Infelizmente, existem fundadas razões para que tal aconteça”.

Muitos carnavais depois, quase nus, ainda mantemos a fé e a esperança em um país melhor (não obstante o difícil momento econômico e político em que nos encontramos). Mas isso não significa dizer que teremos a nossa vestimenta de novo. Em outras palavras, não nos iludamos com uma diminuição da carga tributária.

Reforma tributária, com a redução dos impostos, taxas e contribuições, é um sonho. A nossa estrutura tributária é muito complexa e há muitos interesses diferentes (da União, dos Estados e dos Municípios) envolvidos. Basta olhar, por exemplo, para a questão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS): quanto já se falou sobre a necessidade de mudanças, de equacionar melhor a arrecadação, sobre a guerra fiscal, mas ainda não se chegou a uma definição, a uma proposta concreta e efetiva. E nem se vai chegar porque é impossível ultrapassar os interesses de cada um e de todos os estados ao mesmo tempo. Pura ilusão !

Bem na contramão do almejado, na semana passada, as empresas foram surpreendidas com o aumento da contribuição previdenciária, que dobrou de alíquota. O que nasceu, em 2011, como uma proposta de desoneração da folha – a fim de incrementar o emprego e incentivar a economia – foi agora reconhecido pelo ministro da Fazenda como algo de resultado insignificante, o que motivara, então, a sua revisão, obviamente para mais.

E já que estamos em tempo do acerto de contas com o “Leão”, outro assunto recorrente é a falta de correção efetiva e real da tabela de incidência do imposto de renda das pessoas físicas, o que acarreta, de forma indireta, um aumento anual na carga tributária por nós suportada. Sim, porque se essas faixas de incidência não são reajustadas, no mínimo, em percentual igual ao da inflação do período (e não há como negar que ela existe e está nos rondando em níveis cada vez maiores), o ganho real de remuneração acaba sendo tributado por uma alíquota maior. Ao mesmo tempo, submete-se a deduções menores (frente aos limites legais existentes).

Os dados estatísticos mostram que de 1996 até 2014, a defasagem na correção da tabela do imposto de renda chega a 66,60%. De 2008 para cá, anualmente, essa tabela e os limites admitidos de dedução são corrigidos em 4,5% - percentual que mais uma vez o governo pretende impor para 2015 -, no entanto, insuficiente para refletir a realidade da economia e a justiça necessária desta tributação, um típico imposto chamado “pessoal” e que deve observar as condições individuais de cada um contribuir aos cofres públicos. O que nos revolta (e com toda a razão) é a falta de contrapartida pelo tanto que se paga. A tributação deve vir claramente como troca e não como penalidade, tal qual sentimos hoje.

É da essência do poder público ter receitas para poder atender às necessidades sociais, o que faz (ou deve fazer) prestando serviços públicos. O problema é o descompasso nessa equação: paga-se muito e nada ou muito pouco se recebe. Onde está a segurança ? A educação ? O transporte? Tudo tem que ser complementado pelo particular. E, por outro lado, sem entender o que se paga, quanto se paga, como pode o contribuinte exigir o retorno, a contrapartida pública?

Na nossa realidade (que não se pode ignorar ou jogar para debaixo do tapete), o que se arrecada nunca é o suficiente, o bastante para equilibrar essa balança. Portanto, não é o prato da carga tributária, com a redução do seu peso, que vai resolver essa equação. O foco para se alcançar esse equilíbrio deve ser outro: voltar-se para o prato das despesas, dos gastos realizados.

E, no cenário atual – em que estão caindo, um a um, os sete véus do suposto sucesso da estabilidade econômica, descortinando-se a realidade do país – ao que tudo indica, apontou-se o dedo, pela primeira vez, para a direção correta e viável: os gastos e despesas públicas mal geridos. Ponto positivo e salutar, pois o nosso problema não está na insuficiência de receitas públicas, mas, sim, na sua incompetente administração.

A partir do momento em que se tem essa conscientização e os esforços começam a ser feitos nesse prato da balança, há uma esperança concreta. Mais do que uma reforma tributária - nessa acepção tão conhecida e almejada, apesar de ilusória, de redução da carga tributária – o que precisamos é de uma reforma fiscal, um corte e uma racionalização das despesas públicas. Eis aí a nossa tábua de salvação.

Mais do que um sonho ou um desejo coletivo, um fato concreto e real que, talvez, possa nos conduzir a um horizonte mais justo, equilibrado, com o oferecimento condizente de todos aqueles serviços públicos que são dever do Poder Público, nas condições preconizadas pela nossa Constituição Federal.

Assim, quem sabe, em um futuro não muito distante, a ilusão torne-se realidade. O país será melhor e não precisaremos (como já proposto pelo Senador Cristóvão Buarque) ter estampado na Constituição Federal um princípio que nos assegure a felicidade.

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