Curadora do Festival de Curitiba, a carioca Tania Brandão frisa que o teatro brasileiro é peculiar por estabelecer um "estado de liberdade". Ideia que defende no livro Pequena História do Teatro Brasileiro, em processo de escritura.
Quer dizer: abandonado pela academia e pelo poder, e, portanto, sem as amarras que essas instituiçoes poderiam impor, o palco nacional estaria sempre se reinventando por seus próprios meios. A consequência? "O teatro brasileiro se inclina a ser contemporâneo com muito mais frequência do que qualquer outro próximo (o francês, o português, o argentino, o norte-americano...). Mas a voltagem das invenções e das quebras da linguagem tende a ser mais superficial e conciliatória", compara.
Tânia chama a atenção para a falta de renovação entre os nomes fortes da direção teatral. Na edição deste ano da Mostra Contemporânea, figuram Paulo de Moraes, Gabriel Villela, Felipe Hirsch, Moacir Chaves e os atores-diretores Gilberto Gawronski e Vera Holtz. "Mas não temos novos diretores se projetando", observa talvez, porque o teatro de grupo tenha enfraquecido a hierarquia que punha diretores no topo da encenação. "A leva mais forte, agora, é de uma nova dramaturgia."
Focado nesse universo dramatúrgico, da atuação dos grupos e da "inventividade dos musicais", o festival deste ano buscou trabalhos "capazes de trazer doses consideráveis de proposição do novo e algum grau de mudança de linguagem", diz ela.
O investimento na nova dramaturgia se vê em obras como As Próximas Horas Serão Definitivas, na qual a incensada dramaturga carioca Daniela Pereira de Carvalho repete a parceria com o diretor Gilberto Gawronski (Por uma Vida um Pouco Menos Ordinária). "Com diálogos, às vezes ferinos, outras literários, mas sempre nervosos, a autora se volta para inspiração algo cinematográfica", observou o crítico Macksen Luiz.
Outro carioca, Pedro Brício, freou as atuações em novelas e concentrou sua atenção no teatro, ganhando notoriedade como dramarturgo e o Shell pela autoria de A Incrível Confeitaria do Sr. Pellica. Sua obra vem se compondo de comédias que propositadamente não dão certo, musicais que fracassam, e inversões do tipo. Me Salve, Musical, em cartaz no festival, ironiza os mecanismos produtivos do teatro em um anti-musical que se rebela contra enquadramentos de gênero. É de Brício também o texto de Comédia Russa, dirigida por João Fonseca, na Mostra Contemporânea. Aqui, o autor evidencia o patético de uma repartição pública.
Jô Bilac, nomes dos mais recentes nessa lista, foi projetado pelas montagens de Cachorro! e Rebu e agora apresenta Savana Glacial na Mostra Contemporânea. Encenada pelo grupo Teatro Físico, a peça sobre uma mulher com problemas de memória experimenta novos modos de fisicalidade em cena.
Na mesma listagem, o nome mais consagrado é o de Newton Moreno (autor de Agreste, As Centenárias e da adaptação Memória da Cana), de quem se verá o monólogo O Livro, metaforizando a cegueira, sob a direção inventiva de Christiane Jatahy carioca que causou fortes impressões no ano passado ao dirigir em cena aberta o espetáculo Corte Seco.
Tania Brandão cita ainda a dupla Maurício Arruda de Mendonça e Paulo de Moraes, do Armazém, com o espetáculo Antes da Coisa Toda Começar, criado em processo colaborativo de improvisação com o elenco no qual a atriz curitibana Rosana Stavis entrou como substituta. "Um jogo cênico que é surpresa constante e cujas modulações visam desestabilizar as certezas do espectador", escreveu o crítico Eldécio Mostaço, no site Questão de Crítica.
"Esses textos abordam temas atuais, sob um viés crítico, ácido, irônico. Empregam recursos de rompimento com as formas tradicionais da dramaturgia: usam narração, quebra da ilusão, fusões, cortes, mixagem", diz a curadora, comentando a safra que se verá na cidade durante os próximos dias.
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