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Diego Marchioro é um dos destaques de Minha Vontade... com sua interpretação canina | Pedro Serápio / Gazeta do Povo
Diego Marchioro é um dos destaques de Minha Vontade... com sua interpretação canina| Foto: Pedro Serápio / Gazeta do Povo

Existem dois tipos de peças teatrais: aquela que lembra o espectador da iminência da morte e aquela que o faz esquecer dela. Minha Vontade de Ser Bicho, do Grupo Delírio, pertence à primeira categoria. Não teria como ser diferente, dado o substrato do espetáculo – a vida e a obra da escritora Clarice Lispector (1920-1976). Não foi a primeira vez que a ucraniano-brasileira serviu de musa inspiradora ao diretor Edson Bueno, mas dessa vez ele certamente mergulhou de cabeça no universo de questionamento e descobertas da autora modernista.

O resultado é um fluxo de consciência tal como a "bruxa" das nossas letras usou com maestria. As atrizes Pagu Leal, Janja e Marcia Maggi vivem três mulheres que aparentam representar três fases da vida de Clarice. Ao longo da obra essa fronteira simplista se desfaz, e as três passam a ser mundos que coexistem pela palavra.

Cada uma enfrenta um conflito que dilacera: o câncer no ovário, a relação com o filho, a impossibilidade de ser correspondida no amor e a separação.

Diego Marchioro está ótimo no papel do cachorro Benjamin e Tiago Luz faz um bom Lúcio Cardoso, escritor homossexual por quem a escritora nutriu paixão arrasadora.

O leitor de Clarice a reconhecerá nas máquinas de escrever que batem em uníssono, e principalmente na dor, elementos que remetem a contos emblemáticos de sua obra, O escritor carioca José Castello (de Ribamar), que mora em Curitiba, chegou a escrever: "Ninguém lê Clarice Lispector sem ser devastado pelo que lê".

O clima grave de luta pela sobrevivência interior é envolto em beleza pelas ótimas cenografia (Luis Sposito) e sonoplastia (Chico Nogueira). O uso de narração e projeções gravadas (Murilo Hauser) faz uma composição harmônica com a atuação, e há momentos em que os dois planos interagem.

A iluminação de Beto Bruel, aliada à música comandada por Nogueira, respondem por um dos elementos mais marcantes de Minha Vontade de Ser Bicho.

A peça tem temporada até 20 de março. Quem perder, provavelmente terá de esperar por uma remontagem no ano que vem, já que o Delírio parte em tour com O Evangelho Segundo São Mateus e Kafka ainda neste mês. No Festival de Curitiba, eles refazem Metaformose Leminski: Reflexões de um Herói Que Não Quer Virar Pedra.

Serviço:

Minha Vontade de Ser Bicho

Teatro Novelas Curitibanas (Rua Carlos Cavalcanti, 1.222 - São Francisco), (41) 3321-3358. Direção de Edson Bueno. Com o Grupo Delírio. 5.ª a domingo, às 20 horas. Classificação indicativa: 14 anos. Entrada gratuita. Até 20 de março.

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