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Há vários motivos para que a Curitiba cultural lembre uma cidade da Idade Média: temos por aqui nossas corporações de ofício, os feudos que cada grupinho domina e uns tipos meio semelhantes aos dos inquisidores. Outro elemento desse quadro é a existência – metafórica, obviamente – de muralhas que parecem impedir a progressão de quem por aqui está para outras paragens. Sair do Paraná para centros maiores ainda é pouco mais do que uma ilusão para os que fazem arte na cidade.

No caso do teatro, em que o translado é mais caro e mais raro do que em outras atividades, a presença de duas peças de companhias saídas de Curitiba na mostra do riocenacontemporanea (assim mesmo, em minúsculas, formado uma só palavra), que começa sexta-feira, mostra que apesar de tudo é possível tentar ir a algum outro lugar. Avenida Dropsie, com direção de Felipe Hirsch, e Morgue Story, dirigida por Paulo Biscaia, fazem durante o festival suas estréias no Rio de Janeiro. É uma boa notícia, mas os encenadores ainda não acreditam que isso seja uma mudança significativa para os produtores curitibanos.

"Levar uma peça de teatro para outra cidade custa caro, exige uma logística grande", explica Biscaia, que vem conseguindo emplacar a sua peça em vários festivais importantes do país. Além da apresentação no Festival de Teatro de Curitiba, a montagem já esteve em cartaz em Londrina, está indo para o Rio de Janeiro e termina o ano em Recife. "O problema é que a gente muitas vezes nem conhece as pessoas e os canais que levariam as coisas a ficar mais fáceis", conta.

Hirsch, o outro diretor oriundo de Curitiba no festival carioca, é um exemplo raro de alguém que começou a fazer teatro no Paraná e emplacou de vez no eixo Rio-São Paulo. Para ele, isso é antes de tudo uma questão de qualidade do trabalho. "Nós também nos arriscamos muito, mas se as peças não fossem bem montadas, não adiantaria", resume. Existem outros grupos por aqui com qualidade para fazer o mesmo trajeto? Sim, diz Hirsch, citando Fernando Kinas e Marcelo Marchioro, os dois primeiros que vêm à sua cabeça. Mas ele não acha que exista uma tendência para que as peças curitibanas disparem de valor no mercado. "O que se faz de teatro em Curitiba, de modo geral, não tem nada de especial", afirma

Édson Bueno, um dos diretores mais respeitados da cidade, garante que ir a São Paulo e Rio para.ficar exige qualidade – mas também é uma questão de perseverança. "Tem gente que põe isso como meta e vai atrás. Eu, por exemplo, teria interesse em ir para lá se acontecesse naturalmente, mas nunca me esforcei para isso", diz. Bueno teve algumas experiências em São Paulo. Uma delas com a mítica New York por Will Eisner, peça que recebeu todos os elogios possíveis e teve enorme sucesso de público em 1990. Por coincidência ou destino, a curta temporada paulistana foi marcada por greves de ônibus e metrô e uma enchente que tornava quase impraticável chegar ao teatro. Bueno não se ressente disso. Até sorri quando fala do assunto. "Apesar de tudo, o público aumentava a cada dia", lembra.

Émerson Rechenberg, autor e diretor, diz que poucas vezes teve chance de sair viajando com seu trabalho, nos 12 anos que já tem de carreira. Uma única vez, com o monólogo Só, ele pôde realmente fazer uma turnê por várias cidades brasileiras. Chegou a sair do Brasil, para apresentações na Argentina. "Mas isso só foi possível porque era um espetáculo solo, em que eu ia sozinho com a minha mala", conta. O cenário era formado por uma poltrona, um sofá e um abajur, que ele arranjava em cada lugar a que ia. "Sozinho também é mais fácil por não depender do calendário de outras pessoas. Os atores aqui acabam tendo de se comprometer com vários projetos de uma vez e não têm como seguir as datas que você consegue em outros lugares", diz.

Entre-atos

* Em 2005, quatro companhias paranaenses compareceram ao Festival Internacional de Teatro de São José do Rio Preto, um dos mais importantes do país. Daqui a Duzentos Anos, do Ateliê de Criação Teatral, Suíte 1, da Companhia Brasileira de Teatro, e Carta Aberta, de Fernando Kinas, participaram da mostra nacional. O grupo londrinense Armazém, atualmente radicado no Rio de Janeiro, ganhou uma retrospectiva de seu trabalho.

* Para dois atores do teatro paranaense, o momento de ir ao Rio de Janeiro também chegou. Anderson Lau, do grupo Antropofocus, partcicipa da novela Bang Bang, que estreou na noite de ontem. Ranieri Gonsales também está em uma atração global. Ele participará da minissérie da emissora sobre Juscelino Kubitschek.

Número

200 mil pessoasjá assistiram à A Vida É Cheia de Som e Fúria, peça que lançou Felipe Hirsch ao estrelato e possibilitou a da visibilidade nacional do trabalho Sutil Companhia.

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