Semana Santa é tempo de sermos inundados por reportagens sobre temas religiosos. Arrisco dizer que na maioria das vezes trata-se de nonsense do tipo “Evangelho de Judas” ou teorias inacreditáveis do tipo “Jesus não morreu e foi morar na Índia”. Mas, de vez em quando, ficamos aliviados ao ver algo mais equilibrado como a reportagem que saiu na Veja desta semana, sobre as pesquisas no Sudário de Turim (um tema que fica adormecido por quase todo o ano para ressurgir, assim como Cristo, nesta época do ano). Infelizmente o texto não está no site da revista.
O texto se baseia principalmente em um novo livro sobre o Sudário que está sendo lançado nesta semana: O Sinal, de Thomas de Wesselow. Como comentou um amigo, leitor do Tubo, a matéria “nem cedeu aos interesses dos crentes em ver tal relíquia como prova definitiva de sua fé e nem aos desejos dos ateus de descaracterizar a ciência quando essa não fundamenta suas crenças”. Afinal, o texto lembra que há poucos registros históricos da existência de Jesus e que nem mesmo o Vaticano afirma com todas as letras que o Sudário é efetivamente o pano que cobriu o corpo de Cristo (confiram o discurso de João Paulo II em 1998 sobre o Sudário).
A reportagem não força a barra a ponto de dizer que o Sudário é irrefutavelmente o pano descrito nos Evangelhos e que a imagem foi deixada lá após qualquer fenômeno físico-químico que tenha ocorrido no momento da Ressurreição. Em seu livro sobre o Sudário, os italianos Bruno Barberis e Massimo Boccaletti dizem (e eu já lembrei isso aqui, mas vou repetir) que existem três “níveis de autenticidade” no Sudário. No primeiro nível, se atestaria que o pano realmente envolveu um cadáver e que a imagem foi produzida por processos “naturais”, ou seja, sem pintura ou outra intervenção humana similar. No segundo nível, se comprovaria que o pano é realmente do século 1.º, e que envolveu um cadáver (não necessariamente o de Cristo). No terceiro nível, o Sudário seria autêntico se fosse realmente a mortalha que envolveu o corpo de Cristo, que ressuscitou e deixou no pano a marca do seu corpo. A ciência só vai até o segundo nível de autenticidade. O terceiro depende da fé.
Se por um lado a reportagem não empurra goela abaixo dos leitores a ideia de que o Sudário realmente é a mortalha que envolveu Cristo, por outro ela mostra como várias teses de que o pano é uma falsificação medieval foram desmontadas ao longo do tempo. Como não poderia deixar de ser, há vários trechos dedicados ao exame de carbono-14. A reportagem falou inclusive com Joe Marino, coautor da hipótese que, segundo a Veja, é a mais aceita na atualidade para explicar os resultados da datação, a de que a amostra era um remendo medieval unido ao pano original com uma técnica que tornava imperceptível o ponto de união entre os dois panos (confiram o paper de Marino e Sue Benford; o artigo da Wikipedia sobre a datação também explica bem as controvérsias em relação ao processo, inclusive com as quebras de protocolo ocorridas durante a pesquisa).
O livro, pelo que se entende da reportagem, não traz nada exatamente novo, mas faz uma compilação de tudo o que se sabe até o momento sobre o Sudário, trabalho que eu considero importante, até porque volta e meia aparecem novos estudos e tentativas de reprodução do Sudário. Eu tenho dois livros sobre o tema, ambos do início de 2010; são suficientemente recentes para cobrir a mais nova tentativa de reproduzir o Sudário (a de Luigi Garlaschelli), mas sabe-se lá o que foi publicado nesses últimos dois anos. A única “viajada” que encontrei ocorre justamente quando o autor se afasta do tema principal, as pesquisas sobre o Sudário: para Wesselow, o que reforçou a fé dos apóstolos não foi a visão de Cristo ressuscitado, e sim do pano. É verdade que São João conta, em seu Evangelho, que ele e São Pedro, ao verem o túmulo vazio e os panos, acreditaram; mas daí a concluir que todos os demais relatos das aparições de Jesus aos apóstolos sejam, na verdade, “encontros com o pano”, bom, é demais, até porque alguns episódios são bem explícitos, com Jesus comendo peixe na frente dos apóstolos, por exemplo. Como Wesselow explicaria uma coisa dessas é o que vou descobrir assim que conseguir um exemplar de seu livro.
Mais Sudário
Falando em Sudário, os cariocas não podem perder a exposição que está ocorrendo no shopping Via Parque.
Na televisão
Fiz uma pesquisa nos sites de alguns canais para ver o que teremos nesta Semana Santa que pode interessar. Confiram aí:
History Channel
Em busca do tesouro sagrado: o Sudário de Turim
Quarta, 21 horas
Quinta, 1 hora e 13 horas
Sábado, 19 horas
Domingo, 7 horas e 11 horas
Em busca do tesouro sagrado: o Sudário de Oviedo
Quarta, 22 horas
Quinta, 2 horas e 14 horas
Em busca do tesouro sagrado: a Santa Cruz
Sábado, 21 horas
Domingo, 1 hora e 13 horas
Em busca do tesouro sagrado: o túmulo de Cristo
Sábado, 22 horas
Domingo, 2 horas, 9 horas e 14 horas
Em busca do tesouro sagrado: a lança sagrada
Quinta, 21 horas
Sexta, 1 hora, 7 horas e 13 horas
Em busca do tesouro sagrado: a coroa sagrada
Quinta, 22 horas
Sexta, 2 horas, 11 horas e 14 horas
Em busca do tesouro sagrado: Guadalupe
Sexta, 21 horas
Sábado, 1 hora e 13 horas
Em busca do tesouro sagrado: O sangue de São Januário
Sábado, 17 horas
Domingo, 5 horas
Em busca do tesouro sagrado: a Arca de Noé
Sábado, 23 horas
Domingo, 3 horas e 15 horas
Crucificação
Sexta, 22 horas
Sábado, 2 horas
National Geographic
A lança que feriu Cristo
Quinta, 23h15
Sexta, 5 horas
Sábado, meia-noite
As chagas de Cristo
Terça, 21 horas, 19 horas e meia-noite
Quarta, 6 e 12 horas
Sábado, 19h50
No Discovery Channel não achei nada. Os leitores que quiserem acrescentar alguma informação podem usar a caixa de comentários.
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