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A água deixa cada vez mais de ser um direito universal para se tornar um bem acessível a quem pode pagar por ela, e sua privatização segue em franca expansão. Em 1980, havia 12 milhões de domicílios recebendo água privatizada na Inglaterra, na França e no Chile. Hoje são 600 milhões no mundo todo. Os números só crescem. No Brasil, mais de 30 municípios já passaram os serviços para a iniciativa privada. Nesta quarta-feira, Dia Internacional da Água, ela será um dos temas na 8.ª Conferência das Partes da Convenção sobre Biodiversidade (COP8), evento da ONU que segue até o dia 31 em Curitiba, mas seu domínio privado deve passar ao largo das discussões.

"A privatização da água é um processo que ganha escala em todo o mundo", alerta o sociólogo Silvio Caccia Bava, diretor do Instituto Pólis e membro do Conselho Nacional de Segurança Alimentar. "O Brasil está sendo pressionado pelo FMI [Fundo Monetário Internacional] e pelo Banco Mundial para privatizar os serviços de água e esgoto", diz Bava. O processo está em curso faz tempo. O caso mais exemplar, segundo o sociólogo, talvez esteja no Amazonas. Em junho de 2000, a transnacional francesa Suez-Lyonnaise comprou por R$ 180 milhões a estatal responsável por 96% das ações da Companhia de Saneamento do Amazonas.

Especialistas apontaram, à época, que o investimento seria recuperado em apenas 14 meses, às custas das tarifas pagas pela população. Isso se deve por uma razão muito simples, aponta Bava. Segundo estudos da Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental, que reúne 1,8 mil municípios, a privatização encarece os serviços entre 37% e 48% em relação aos preços dos órgãos públicos. O Amazonas representa só uma fração dos negócios da Suez-Lyonnaise, uma das quatro multinacionais que têm avançado sobre os serviços públicos de saneamento básico no mundo todo. As outras são as também francesas Générale des Eaux e a Saur, além da alemã RWE e sua filial inglesa Thames Water.

"O acesso à água é um direito humano fundamental", diz Bava. Para ele, o abastecimento de água e o saneamento devem ser serviços públicos prestados pelo Estado. Estas são proposições da Plataforma Global da Água, documento elaborado por uma articulação de movimentos sociais do mundo inteiro, e são uma reação à onda de privatizações dos serviços públicos que fazem dela uma mercadoria em vez de bem público. A Frente Nacional de Saneamento Ambiental apresentou ao Congresso Nacional um documento com 720 mil assinaturas contra a privatização da água no Brasil, seguindo exemplo da África do Sul e do Uruguai, que já incluíram o tema nas suas Constituições.

O que se vê, no entanto, é uma luta desigual do capital contra o bom senso. Hoje, 1,2 bilhão de pessoas, sobretudo na América Latina, África e Ásia, sofrem em maior ou menor grau com a escassez de água e 2,5 bilhões não têm qualquer tipo de saneamento. O resultado disso é que 8 milhões de pessoas morrem por ano por causa de doenças relacionadas à água, metade delas crianças. Segundo o Fundo de População das Nações Unidas, por volta do ano 2030 uma em cada três pessoas na Terra não terá nenhuma água – ou, quando muito, pouca água.

A importância da água hoje e sua previsão futura produzem análises que chegam à teoria da conspiração. O Centro de Militares para a Democracia (Cemida), da Argentina, acredita que o real motivo da presença das tropas dos Estados Unidos na Tríplice Fronteira – a pretexto de combater células terroristas em Foz do Iguaçu, Ciudad del Este e Puerto Iguazu – seria o total controle do Sistema Aqüífero Guarani, um imenso reservatório subterrâneo de água limpa que ocupa uma área que vai do Pantanal brasileiro e áreas do Paraguai ao Uruguai e os pampas argentinos.

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