O desempenho de Lula nas mais recentes pesquisas presidenciais, CNT/MDA e Ibope, é um fenômeno que precisa ser explicado como um desastre de avião. Primeiro, porque é mesmo indício de uma tragédia eleitoral, que vai acabar em sofrimento para todos os envolvidos. Segundo, e mais importante: como em um acidente aéreo, ele não é fruto de um só motivo, mas de uma cadeia de acontecimentos.
Condenado por corrupção e lavagem de dinheiro em duas instâncias (e por isso inelegível pela lei da Ficha Limpa), o Lula deste momento é resultado de uma complexa combinação conjuntural. A agonia da economia, o fracasso de Michel Temer e a falta de opções dentro dos quadros políticos tradicionais formaram as bases para a narrativa petista de que tudo era melhor nos tempos do Lula. Esse tripé de razões está fincado em uma outra questão de fundo, fundamental para entender a situação atual: o descontentamento generalizado com a forma de se fazer política no Brasil.
LEIA MAIS: Por que Lula aparece nas pesquisas
O PT se habituou ao longo de seis eleições presidenciais consecutivas a atuar em um ambiente de polarização com o PSDB. Um modelo que fez sentido até os protestos de junho de 2013, quando apareceram os primeiros indícios de que uma ruptura grande estava a caminho. O segundo turno entre Dilma Rousseff e Aécio Neves, em 2014, trouxe artificialidade ao embate entre polos: as pessoas permaneceram divididas, mas não se encaixavam mais nos limites do PT x PSDB.
Acabou a eleição, os nervos continuaram à flor da pele e a Lava Jato trouxe mais pressão para ambos os lados. A máscara ética de Aécio caiu por terra e levou a dos tucanos junto. Dilma caiu com o impeachment, mas o PT usou o mesmo impeachment como justificativa para dizer que a “culpa” pelo descontentamento com a política não era dele, mas das “raposas” lideradas pelo MDB de Temer.
Aí chegamos ao ponto crucial: Lula se transformou em um candidato antissistema. Votar nele é jogar na cara dos outros: meu candidato está preso, todo enrolado em casos de corrupção, mas não estou nem aí para isso. O que me importa é que ele não é igual aos outros e que, votando nele, posso avacalhar com o sistema e contra tudo o que está aí.
Da sua prisão em Curitiba, Lula captou e incentivou o aprimoramento desse cenário. Jogou todas as suas fichas na cortina de fumaça que virou sua candidatura e está saindo dela para a impugnação legal com 37% das intenções de voto, segundo CNT/MDA e Ibope. Só tem uma conta que não fecha até agora: ninguém sabe com qual eficiência vai transferir votos para seu poste, Fernando Haddad.
DESEJOS PARA O BRASIL: Uma democracia aprofundada
Deliberado por Lula ou não, a estratégia provocou um efeito colateral: o crescimento de Jair Bolsonaro (PSL). O líder das pesquisas sem Lula é um segundo filho do movimento antissistema. A diferença é que Bolsonaro, ao que consta, não será vitimado pela Ficha Limpa.
Ao esticar ao máximo a tese de que será candidato, Lula infla o ambiente de confusão. Depois do furacão da impugnação da sua candidatura, conseguirá vender Haddad como ícone do nós contra eles? Talvez.
O certo é que não terá como controlar os efeitos disso a favor de Bolsonaro. No final das contas, e por mais curioso que isso possa parecer, quanto mais Lula sobe, mais crescem as condições para Bolsonaro ser eleito.
Metodologia das pesquisas:
* Pesquisa realizada pelo Ibope de 14/ago a 20/ago/2018 com 2002 entrevistados (Brasil). Contratada por: Rede Globo. Registro no TSE: BR-01665/2018. Margem de erro: 2 pontos percentuais. Confiança: 95%.
** Pesquisa realizada pelo CNT/MDA de 15/ago a 19/ago/2018 com 2002 entrevistados em 137 municípios (Brasil). Contratada por: CNT. Registro no TSE: BR-09086/2018. Margem de erro: 2,2 pontos percentuais. Confiança: 95%.
Ex-desembargador afirma que Brasil pode “se transformar num narcoestado”
Contra “sentença” de precariedade, estados do Sul buscam protagonismo em negociação sobre ferrovia
Câmara de São Paulo aprova privatização da Sabesp com apoio da base aliada de Nunes
Lula afaga o MST e agro reage no Congresso; ouça o podcast
Deixe sua opinião