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Na França dos anos 50, jovens críticos de nomes Truffaut, Godard e Chabrol deixaram a redação da revista Cahiers du Cinéma para se tornarem diretores. Em um intervalo de tempo curto para os padrões cinematográficos, lançaram filmes que mudaram por completo a maneira como o cinema era feito no mundo. Foi uma revolução, mais tarde chamada de Nouvelle Vague ("nova onda").

Na Curitiba dos anos 00, quatro jovens formados em Letras saem do ambiente acadêmico para se tornarem escritores. No prazo de meses – mais ou menos entre setembro e dezembro do ano passado –, lançam livros de estréia pela 7Letras, dentro da coleção Rocinante. Ainda é cedo para gritar "revolução", mas o fato de conseguirem publicar em um mercado como brasileiro e serem (ou viverem) em Curitiba pode caracterizar uma cena literária local. A nova onda das letras paranaenses.

Começou com Carlos Machado. Depois de esperar anos para ser publicado por uma editora que deu o bolo, retomou seus textos e os apresentou para o editor Jorge Viveiros de Castro, da 7Letras. O resultado foi a antologia de contos A Voz do Outro (2004), seguido, no ano passado, de Nós, da Província: Diálogos com o Carbono.

No curso de Letras da Universidade Federal do Paraná, Machado conheceu Lindsey Rocha e Assionara Souza. Elas, sem saber uma da outra, enviaram originais para a editora carioca e emplacaram Nervuras do Silêncio (prosa poética de Lindsey) e Cecília Não É um Cachimbo (contos de Assionara). Fora do grupo, Mário Araújo – curitibano residente no Uruguai – completa a quadra com A Hora Extrema, também de contos.

Além da tendência para narrativas curtas, os quatro compartilham Curitiba como cenário e, às vezes, personagem. Para a potiguar Assionara (a única "estrangeira" do quarteto), a cidade é "cheia de mistérios", "silenciosamente violenta", "bonita" e "triste". Machado a considera "contraditória": "Uma cidade que precisa ser construída novamente, mas que continua, sem maiores problemas, sabendo dessa impossibilidade". Araújo acredita que ela está se tornando "menos tímida, menos provinciana". Já Lindsey se abstém: "Nunca estive muito tempo longe daqui. Talvez por isso não tenha uma visão apurada da cidade. E algo me diz que isso é muito triste".

Primeira vez

Das dificuldades impostas pelo mercado editorial do Brasil – que passam por poucos leitores, baixo poder aquisitivo e altos preços de livros –, é de se imaginar qual é a sensação do escritor que vê seu trabalho editado pela primeira vez. "É mais ou menos como uma mudança de estado físico da matéria", explica Araújo, para quem o livro morre quando é finalizado, ressuscita ao ser editado e volta a morrer pouco depois.

"Nada acontece enquanto não encontrarmos o primeiro leitor: é só ele que importa. E todos os leitores são sempre o primeiro, porque a visão é sempre diferente", diz Assionara. Machado lembra do alívio que sentiu, "como se tivesse tirado um piano das costas". Para Lindsey, "dá vertigem". "Sensação de estar e não estar em vários lugares ao mesmo tempo."

Pretensões

Nas palavras de Assionara, "qualquer pretensão literária é ousada". "Escrever é lidar com limitações", afirma. Machado considera o processo de criação "muito angustiante" e gosta quando termina um trabalho – momento em que pode lê-lo. "Eu escrevo porque leio. Escrever sempre me pareceu uma conseqüência da leitura." Postura que explica sua maior ambição: de, simplesmente, ser lido.

"Pretendo continuar escrevendo, publicando, cavando espaço", diz Lindsay. Por fim, Araújo deseja "escrever um livro sempre melhor que o anterior". "Hoje estou certo de que um escritor evolui, amadurece, aprende a lidar com os problemas que se apresentam no dia-a-dia da escrita."

O diplomata

Há 13 anos longe de Curitiba, sua cidade natal, Mário Araújo nasceu em 1963. Trabalhou como arte-educador e redator de publicidade. Recebeu menções honrosas em concursos literários e teve contos publicados na mídia impressa e na internet. Diplomata de carreira, hoje vive em Montevidéu (Uruguai).

O músico

Carlos Machado nasceu em Curitiba em 1977. É músico, letrista, compositor e professor. Lançou dois discos com a banda Sad Theory. Pela 7Letras, publicou A Voz do Outro (sua estréia) e, em junho, deve lançar Balada de uma Retina Sul-Americana, relato de uma viagem por Uruguai, Argentina e Chile.

A atriz

Curitibana, Lindsey Rocha nasceu em 1977. Leciona Língua Portuguesa e Literatura, estuda artes cênicas e plásticas, a partir de autores como Tennessee Williams, Arthur Miller e William Shakespeare. Atuou nas montagens teatrais Passatempo Ganha Tempo (2004) e Bárbara e Ulisses (2005), ambas dirigidas por Fátima Ortiz.

A pesquisadora

Assionara Souza é de 1969. Na infância, transitou entre Curitiba, Caicó (onde nasceu) e Natal – essas duas no Rio Grande do Norte. Fixou residência na capital paranaense em 1990. Mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal do Paraná, pesquisa a obra de Osman Lins e leciona Literatura Brasileira.

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