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Três quartos das terras agrícolas da África do Sul são de propriedade de fazendeiros brancos | Albari Rosa/Gazeta do Povo
Três quartos das terras agrícolas da África do Sul são de propriedade de fazendeiros brancos| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

Os bancos da África do Sul se articulam para criar um “fundão” e ajudar na reforma agrária no país, com esperança de afastar a proposta de expropriação de terras e o caos que ela poderá provocar no sistema financeiro nacional.

Os investidores estão preocupados com o acalorado debate em torno da reforma agrária e com a sinalização do partido CNA (no poder) de que poderá mudar a constituição para permitir a expropriação sem compensações. O Congresso Nacional Africano argumenta que a medida ajudará a combater a desigualdade no país 24 anos após o término oficial do sistema de segregação racial. O principal partido de oposição diz, contudo, que o CNA tenta desviar as atenções do fracasso de suas políticas agrárias, na medida em que as eleições do ano que vem ficam mais próximas.

“Como setor empresarial, estamos absolutamente convencidos que para a sustentabilidade econômica e o bem-estar social deste país, a longo prazo, é preciso enfrentar os sérios problemas e desigualdades existentes”, diz Cas Coovadia, diretor da Associação dos Bancos da África do Sul (BASA). “Existem várias formas de atuar nesse sentido. Um fundo bancário é uma boa opção”.

Os banqueiros buscam maneiras de apoiar a transferência de mais terras para a maioria negra do país, de um jeito que não viole os direitos de propriedade nem ameace a estabilidade financeira. Os credores têm US$ 10 bilhões emprestados ao setor rural, contra quase sete vezes mais em operações imobiliárias, segundo a Associação, que representa 35 instituições bancárias nacionais e internacionais.

Concentração

Fazendeiros brancos são donos de quase três-quartos das terras agricultáveis da África do Sul, segundo um relatório do grupo Agri SA publicado no ano passado. O número é 87% menor do que no período do apartheid. Leis de 1913 destinavam apenas 7% das terras para negros, reservando as áreas mais férteis para a minoria branca.

“No momento, o discurso político sobre expropriação de terras segue bases totalmente irracionais, ignorando os impactos nos investimentos e no crescimento econômico”, diz Coovadia. “A narrativa que precisa ser promovida é a que considera legítimos os clamores por reforma agrária e restituição de terras, no contexto da história deste país”.

O presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, tem insistido que a reforma agrária será feita de forma civilizada, e, na semana passada, escreveu artigo no Financial Times de Londres garantindo que não haverá “confisco de terras”. “As emendas que vamos propor à Constituição vão dar garantias, tanto aos que anseiam por terras como aos atuais donos, promovendo crescimento, estabilidade e produção de alimentos”, escreveu.

Presidente sul-africano Cyril Ramaphosa em discurso perante o parlamento, na Cidade do CaboDivulgação

As negociações para formar um “fundão” dos bancos ainda estão em fase inicial, e há outras opções à mesa, aponta Coovadia. Segundo ele, ainda não se falou em montante de investimentos.

“Não precisa ser um fundo criado apenas por um setor”, diz. “Seria interessante que outras áreas empresariais participassem”.

Enoch Godongwana, chefe do subcomitê de assuntos econômicos do CNA, diz que o partido irá apoiar todo esforço que vise transferir terras agricultáveis para sul-africanos colocados à margem da sociedade. “Se os bancos estão debatendo a criação de um fundo, ótimo, nós apoiamos”, afirmou. “Já tivemos várias conversas com os bancos”.

Reforma rural e urbana

O grupo Absa Ltd, dono da maior carteira agrícola do país, propõe a criação de dois fundos distintos: um focado na reforma agrária e outro em projetos urbanos. A proposta foi apresentada em junho a um comitê de juristas sul-africanos encarregado de analisar fórmulas de uma reforma agrária.

Pela proposta da Absa, o fundo agrário financiaria a compra de terras para aumentar o número de fazendas comerciais dirigidas por negros, provendo também assistência técnica e apoio à comercialização. O fundo urbano se destinaria ao crédito imobiliário diferenciado para negros, além de apoiar empreendedores negros, oferecendo garantias em projetos residenciais de alto risco.

Por meio da federação, a Absa e os bancos parceiros Standard, Nedbank e FirstRand, solicitaram um levantamento nacional para identificar terras improdutivas. A Absa também se dispõe a financiar pesquisas por um sistema de administração que aumente a segurança da posse das terras.

O ponto de partida da proposta dos bancos, segundo a Absa, é um documento de 2011, do Departamento de Desenvolvimento Rural e Reforma Agrária, que aponta para “um fracasso sistêmico total” na questão agrária, e não apenas para um problema pontual de legislação. A reforma agrária deve ser feita olhando-se para o cenário completo, e não “para uma questão legal menor de expropriação sem qualquer compensação”, diz o banco.

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