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Mulheres do campo

A união faz o café: produtoras juntam forças e vendem grão premiado até para a Europa

Nira Sousa, primeira presidente da Amucafé; Cintia Souza, extensionista do IDR Paraná e coordenadora do Programa Mulheres do Café; e Maria Maciel, atual presidente da associação: grão especial produzido no Norte Pioneiro do Paraná é exportado para 12 países europeus.
Nira Sousa, primeira presidente da Amucafé; Cintia Souza, extensionista do IDR Paraná e coordenadora do Programa Mulheres do Café; e Maria Maciel, atual presidente da associação: grão especial produzido no Norte Pioneiro do Paraná é exportado para 12 países europeus. (Foto: Leonardo Orcini/SRP/Divulgação)

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Com preços em alta por sucessivas quebras de safra nos principais produtores do mundo, o café virou "vilão da inflação". Mas o grão também é capaz de transformar as vidas de centenas de famílias e a economia de uma região. É o que acontece no Norte Pioneiro do Paraná, maior polo produtor de café do estado e um dos principais do país.

Cafeicultoras dessa região, que decidiram unir forças há pouco mais de uma década, hoje vendem sua produção de café especial para as mais importantes torrefadoras e cafeterias do Brasil, além de exportar para 12 países europeus.

Também já ganharam diversos prêmios, como o "Florada do Café", realizado na Semana Internacional do Café em Minas Gerais, e são as atuais vencedoras do Concurso Café Qualidade Paraná, que há 31 anos premia os melhores produtores do estado. Maristela Souza, uma das cafeiculturas do grupo, é a maior vencedora dessa premiação – já foi campeã cinco vezes.

Elas fazem parte da Associação das Mulheres Cafeicultoras do Norte Pioneiro do Paraná (Amucafé). O grupo reúne 62 famílias, que também fazem parte do Projeto Mulheres do Café, nascido há 12 anos, com atuação em 11 municípios do Norte Pioneiro. Atualmente, mais de 200 famílias fazem parte do projeto, uma iniciativa do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná – Iapar-Emater (IDR Paraná), responsável pela orientação técnica das produtoras.

Nesses 12 anos, o trabalho ganhou corpo e reconhecimento com diversas conquistas, especialmente na valorização do trabalho feminino. “A mulher tem muito disso. Ela leva tudo para a família. A renda é da família. E o desenvolvimento econômico e social é consequência”, diz Cintia Souza, extensionista do IDR Paraná e coordenadora do Programa Mulheres do Café.

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A extensionista explica que a valorização do trabalho feminino, aliada ao conhecimento técnico, possibilitou o início da produção do café especial, que demanda muito mais atenção e cuidado que o café convencional. Ao contrário do que ocorre na "commodity", caracterizada pela produção em larga escala e custo mais baixo, quem produz o grão especial tem foco na qualidade e no sabor.

“O café especial remunera melhor e agrega valor ao produto, mas ele dá mais trabalho, é mais delicado, exige um cuidado e uma paciência que geralmente só a mulher tem”, explica a extensionista.

Como no mercado não basta produzir a melhor mercadoria, foi feito um intensivo trabalho de marketing, comunicação e gestão com as cafeicultoras. Foi criada uma marca coletiva chamada Café das Mulheres, vendida diretamente ao consumidor por meio de redes sociais, o que melhorou a remuneração de quem produz e ao mesmo tempo reduziu o preço final.

O Café das Mulheres, marca coletiva das cafeicultoras do Norte Pioneiro paranaense.O Café das Mulheres, marca coletiva das cafeicultoras do Norte Pioneiro paranaense. (Foto: Lucas V. de Araújo/Gazeta do Povo)

Em paralelo, existem marcas individuais das cafeicultoras. Hoje são cerca de 20. Várias marcas são de café orgânico, rastreáveis, com baixa emissão de carbono e certificadas em sua maioria.

A maior parte da produção é vendida para cafeterias e torrefações do Brasil e exterior. Uma delas é a Wolff Café, de São Paulo. Hugo Wolff Sanches de Oliveira, responsável pelos produtos e comunicação da empresa, conta que conhece o trabalho da Amucafé desde 2017 por indicação de outros cafeicultores e faz negócios com elas pela excelente qualidade dos produtos.

“O sucesso trilhado pelas mulheres agricultoras do Paraná é 100% mérito delas, desse trabalho coletivo, dessa união por um propósito, por enxergar um futuro melhor através dessa organização. Em um país que não incentiva o empreendedorismo no campo, em que os agricultores não são tratados como empresários, e nem se enxergam dessa maneira, essas mulheres são guerreiras”, exalta o empresário.

Além do rótulo coletivo, as cafeiculturas do Norte Pioneiro também vendem cerca de 20 marcas indivudiais de café especial.Além do rótulo coletivo, as cafeiculturas do Norte Pioneiro também vendem cerca de 20 marcas indivudiais de café especial. (Foto: Lucas V. de Araújo/Gazeta do Povo)

A extensionista do IDR Paraná lembra que as cafeicultoras são todas familiares e produzem café especial em uma área de aproximadamente 3,4 hectares. “Sem a união, é impossível você ter volume para exportar e vender para clientes mais exigentes em maior quantidade”, explica.

O incremento na renda e a melhora na qualidade de vida, embora não seja pouco, foi apenas parte do processo.

“Quando me perguntavam o que eu fazia antes do projeto, eu dizia que eu era do lar, apesar de trabalhar como cafeicultora. Até então parecia que nem CPF a gente tinha. A gente era conhecida como filha do fulano ou esposa do sicrano", relembra Nira Sousa, primeira presidente da Amucafé.

"O trabalho na Amucafé não transformou apenas a cafeicultura do Paraná, ele transformou vidas, famílias inteiras. Na minha vida isso é o mais importante. É o que fez a Nira como pessoa, depois a Nira como cafeicultora também”, conta.

“Quando você faz parte de uma associação, é mais fácil obter certas vantagens, principalmente em termos de recursos, de projetos. Sem contar a venda em maior escala e para mercados mais exigentes”, diz Maria Maciel, atual presidente da associação.

“Sem associativismo é muito difícil você conseguir alguma coisa, pelas dificuldades que o produtor rural e o empreendedor enfrentam, como a burocracia, a dificuldade para obter um recurso para investir na produção”, detalha a presidente.

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