
Londrina - Um ditado mineiro dizia: "Laranja madura, na beira da estrada, tá bichada, ou tem marimbondo no pé".
A frase inspirou o sambista Ataulfo Alves, que fez: "Laranja madura/na beira da estrada/tá bichada, Zé/ou tem marimbondo no pé".
Quando Justino Alves Pereira ouviu o samba "Laranja Madura", conversou com Ataulfo: "Quem é esse Zé?". A resposta foi clara: "É você".
O médico Justino Alves Pereira chamado pela família como Zé Justino lembra com prazer do convívio com Ataulfo Alves. Sua amizade remonta a tempos escravocratas. O avô de Ataulfo pertenceu ao avô de Justino. Como era de praxe, os escravos herdavam o nome do patrão.
Ataulpho Alves de Sousa (originalmente com ph) nasceu há cem anos, em 2 de maio de 1909, na Fazenda Cachoeira, em Miraí (MG), propriedade de Henrique Alves Pereira, pai de Justino. Ataulfo nunca esqueceu de sua origem, de Miraí ou da ligação com a família Alves Pereira. A diferença de idade entre Justino e Ataulfo era de 20 anos, mais ou menos. Mas, na maturidade, ambos estreitaram os laços de amizade.
Justino estudou em Juiz de Fora e, depois, foi aprender Medicina no Rio de Janeiro. Ataulfo também foi para a então Capital Federal, levado por um médico, onde trabalhou lavando frascos em uma farmácia. No Rio, Ataulfo se enturmou com os sambistas e caiu nas graças de Carmen Miranda. Logo, veio a fama.
Quando se formou, em 1948, Justino resolveu exercer a medicina em Ibiporã hoje ele também tem residência em Londrina. Um tempo depois, Henrique Alves Pereira vendeu a Fazenda Cachoeira e veio atrás do filho, estabelecendo-se também no norte do Paraná.
Justino tornou-se secretário estadual de Saúde durante o governo Ney Braga e, posteriormente, foi deputado estadual. Em Curitiba, recebeu a visita do amigo Ataulfo Alves em 1965, quando o sambista esteve na Assembleia Legislativa do Paraná.
Justino é enfático ao lembrar o que mais lhe impressionava em Ataulfo: "A inspiração, a entrega total ao culto da música popular brasileira em letra e música."
Sempre impecável, Ataulfo Alves chegou a ser eleito um dos "dez homens mais elegantes do Brasil" pelo colunista Ibrahim Sued. Era uma pessoa íntegra, que não se esquecia de Miraí, onde ia anualmente lançar seus sucessos carnavalescos. Na cidadezinha, ouvia opinião dos amigos sobre os sambas.
Em 1969, Omar Mazzei Guimarães, presidente da Sociedade Rural do Paraná, fechou com Ataulfo e suas pastoras um show na Exposição Agropecuária de Londrina. Para marcar o compromisso, pagou adiantado.
Mas eis que Ataulfo adoeceu. Justino foi visitá-lo no hospital. "Ele já estava internado e veio a falecer. Quando fui visitá-lo, nós nem pensávamos que ele ia morrer. Aparentemente, não tinha doença, mas usava e abusava do alcoolzinho", conta.
Antes de morrer, no leito do hospital, Ataulfo sentiu que não poderia cumprir o compromisso em Londrina. Devolveu, então, por carta, a quantia adiantada por Omar Mazzei.



