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Barbárie em Paris

Barbárie em Paris

Nesse momento trágico da histórica humana é muito difícil fugir das obviedades, mas de qualquer forma é necessário tentar vez que o evidente horror do terrorismo, a solidariedade expressa internacionalmente e os fundamentos políticos e religiosos dos acontecimentos desta trágica sexta-feira em Paris têm sido fruto de debates incessantes no dia de hoje.

Mas, talvez algo a ser observado não seja somente a internacionalização do terror, mas a internacionalização da estupidez humana. Einstein genialmente afirmou que duas coisas são infinitas, o universo e a estupidez humana, e em tempos de mundialização imediata da informação a infinitude da idiotia propaga-se de forma rápida e nefasta.

Perante a nossa insignificância, a imensidão da estupidez humana incomoda pelo seu evidente catastrofismo e pelo fato de que cotidianamente contribuímos para o alcance mundial de atos originados na ação humana, por mais reprováveis e questionáveis que estes sejam. Ações, atitudes e pensamentos têm o condão de gerar o caos em um mundo onde luta-se pela sobrevivência e pela soberania do certo sobre o errado a partir de uma perspectiva individualista.

Há quem diga que acontecimentos como as atrocidades de Paris são fruto de desigualdades fundamentais, talvez eu concorde com isso, mas não sob o ponto de vista econômico, mas sim a partir da tendência que temos de tentar impor uma visão igualitária de humanidade, onde busca-se explicar o ser humano como se este fosse um carro em uma linha de montagem que impõe externamente a igualdade, que os seres humanos são naturalmente iguais e que o ambiente cria condições de desigualdade.

Na realidade, a estupidez apresentada em atos como os de Paris denotam uma desigualdade baseada na imensidão da capacidade humana de cometer atos justificados em forças externas como cultura e religião. Porém, aquele suscetível à estupidez sofre de um mal que é uma prerrogativa absoluta da raça humana, onde uns são mais iguais que outros, onde a estupidez seduz outros estúpidos. Dessa forma, não rechaço a influência do meio, não rechaço as desigualdades sociais, políticas e religiosas, entretanto, talvez a principal desigualdade seja a capacidade intrínseca de elevar a estupidez a padrões infinitos, algo que deve ser combatido como uma patologia.

As relações de poder no sistema internacional estão mudando, assim como a capacidade de propagação imediata da informação e consequentemente dos instrumentos de sedução e majoração do alcance da barbárie, algo evidenciado pelo dado que informa que aproximadamente 700 jovens franceses foram seduzidos a se alistar para combater pelo Estado Islâmico, conduta esta que evidencia ainda mais a influência da propagação de imagens e argumentos como os vociferados pelo supostamente morto Jihad John, o qual apresentava ao mundo a sua sandice através de vídeos de atos impensáveis na internet.

Assim o acesso à informação tem mudado o quadro das relações internacionais, vez que a informação não mais respeita fronteiras, assim como a estupidez humana.

Os acontecimentos de Paris, além de outros fenômenos das relações internacionais, evidenciam a desigualdade humana caracterizada pela internacionalização da estupidez. Não consigo deixar de pensar na ironia e na reflexão escancarada no poema de Voltaire, quando este reflete sobre o terror presenciado quando do terremoto que acometeu Lisboa em 01 de novembro de 1755.

 

“Ó infelizes mortais! Ó deplorável terra!

Ó agregado horrendo que a todos os mortais encerra!

Exercício eterno que inúteis dores mantém!

Filósofos iludidos que bradais “Tudo está bem”;

Acorrei, contemplai estas ruínas malfadadas,

Estes escombros, estes despojos, estas cinzas desgraçadas,

Estas mulheres, estes infantes uns nos outros amontoados

Estes membros dispersos sob estes mármores quebrados

Cem mil desafortunados que a terra devora,

Os quais, sangrando, despedaçados, e palpitantes embora,

Enterrados com seus tetos terminam sem assistência

No horror dos tormentos sua lamentosa existência!

Aos gritos balbuciados por suas vozes expirantes,

Ao espetáculo medonho de suas cinzas fumegantes,

Direis vós: “Eis das eternas leis o cumprimento”,

Quem de um Deus livre e bom requer o discernimento?

Direis vós, perante tal amontoado de vítimas:

“Deus vingou-se, a morte deles é o preço de seus crimes?”

Que crime, que falta comentaram estes infantes

Sobre o seio materno esmagados e sangrantes?

Lisboa, que não é mais, teve ela mais vícios

Que Londres, que Paris, mergulhadas nas delícias?

Lisboa está arruinada e dança-se em Paris.

 

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