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O aumento do uso de agrotóxicos no Brasil ampliou as discussões sobre os riscos ambientais e sanitários que o fenômeno representa. Os alertas surgem a partir de pesquisas como a mantida pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), que subsídia a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) com informações sobre o segmento. As indústrias, por sua vez, evitam se manifestar isoladamente sobre o tema. Em meio a um bombardeio de questionamentos, a Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), que reúne as 15 indústrias líderes em defensivos agrícolas no país e 10 laboratórios, tenta contrapor as avaliações de alerta. Na entrevista a seguir, o novo diretor da Andef, Eduardo Daher, detalha os argumentos do setor. Em sua avaliação, informações como a de que o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo mostram apenas um lado da história.

O estudo da UFPR chegou à conclusão de que o Brasil precisa conhecer melhor o mercado dos defensivos. Em sua avaliação, as empresas e os outros órgãos do governo já conhecem bem esse mercado?

Todo trabalho acadêmico sempre será bem vindo, pois é dessa forma, em todas as áreas, que o conhecimento avança. É interessante observar como a tecnologia de defesa vegetal no Brasil vem sendo motivo de diversos estudos. Este fato, por um lado, reafirma sua importância estratégica para a agricultura e, portanto, para o desenvolvimento sustentado dos países, pois os produtos fitossanitários evitam perdas na agricultura, em média, de 40%. Por outro lado, alguns estudos sobre a indústria do setor no Brasil têm evidenciado equívocos ao desafiarem todas as evidências científicas e de mercado.

Existe alguma restrição das indústrias e laboratórios em relação à instituição desse novo observatório?

Com relação ao estudo da UFPR, especificamente, tudo indica que criar um "observatório" do mercado internacional de agrotóxicos soa redundante. Afinal, o setor é o mais regulado do país e um dos mais rígidos do mundo. Os produtos são submetidos a numerosos requerimentos da legislação. Acordos internacionais, tratados e convenções, como as Roterdã e Estocolmo, estabelecem os preceitos para o uso responsável de produtos químicos. O Brasil adota os padrões da legislação internacional, alinhando-se plenamente aos países mais avançados. Basta ver que o setor no país é regulamentado por três ministérios: da Saúde, da Agricultura e do Meio Ambiente. Portanto, no âmbito público, esses órgãos governamentais têm todo o conhecimento do setor de defensivos.

O governo estaria criando novos códigos para detalhar melhor a entrada de defensivos no país. Os pesquisadores da UFPR prevêem que haverá surpresas nos dados, que ainda não foram cruzados. O que existe entre os defensivos classificados como "outros" nas importações?

A declaração de que não é possível medir a entrada de cada formulado é, no mínimo, ingênua, e demonstra desconhecimento de regras elementares do setor aduaneiro. Todas as empresas são obrigadas por lei a fornecer um relatório semestral para os três órgãos regulatórios. Esses documentos oficiais relatam não só as importações como exportações, produção e venda. Os dados são disponibilizados no portal do Ministério do Desen­­volvimento Indústria e Comércio Exterior. Portanto, o governo tem pleno conhecimento de tudo aquilo que entra legalmente no país. A preocupação deveria existir com os casos de importações irregulares, contrabando e produtos falsificados.

Uma das metas do observatório da UFPR é mostrar suposta relação entre o registro de novos defensivos no Brasil e a valorização das ações das multinacionais do setor. Essa relação existe?

Essa relação simplesmente não consta no estudo da UFPR. Nenhuma das quinze empresas associadas da Andef possui ações em bolsas no Brasil. Mas é curioso destacar que, se dependesse da agilidade na aprovação de registros de novos ingredientes ativos no Brasil, o desempenho das empresas talvez fosse bem pior. Afinal, o ritmo de aprovação de registros está muito aquém do que determina a regulamentação imposta pelo próprio governo. O prazo de pronunciamento dos órgãos registrantes, após a empresa cumprir todo o rito exigido, teria que ser de 120 dias, mas o registro para cada novo produto tem demorado em média três anos.

Na avaliação das indústrias e laboratórios, qual o consumo brasileiro de defensivos por hectare? Esse consumo pode ser considerado alto ou baixo?

Uma leitura superficial, quando não propositadamente distorcida, do mercado mundial de defensivos agrícolas tem levado a uma conclusão absolutamente equivocada: a de que o Brasil é o país que mais utiliza esses produtos. Não é o que dizem os números. O consumo brasileiro é muito menor que o observado em ou­­tros países – embora, destaque-se, a agricultura sob clima tropical exija muito maior uso da tecnologia para controlar as pragas. Segundo dados da FAO e da consultoria Amis Global, entre os grandes países agrícolas, o Brasil apresenta um dos menores investimentos por tonelada produzida e por área plantada. Em 2007, o consumo foi de, respectivamente, US$ 88/ha e US$ 7,4/t no Brasil; US$ 851/ha e US$ 73/t no Japão; e US$ 197/ha e US$ 22/t na França. Em 2007, o aumento no Brasil foi de apenas 1%, muito inferior ao de países como Argentina (49%), China (25%) e França (28%). O aspecto que o estudo dos pesquisadores da UFPR mais critica é justamente a grande contribuição à agricultura e ao país: isto é, o fato de o Brasil iniciar a trilha seguida pelos países onde a tecnologia foi o motor do seu desenvolvimento sustentado.

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