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Aos 62 anos, e com mais de 30 de carreira, Leci Brandão finalmente goza do sucesso merecido, após anos de dificuldades. Cortejada por sambistas de todas as tribos – dos mais autênticos aos mauricinhos –, a cantora e compositora carioca comemora a boa fase com seu primeiro DVD, Ações Afirmativas – Ao Vivo. São 19 canções em que Leci revisita a própria trajetória, acompanhada por gente de peso como Alcione, Jorge Aragão e o rapper Mano Brown.

Apesar do título politizado, o show, também disponível em CD, traz sambas de diversas tendências (românticos, religiosos, de roda, etc.). Entre hits, versões e três inéditas, duas músicas têm um sabor especial para Leci: "Preferência", a primeira gravação, e "A Filha da Dona Lecy", homenagem à mãe – e quase homônima. "Não queria fazer uma coisa cronológica, mas essas duas são essencias na minha história", diz. A seguir, ela fala sobre a volta por cima, carnaval e sua atuação política.Seu nome voltou a ficar em evidência de uns anos para cá. Antes disso, porém, você passou por um período difícil. O que aconteceu?Foi uma hora braba da minha vida. Entre 92 e 97, fiquei afastada da mídia. Ninguém mais me ouvia, eu não tinha gravadora e nem divulgação. Cheguei a ter problemas particulares, fiquei devendo dinheiro. Até que o meu amigo Osmar Costa (produtor artístico) me levou para São Paulo, onde uma nova geração do samba estava em alta. Grupos como Sem Compromisso, Art Popular, Sensação. Eles, que sempre gostaram de mim, passaram a gravar minhas músicas e me convidar para shows. Foi essa garotada que trouxe a madrinha de volta.Você, como ouvinte, admira o trabalho desses grupos? A crítica foi severa com eles na época do estouro do pagode romântico...Eu sempre cobrei dos meninos que, quando fizessem um disco, gravassem pelo menos duas faixas falando de questões sociais. Não vou dizer que os críticos não estavam certos, mas essa é uma geração que não teve cultura e nem educação. Eu, o João Nogueira, a gente ainda estudou em escola pública boa, fez faculdade. Não dá para fazer um parâmetro. Quanto às músicas, acho que tem muita coisa que dá para gravar, sim.Mesmo na "hora braba", o público ainda a acompanhava como comentarista do carnaval na tevê. Sua participação já está confirmada na cobertura do ano que vem, nos desfiles de São Paulo? Como anda a evolução das escolas paulistas?Graças a Deus, eu nunca parei de fazer o carnaval. E estarei lá em 2007. Ainda não dá para comparar o desfile de São Paulo com o do Rio. É outra verba, outra estrutura. Mas as escolas paulistas estão crescendo. Famílias tradicionais do samba ainda comandam as escolas, o que é muito bom. E, apesar de estar um pouco afastada do carnaval do Rio, vejo coisas boas por lá também. Eles estão querendo valorizar a comunidade, a velha guarda, os sambas enredo. Isso é ótimo.Apesar de não ter filiação partidária, você é integrante do Conselho de Promoção da Igualdade Racial, ligado à Seppir (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial) e, por tabela, ao governo federal. Como reage às críticas de quem acredita que a Secretaria não deveria ter status de ministério?A igualdade racial e os direitos humanos e da mulher são os pilares das ações afirmativas. Sem eles, não se constrói uma sociedade mais justa. Metade da população brasileira é negra e, com a criação da Seppir, pela primeira vez na história as questões raciais tiveram visibilidade no país. A Secretaria tem de continuar.Você sempre fez campanha para o Lula. Acredita, realmente, que o presidente não tinha conhecimento dos casos de corrupção no governo?É claro que eu detesto corrupção. Mas esse cara, o Lula... Eu continuo confiando nele. O problema é que muita gente que o cercou tinha más intenções. Aí veio a oposição e tentou tirar ele no tapetão, na base do golpe, falou-se em impeachment. Só que o povo não quis saber disso. Viu que a vida melhorou. Passou a comprar comida mais barata, pôde matricular o filho no curso pré-vestibular, etc.Você é mulher, negra, artista, de origem humilde, adepta do candomblé, brasileira. Enfim, "vítima" potencial de quase todo tipo de preconceito. Considera-se uma sobrevivente?Com certeza. E Deus me deu uma resposta legal nessa virada de milênio. Como se dissesse: "Essa gente agora vai entender você".E a que deve esse reconhecimento e respeito?À minha coerência, minha humildade. Sou uma artista popular, não uma celebridade.

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