
Espectadores esporádicos de teatro muitas vezes torcem o nariz diante do tal "teatro do absurdo" gênero caracterizado pelo nonsense, que tem em Samuel Beckett, Arthur Adamov, Jean Genet e Eugène Ionesco seus maiores expoentes. Costumam associar a expressão a uma "viagem" pretensiosa e hermética, um amontoado de situações sem sentido, cujo único propósito seria satisfazer o ego do diretor.
Não é o caso de Absurdo, espetáculo que a companhia carioca Atores de Laura apresenta amanhã e segunda-feira no Teatro da Reitoria, pela Mostra 2013 do Festival de Curitiba. "Apesar de o espetáculo ser absurdo, é numa medida em que as pessoas conseguem entender tudo", garante o diretor Daniel Herz. "Não tem nada de hermético: é como se a gente propusesse um pacto com a plateia, que embarca nessa fantasia. E o resultado disso é que a montagem tem muito humor, as pessoas riem sem parar."
Toda a ação se passa em um único cenário: uma mesa de jantar compartilhada por dois casais que não se conhecem e interagem apenas entre si, mas que dividem o mesmo e único filho. Além do filho, o único ponto em comum entre os dois casais é a tentativa algo patética de manter uma relação afetiva saudável após 20 anos de convivência. "É o paradoxo da existência: quanto mais intimidade, maior o abismo entre as duas pessoas. A convivência vai gradualmente esgarçando a ponte entre um e outro, tornando a comunicação cada vez mais difícil", resume. "Temos a ilusão de que estamos nos comunicando o tempo inteiro, quando é a incomunicabilidade quem comanda as relações. A gente brinca muito com isso no espetáculo, há vários jogos em que essa questão fica bem evidente."
Pesquisa
A montagem estreou em outubro do ano passado no Rio de Janeiro, com boa recepção do público, e tem sido montada periodicamente desde então. Ela dá sequência à pesquisa iniciada com a peça Decote e aprofundada em Adultério, na qual a companhia produz um texto original depois de mergulhar na obra de um determinado autor no caso, Nelson Rodrigues e Pirandello, respectivamente. Em Absurdo, a inspiração foi o dramaturgo romeno Eugène Ionesco. "Nos embrenhamos na obra dele e buscamos a sua lógica filosófica para criar uma nova história", descreve. "[Samuel] Beckett é mais ácido, melancólico, os personagens dele têm a consciência de que nada pode ser feito. Já os do Ionesco ainda acreditam numa solução, ele brinca com essa esperança, e essa ingenuidade traz a graça."



