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A revista americana Variety destacou 2006 como o ano das histórias reais no cinema. Da antiga civilização maia aos eventos do dia 11 de setembro de 2001, Hollywood viu passar uma avalanche de filmes que usam acontecimentos do passado para nos oferecer lições sobre o presente.

Segundo a publicação, apenas um filme lançado este ano, "Home of the brave", do diretor Irwin Winkler, trata da atual guerra dos Estados Unidos com o Iraque. Mas uma leva de produções tem muito a dizer sobre a crise que acontece hoje através de uma lente histórica, sejam as destruições da guerra ("A conquista da honra", "Cartas de Iwo Jima" e "O segredo de Berlim"), a corrupção ou a falta de visão dos poderosos ("A rainha", "O último rei da Escócia", "Maria Antonieta" e "Apocalypto"), ou terrorismo, tanto do passado ("Catch a fire") quanto mais recente ("Vôo United 93" e "As Torres Gêmeas").

O roteirista Peter Morgan, de "A rainha" e "O último rei da Escócia", explicou à Variety que essa tendência do cinema de mergulhar nos livros de história para contextualizar fatos atuais é mais do que uma questão prática, já que freqüentemente existe um grande espaço de tempo entre a produção de um filme e o momento em que ele de fato chega às telas, o que atrapalha quando a intenção é falar de acontecimentos atuais.

- Eu acho que precisamos de tempo para a poeira baixar. Com a exceção de "Vôo United 93", que é um relato do que aconteceu, uma transcrição de conversas gravadas, eu acho que devemos esperar dez anos para ter uma perspectiva, assim como os melhores filmes sobre o Vietnã foram todos feitos cerca de dez ou 15 anos depois - explicou.

Como Morgan, o diretor de "O último rei da Escócia", Kevin Macdonald, disse que tem lido muitos roteiros sobre o Iraque ultimamente, mas ele acha que são "muito duros e muito diretos... Abordar algo de uma forma metafórica pode ter um efeito maior, porque você está fazendo as pessoas pensarem numa questão de uma forma mais profunda", disse.

A produtora de "Catch a fire", Robyn Slovo, cujos pais se envolveram diretamente com a batalha contra o apartheid narrada no filme, concorda que um drama político potente precisa de "tempo e perspectiva".

Enquanto "Catch a fire" foi feito primeiramente para contar "uma boa história" e "não discursar para ninguém", Slovo reconhece que o filme tem relevância atual ao fazer as pessoas pensarem sobre a liberdade - e a falta dela - a partir da interpretação de acontecimentos passados.

Robert Lorenz, que produziu os dois contos de Clint Eastwood sobre a Segunda Guerra Mundial "A conquista da honra" e "Cartas de Iwo Jima", disse que eles nunca planejaram levar a opiniões sobre eventos atuais, mas ele afirmou que isso não significa que o filme não tenha lições a transmitir.

- Nenhum dos filmes quer dizer nada sobre a Segunda Guerra ou a guerra em que estamos envolvidos agora. É só guerra, em geral, e a descrição de uma batalha de ambos os lados, é realmente sobre o impacto nas pessoas envolvidas - conta.

O estudioso da história do cinema David Bordwell explica que pode ser "mais seguro" para os cineastas tratarem de realidades contemporâneas de forma indireta, porque, ele diz, isso "os imuniza contra críticas de que teriam sido enfáticos demais" e evitaria "o risco", ele acrescenta, "de polarizar o público e de fazer certos setores sentirem que Hollywood é crítica ao mainstream".

O co-produtor e co-roteirista de "Apocalypto", Farhad Safinia concorda com o historiador.

- É quase impossível alcançar todo mundo, porque todas essas questões causam muita discórdia, mas se você pega esses mesmos assuntos e os ambienta 500 anos atrás, de repente, você é capaz de alcançar um público maior - disse - Você permite ao público se envolver com as questões mais facilmente e não se sentir menosprezado ou ofendido. É uma grande vantagem fazer filmes dentro de um contexto histórico. A última coisa que você quer é dizer às pessoas que a maneira que vivemos nossas vidas é errada.

Depois do 11 de setembro e das invasões ao Afeganistão e ao Iraque, cineastas vêm experimentando um ressurgimento de um cinema atual, mesmo que ele se passe no passado.

- Em termos de América, eu acho mesmo que tem a ver com o 11 de setembro. Poderia ter acontecido o contrário, com todo mundo querendo filmes que fizessem sentir-se melhor, mas me parece que o povo americano ficaram interessados em aprender mais. Há um apetite enorme por história de uma forma que não costumava acontecer. Costumava ser o "beijo da morte", mas agora, quando você leva uma história real a um financista, eles ficam muito interessados - diz Slovo.

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