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Os R$ 600 milhões anunciados pelo governo para destravar a comercialização de metade do trigo desta safra não estão garantindo renda a boa parte dos produtores. Não apenas porque os programas de escoamento sustentam o preço mínimo só para uma parte da safra, mas pelo fato de boa parte da colheita, ainda em curso, estar rendendo trigo de baixa qualidade. O produto, que deveria ser colhido como tipo pão, é tão ruim que não chega a ser classificado como trigo, mas como triguilho, relatam os triticultores.Os produtores entrevistados na última semana pela Expedição Safra da Rede Paranaense de Comunicação (RPC) contam que muitas áreas estão rendendo 80% de triguilho e 20% de trigo. Antes de uma avaliação das cooperativas e dos técnicos do governo, eles dizem que, na média, o produto de baixa qualidade pode representar metade da produção de cerca de 3 milhões de toneladas no estado.A classificação do trigo é baseada em índices que medem acidez e capacidade de liga. As doenças provocadas pela umidade teriam tornado o trigo mais ácido e reduzido a qualidade do produto para a fabricação de pães.O triguilho preocupa também porque, no mercado de ração, reduz a demanda por milho e, consequentemente, pressiona a cotação do cereal para baixo. Como mais de dois terços do milho brasileiro são vendidos para o mercado interno, a competição com o triguilho deve ser direta.

"O governo falou que vai garantir para o agricultor o preço mínimo, mas eu quero ver quem é que vai conseguir colher trigo com qualidade suficiente para poder usar o subsídio", diz o produtor Roberto Hasse, de Pato Branco, no Sudoeste do Paraná. A colheita em seus 85 hectares deveria ter início na primeira quinzena de novembro, mas ele afirma que ainda está avaliando se vai entrar com as máquinas na lavoura. "Fiz Proagro e vou acionar o seguro. Não sei se vai cobrir, mas já sei que neste ano meu trigo vai virar, no máximo, ração", lamenta.

Hasse está apreensivo também com a pressão sobre o preço do milho. Segundo ele, a cotação do cereal usado na alimentação animal equivale a cerca de 80% do preço da saca de milho. Como é mais barato, a indústria tende a optar pelo trigo e vai sobrar ainda mais milho no mercado, o que deve pressionar os preços da gramínea ainda mais, avalia. "No próximo inverno vou fazer nabo forrageiro, ervilhaca, ou até deixar a terra descoberta se for preciso, mas trigo não planto mais", afirma.

A pouco menos de 60 quilômetros dali, no município de Realeza, também no Sudoeste do estado, Osvaldo Wagner da Rocha relata os mesmos problemas, mas, diferente de Hasse, diz que não pretende desistir da cultura. "O dia que eu não plantar mais trigo vou ficar doente. É uma cultura que não dá tanto trabalho. Além disso, gosto muito da lavoura. Quando bate aquelas ondas de vento, parece um mar, é muito bonito", diz.

Rocha plantou neste ano 120 hectares de trigo. 30 ainda estão por colher, à espera de uma pausa nas chuvas. "A maior parte da produção será vendida a preço do milho, entre R$ 14 e R$ 15 a saca", prevê. O valor não cobre os custos. Somente para pagar as contas de custeio, teria que colher 2,5 mil quilos por hectare. "Mas não vai chegar nem perto disso."

Após três meses de chuvas quase ininterruptas, o clima também é de apreensão entre os produtores do Centro-Sul do estado. "Já fazia alguns anos que eu não me preocupava com o resultado da safra. Mas se parar de chover ainda dá para salvar a lavoura de trigo", considera o produtor Klaus Ferter, de Guarapuava. O plantio tardio fez com que as precipitações pegassem as plantas em uma fase menos sucessível ao excesso de umidade, o que minimizou as perdas, explica. Na região, os trabalhos de colheita do cereal devem começar apenas na segunda quinzena de novembro.

Nos últimos dias, a cotação do milho no mercado Paraná tem fechado a menos de R$ 16 a saca de 60 quilos.

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