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Cobertura científica brasileira vem evoluindo, mas ainda encontra preconceito entre os acadêmicos | Divulgação
Cobertura científica brasileira vem evoluindo, mas ainda encontra preconceito entre os acadêmicos| Foto: Divulgação

No ano passado, durante a Feira Literária do Sesc-PR, em Curitiba, Matinas Suzuki Jr., editor da revista Serrote, contrariando certas tendências negativistas que costumam dominar o ambiente jornalístico, afirmou perceber que parte da novíssima geração de profissionais brasileiros, em certas áreas, já saberia muito mais do que a própria geração que o formou. E, como exemplo concreto dessa evolução, prontamente citou as editorias de ciência. "Hoje, a cobertura científica nos jornais é muito melhor do que era", disse Matinas. "Nas redações, estão se formando jornalistas especializados. Não tinha isso no nosso tempo."

Para o editor da revista Conhecer, Salvador Nogueira, Matinas está certo. "Isso acontece porque a cobertura de ciência exige de fato especialização", garante. "Em outros segmentos, até dá para ‘dar uma enganada’, mas, nesse ramo, ou o jornalista está disposto a aprender e se aperfeiçoar sempre, ou será engolido pelo mercado." E como a quantidade de vagas oferecidas nesse segmento específico do jornalismo ainda é muito pequena, o próprio processo seletivo, segundo Nogueira, já tornaria os profissionais contratados necessariamente mais qualificados.

Sérgio Gwercman, diretor de redação da Superinteressante, não é tão otimista, nem vê tantas me­­lhorias no setor. Na verdade, faz questão de frisar que a Super — um tremendo sucesso editorial no Brasil, em circulação desde 1987 e com tiragens mensais de 350 a 360 mil exemplares — não é exatamente um veículo de divulgação científica; para ele, a revista seguiria uma vocação mais "generalista". Entretanto, ao analisar, como mero observador interessado, o mercado que o cerca, Gwercman avalia as editorias de ciências como sendo "um pouco inconsistentes", no sentido de que ainda dependem muito das capacidades individuais de cada profissional que trabalha nelas. "Quando esses profissionais mi­­gram para outro veículo, também é comum que migre, com eles, a sua qualidade", diz.

Já o jornalista paranaense Jones Rossi, editor de Ciência e Saúde da Veja.com, com passagens pelo site da Gazeta do Povo e revistas como Superinteressante, Globo Ciência e Galileu, adota uma posição menos extrema. Acha que a situação do jornalismo científico brasileiro está cada vez melhor, mas acredita que ainda falta muito para se atingir um estágio ideal: "Não existem tantos bons profissionais por aí, nem cursos para formá-los".

Clube fechado

Para Rossi, um elemento fundamental ao jornalismo científico, tão importante quanto a formação de seus profissionais, é a clareza. Mesmo assim, ele conta que há leitores e membros da academia que combatem essa ideia, desejando fazer parte de um "clube fechado", ao qual só iniciados poderiam ter acesso. "Piores são os acadêmicos que simplesmente não entendem o valor da imprensa, ou que não sabem como se expressar claramente, porque também não pensam de forma clara", lamenta. "Não veem que o mundo mudou e que a informação está ao alcance de todos."

Gwercman, por sua vez, crê que é injusto generalizar e dizer que há um preconceito da academia em relação à Superinteressante, por exemplo. "Os acadêmicos brasileiros são muito ciosos com seu trabalho", justifica. Para ele, o preconceito da academia contra o jornalismo, na verdade — e também a impressão de que a imprensa seria uma vulgarizadora de conceitos —, refletiria apenas a mútua e "eterna frustração" que caracteriza o delicado relacionamento entre os jornalistas e suas fontes, em qualquer área.

Ao ouvir o termo "vulgarização", Rossi prefere trocá-lo por "disseminação". "Mas tem gente que ainda vive a ilusão de que a informação pode ser controlada", diz. Carl Sagan, lembra, discorria sobre astronomia no horário nobre da tevê americana, em um país que, a despeito de suas universidades de ponta e de órgãos como a Nasa, ainda vê "teorias bizarras como o criacionismo" ganharem força entre a população. "Imagine, então, falar de vulgarização da ciência em um país de analfabetos funcionais como o Brasil."

Para o físico e escritor Marcelo Gleiser, acreditar na banalização da ciência pela imprensa é assumir "uma posição equivocada e antiquada". "Uma coisa é educar cientistas, outra é educar as pessoas sobre ciência", esclarece. "Para ser cientista, você tem que ir à universidade e se preparar tecnicamente. Para aprender sobre ciência, você precisa ter interesse e acesso a conceitos explicados o mais claramente possível." Gleiser acredita que o propósito da divulgação científica seja o de levar a ciência ao público não especializado e inspirar os jovens a seguir carreiras científicas. "É uma tradução, sim, mas não necessariamente uma deturpação."

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