
Passo Fundo (RS) Longe dos grandes centros, afastada da capital Porto Alegre, a cidade gaúcha de Passo Fundo atrai centenas de escritores e milhares de leitores a cada dois anos para a Jornada Nacional de Literatura. A 12. ª edição, que acontece durante esta semana, com o tema Leitura da Arte e Arte da Leitura, apresenta alguns dos principais escritores nacionais, como Marina Colasanti, Milton Hatoum, Affonso Romano de SantAnna e Luiz Ruffato, além de estrangeiros como Carlos Ginzburg, Mia Couto e Miroslaw Bujko.
Como um município de 200 mil habitantes consegue o impressionante feito de se tornar a "Capital Nacional da Literatura"? "Nós temos um objetivo que é buscado há 26 anos: a formação de leitores", explica a coordenadora da jornada, Tania Rösing. A ampla programação só é possível pela iniciativa conjunta da Universidade de Passo Fundo (UPF) com a Prefeitura Municipal. Mas o nome forte à frente da organização é mesmo o da coordenadora, que defende vigorosamente seu projeto de consolidar a jornada não apenas como evento isolado, mas como uma movimentação cultural permanente na cidade.
"Cada jornada é o ápice de um trabalho de dois anos", enfatiza. Nesse período, acontecem diversas ações formativas e de divulgação cultural. Na Universidade de Passo Fundo, o Centro de Referência de Literatura e Multimeios atende a alunos da educação infantil ao ensino superior. O programa Mundo da Leitura e o quadro Boa Leitura são transmitidos pelo canal Futura para todo o país. "Participamos de feiras e orientamos professores", diz a coordenadora.
A conseqüência de todo esse trabalho é o crescente apoio das editoras e a quantidade cada vez maior de escritores interessados em participar das jornadas. Mas o principal resultado é contabilizado no quesito que mais importa à idealizadora: o crescimento do índice local de leitura. Segundo pesquisa do IBOPE, encomendada pela Câmara Rio-Grandense do Livro, a região gaúcha que mais lê é a de Passo Fundo: cada pessoa lê 6,5 livros por ano. Os bons números chegam à Porto Alegre, com média de 5,8. A média geral brasileira, infelizmente, não ultrapassa 2,5.
De acordo com a coordenadora, a grande dificuldade para organizar um evento cultural de grande porte como a jornada é a obtenção de recursos financeiros. Este ano, a organização enfrentou problemas para conseguir apoio no estado. O Conselho Estadual de Cultura se recusou a repassar os recursos da Lei de Incentivo ao projeto. A negativa foi amplamente criticada na cerimônia de abertura realizada na segunda-feira.
A abertura da 12. ª Jornada foi também o momento da entrega do 5.º Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de Literatura, direcionado ao melhor romance de língua portuguesa publicado nos últimos dois anos, para o escritor moçambicano Mia Couto (finalista do Prêmio Portugal Telecom), pelo livro O Outro Pé da Sereia.
No palco da tenda armada para a jornada, o escritor falou da "honra" de receber o prêmio. "Meus grandes mestres vêm desta terra, desde Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Cla rice Lispector, Manoel Barros, Adélia Prado e tantos outros. Esses escritores me instigaram a imprimir na língua portuguesa a marca de uma outra cultura, que no meu caso é a cultura africana. Tudo isso me faz sentir profundamente devedor para com o Brasil".
* * * * *
A jornalista viajou a convite da organização do evento.



