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Regina Przybycien,tradutora do polonês da poeta Wislawa Szymborska | Marcelo Elias/Agência de Notícias Gazeta do Povo
Regina Przybycien,tradutora do polonês da poeta Wislawa Szymborska| Foto: Marcelo Elias/Agência de Notícias Gazeta do Povo

"Alguns –/ ou seja nem todos./ Nem mesmo a maioria de todos, mas a minoria./ Sem contar a escola onde é obrigatório/ e os próprios poetas/ seriam talvez uns dois em mil." É assim que a polonesa Wislawa Szymborska ri da própria impopularidade como poeta nos primeiros versos de "Alguns Gostam de Poesia", publicado em 1993 – três anos antes de conquistar o Prêmio Nobel de literatura. Embora a poesia não seja realmente um dos gêneros literários mais consumidos, não se pode negar o valor desses "dois apreciadores". Principalmente porque um deles é a curitibana Regina Przybycien, professora convidada da Universidade de Cracóvia responsável por traduzir esses e outros versos da autora para o português, na coletânea de poemas da autora recentemente publicada pela Companhia das Letras (Wislawa Szymborska [poemas]).

Embora tenha sido criada com duas línguas maternas, Regina confessa que se esforçou mesmo foi para falar português: "Só falei polonês até os seis anos, depois resolvi que queria ser brasileira a qualquer custo e comecei a falar só na língua nacional. Estudei literatura brasileira e me formei em Letras Português/Inglês na UERJ por isso", conta.

Não fosse a queda do Muro de Berlim em 1989, o Brasil teria em Regina apenas uma boa doutora em literatura inglesa – com sua tese sobre a poeta americana Elizabeth Bishop, outra de suas grandes paixões literárias. Mas o fim do comunismo mudou tudo. "Quando voltei para Curitiba, em 93, fui designada para o departamento de Polonês do Celin [Centro de Línguas e Interculturalidade]. Estava muito próxima do consulado e em constante contato com os poloneses da Polônia, de quem começamos a ter notícias a partir daquela época", relembra. Como alguns brasileiros que se sentem na obrigação de passar por uma aula ou outra de samba para não fazer feio no exterior, Regina achou descabido não saber a língua de sua família, e embarcou para Cracóvia para um curso intensivo em 1996 – mesma época em que Szymborska seria anunciada como o quarto prêmio Nobel de literatura da Polônia e sexto geral.

Visceralidade

Os versos simples, sutis e nada barrocos da autora, até então desconhecia para Regina, foram os responsáveis por despertar o gosto pelo polonês escrito – uma língua que ela admite ser um pouco assustadora, com suas fileiras de consoantes e símbolos gráficos incomuns. O vocabulário corriqueiro de Szymborska trouxe de volta a sua mente a infância em Curitiba. "Minha mãe faleceu duas semanas antes de viajar para a Polônia. E pela primeira vez estava rodeada de pessoas falando o idioma que ela falava. Aquilo me despertou os mais complexos sentimentos, e descobri em Szymborska uma visceralidade que a poesia inglesa nunca me trouxera", afirma.

A linguagem acessível também permitiu que Regina se aventurasse pelas traduções: "Sempre que tinha um tempo livre, tentava traduzir algum poema mais fácil da autora. Trocava as palavras, pensava nos significados, até que me dava por satisfeita com o resultado. Era como um passatempo pra mim". Quando juntou uma dezena deles, topou publicar na revista literária Oroboro, do escritor Ricardo Corona: "Entrei em contato com o secretário da Szymborska pedindo autorização e ela só me autorizou a publicar cinco poemas". Esse, aliás, foi o mais estrito contato que manteve com a escritora, conhecida por sua personalidade reservada e avessa a badalações.

Depois, para reunir os poemas da coletânea, Regina Przybycien não mudou os critérios: traduziu os que acreditava estar em seu alcance e os organizou em ordem cronológica. O resultado são 44 poemas acompanhados de suas versões originais ao final do livro, exigência na qual insistiu pensando na grande população de falantes do idioma no sul do Brasil. Além de um prefácio escrito por ela, Regina não adicionou nenhum elemento explicativo, como notas de rodapé ou análise de versos. Preferiu fazer adaptações que trouxessem os termos usados por Szymborska para o universo brasileiro. "Procurei preservar o tom, o tipo de linguagem e a extensão de cada verso, mas notas de rodapé são muito chatas. O leitor de poesia precisa, antes de tudo, se deleitar", acredita, e defende a escolha na esperança de que seu primeiro trabalho como tradutora aumente o grupo de fãs de poesia para mais do que dois em mil.

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