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Uma grande surpresa na noite. Eram todos vinhos de Toledo
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Anacreon de Téos
Os vinhos da degustação às cegas da La Vinothèque. Uma grande surpresa para os presentes.

A história recente do vinho tem como um dos seus momentos marcantes o “Julgamento de Paris”. Divisor de águas, pode-se dizer, embora não seja conveniente juntar água ao vinho.

Quem já circula pelo mundo dos vinhos e aprecia os prazeres dali advindos sabe ao que estou me referindo. Para os demais, explico que o tal julgamento foi uma provocação de um comerciante de vinhos britânico, Steven Spurrier, que organizou em Paris, em 1976, uma comparação entre os vinhos franceses e os californianos, que àquela altura estavam fazendo muito barulho de qualidade na divulgação de seus produtos.

Degustação às cegas, entre sommeliers, proprietários de restaurantes estrelados e produtores franceses de vinho e os californianos ganharam de cabo a rabo, nos brancos e tintos. E há até uma expressão famosa, de Raymond Oliver, dono e chef do restaurante Grand Véfour, que comentou alto ao receber e provar uma das taças de vinho branco: “Ah, voltamos para a França”, saudando, efusivamente, o Freemark Abbey Winery 1972, um chardonnay do Napa Valley.

Esta degustação comparativa foi repetida recentemente, em 2006, na comemoração dos 30 anos do primeiro evento. Novamente às cegas, jurados europeus e norte-americanos degustaram, simultaneamente, em Londres e na Califórnia, exatamente os mesmos vinhos da primeira ocasião. E o resultado foi mais acachapante ainda, goleada californiana.

Nas degustações às cegas realizadas por peritos e entendidos convidados, de vez em quando se inclui um vinho fora do contexto, ao qual chamam de “intruso”, para mexer com a capacidade de percepção dos jurados. Um italiano em meio aos franceses, por exemplo. Ou um do novo mundo em julgamento de europeus. E em alguns casos esses intrusos roubam a cena, justamente por não terem sido visualmente identificados no momento de servir.

Lembrei-me disso tudo na degustação que houve na última terça-feira, na La Vinothèque. Quem me sondou primeiro foi a jornalista Elis Cabanillas Glaser, editora da revista virtual Vinícola (que, aliás, está em seu terceiro número, que vale a pena ser visto). “Você vai se surpreender” – foi o que me disse, recomendando que lhe contasse depois o que tinha achado. Surpreendidíssimo – complemento agora.

O convite dizia: “Será uma degustação às cegas onde o menu do jantar é revelado, mas os vinhos não. É uma surpresa que só será divulgada no final do jantar”. Mas tudo bem, já passamos por outras e as degustações às cegas são sempre muito divertidas.

Anacreon de Téos
A chef Ana Claudia Spengler, responsável pelo cardápio da noite.

Enquanto não vinham os pratos, os presentes eram recepcionados com um agradável espumante brut. Não é champagne – foi o consenso da minha mesa. Não era mesmo. O primeiro vinho a ser degustado tinha tudo para ser um torrontés, um branco perfumadíssimo. Era um sauvignon blanc, seguido de um tempranillo e de um merlot, este de boa presença em aroma e paladar. Novo mundo, pelo menos – foi nosso palpite. Acertamos.

Anacreon de Téos
Creme de abóbora com especiarias e tomilho, servido com Crostini de parmesão.

Para o jantar que veio a seguir, com pratos concebidos pela chef Ana Claudia Spengler, responsável pela cozinha do La Vinothèque, haveria outras interessantes surpresas. A começar pelo branco que escoltou a entrada, um delicado Creme de abóbora com especiarias e tomilho, servido com Crostini de parmesão. Aromático e bem presente, talvez o melhor da noite, descobriríamos depois tratar-se de um vinho da uva malvasia.

Anacreon de Téos
Steak au poivre vert e mousseline de batata salsa, o prato principal.

O prato principal, um Steak au poivre vert e mousseline de batata salsa teve como acompanhamento um cabernet franc que apanhou um pouco das pimentas – que, aliás, estavam deliciosas. E para acompanhar a sobremesa, Pera ao vinho com creme anglaise, fechando a noite, outro espumante, este um demi sec, mas não tão atraente como o primeiro.

Anacreon de Téos
Pera ao vinho com creme anglaise.

Terminado o jantar, a pergunta se alguém poderia imaginar de onde seriam os vinhos. São todos de um mesmo produtor – foi a dica. Alguns murmúrios de palpites sugeriam argentinos ou chilenos. E quase todos caíram de costas quando veio a revelação: brasileiros. Mais ainda: paranaenses, de Toledo. Da Vinícola Dezem, pequena vinícola familiar daquela cidade do Oeste.

Os vinhos são produzidos em três status: linha básica luxo, a Magne, no qual se encaixa aquele malvasia; a linha Premium, a Extrus, do aconchegante tempranillo; e a linha Super Premium, do merlot servido na degustação.

São vinhos ainda em fase de formação de caráter, mas já com algumas qualidades bem avançadas. Nada comprometedores, se saíram muito bem nas mesas entre pessoas acostumadas com o paladar. Se talvez tivessem sido servidos às claras, provavelmente carregariam o peso do preconceito natural de quem jamais conceberia ser possível a geração de vinhos de qualidade no solo paranaense.

Pois os vinhos de Toledo passaram garbosamente no teste. E dentro de mais alguns dias estarão à disposição dos curiosos e interessados nas prateleiras da La Vinothèque.

La Vinothèque

Rua Saldanha Marinho, 1487, Bigorrilho
Fone: (41) 3077 1020

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Blog anterior: http://anacreonteos.blogspot.com/
Twitter: http://twitter.com/AnacreonDeTeos
E-mail: a-teos@uol.com.br

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