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A Casa João Turin, aberta em 1989, abriga mais de 700 peças do artista paranaense, entre elas, esculturas, pinturas, desenhos, projetos de decoração arquitetônica e ferramentas de trabalho | Priscila Forone/Gazeta do Povo
A Casa João Turin, aberta em 1989, abriga mais de 700 peças do artista paranaense, entre elas, esculturas, pinturas, desenhos, projetos de decoração arquitetônica e ferramentas de trabalho| Foto: Priscila Forone/Gazeta do Povo

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Saiba mais sobre o acervo de João Turin:

Herdeiro

O advogado Jiomar José Turin, herdeiro do acervo com mais de 600 obras do artista, avalia proposta de compra feita pelo empresário Samuel Lago, um do sócios do Grupo Positivo.

Comodato

A preferência da compra, de acordo com contrato de comodato realizado em 1989 com a Secretaria de Estado da Cultura – Seec, é do Estado. "O valor proposto pelo proprietário está muito acima das nossas possibilidades", diz Rosimeire Odahara, coordenadora de projetos especiais da Seec.

Espaço

A Casa João Turin foi criada pela Lei Estadual nº 1.538, em 1953, mas só foi instalada em janeiro de 1989 no imóvel de estilo neoclássico à Rua Mateus Leme, nº 38. A intenção era abrigar o acervo no ateliê de João Turin, que ficava na Avenida Sete de Setembro, 2.779. Mas, com a espera de mais de 30 anos, o terreno foi vendido.

Desapropriação

A Seec comunicou em nota oficial que "o Estado, a qualquer tempo, pode desapropriar peças/parte do acervo que forem de propriedade de particular e até mesmo os direitos autorais patrimoniais da obra em razão do interesse social envolvido".

  • O artista João Turin trabalha na premiada escultura

O artista João Turin (1878-1949) gostava de dizer que nasceu "aos pés do Marumbi", em Morretes. Isso explica a onipresença da natureza em sua vasta produção artística, principalmente, nas esculturas de animais e nas pinturas de paisagens que ele chamava de "emoções".

Exímio retratista, escultor e pioneiro do design de moda, criou o estilo paranaense para decoração arquitetônica com peças como, por exemplo, capitéis decorados com o pinhão e a pinha das araucárias. "Nós temos o pinheiro, essa coluna maravilhosa, só é necessário orná-la com seus frutos e folhas para igualar-se em grandeza e beleza às colunas do Egito, Roma e Grécia antiga. Por que o desprezamos?", escreveu.

É irônico que o legado de um artista tão aficionado pela identidade paranaense ainda não tenha encontrado pouso definitivo tantos anos após sua morte. Abrigado na Casa João Turin desde 1989, o acervo de mais de 600 peças, em­­prestado ao Estado em contrato de comodato, pode passar a mãos privadas.

O herdeiro universal das obras, Jiomar José Turin, sobrinho do artista, avalia proposta de compra feita pelo empresário Samuel Lago, um dos sócios do Grupo Posi­­tivo. "Estou com 84 anos, meu tio morreu em 1949, e até hoje sua obra não está difundida. Tenho que pensar no futuro dela", justifica. Se for concretizada, a venda significa a retirada da maior parte das peças exibidas gratuitamente ao público na Casa João Turin.

"O proprietário concedeu o direito de preferência da compra ao governo do estado, que não se manifestou em razão das condições da oferta e, também, porque não há previsão orçamentária para as despesas no corrente exercício", esclarece a Secretaria de Estado da Cultura – Seec, em nota à Gazeta do Povo.

Posição oficial

A Seec acompanha a venda, principalmente, com vistas a ga­­rantir que as peças de propriedade do Estado sejam mantidas na Casa João Turin. Estão ali esculturas, desenhos, pinturas, projetos decorativos para residências e espaços públicos, manuscritos, fotografias e objetos do artista pertencentes não só a Jiomar, mas a outros colecionadores privados e ao próprio poder público.

"Jiomar é o herdeiro universal e, por isso, teve direito a tudo o que estava dentro do ateliê de João Turin. Mas há mais peças, inclusive, esculturas em bronze, que o governo reproduziu a partir dos gessos", diz a coordenadora de projetos especiais da Seec, Rosi­­meire Odahara.

Ela explica que o Estado pode, a qualquer tempo, dar início a um processo de desapropriação do acervo em comodato em razão do interesse social envolvido. "Não o faz, neste momento, por respeito aos diretos do proprietário", diz Rosimeire. A nota informa ainda que o conjunto da obra de João Turin está em processo de tombamento pelo estado do Paraná. "O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico (Iphan) tem interesse que obras do artista sejam de patrimônio nacional. Isso evitaria cópias ilícitas, roubo e extravio e possibilitaria o reconhecimento e a catalogação de todas as obras", diz.

Esse é o segundo revés sofrido pe­­lo acervo de João Turin. Após a sua morte, as peças ficaram guardadas em um barracão precário, construído por Jiomar, aguardando a instalação da Casa João Turin – o que só aconteceria em 1989, mais de 30 anos depois da aprovação de uma lei que previa a criação do espaço.

"Quando René Dotti foi secretário da Cultura, viabilizou que a casa fosse finalmente instalada, o que era um velho sonho meu", diz Jiomar. Ele reclama da falta de investimentos para difundir a obra de João Turin. "É muito difícil o governo investir em cultura. Ele faz estrada, tampa buraco no asfalto, mas preservar a obra de um artista não dá voto."

"Existe preservação e cuidado, mas poderíamos fazer mais do que isso se o acervo fosse patrimônio estadual. Com um comodato, é mais difícil, já que as peças podem ser retiradas a qualquer momento", explica Rosimeire.

A Casa João Turin, com duas reservas técnicas que conservam as peças em bom estado, renova constantemente as obras do acervo em exibição. "Os alunos das escolas não só visitam a mostra, mas participam de atividades didáticas", diz Elisabete Turin, sobrinha-neta do artista, que dirige o espaço desde a sua criação.

Uma posição mais vigorosa do governo estadual seria bem-vinda para assegurar a manutenção das obras de Turin que, graças a uma uma bolsa de estudos concedida pelo Estado, teve chances de consolidar a sua formação na Europa. Em 1906, ele iniciou um curso de cinco anos na Real Academia de Artes de Bruxelas, na Bélgica e, mais tarde, prosseguiu seus estudos em Paris. Ali, sua obra "Exílio" foi premiada com menção honrosa no Salão dos Artistas Franceses.

De volta ao Brasil, em 1923, Turin criou o estilo paranaense, junto com os amigos Lange de Morretes e João Ghelfi, e se tornou conhecido como exímio escultor animalista – "Luar do Sertão" e "Esmagando a Cobra" foram felinos premiados no Salão de Belas Artes do Rio de Janeiro, em 1944 e 1947, respectivamente.

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