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Rio de asfalto: capa da HQ Cidade das Águas | Reprodução
Rio de asfalto: capa da HQ Cidade das Águas| Foto: Reprodução

Os autores

Dupla mantém parceria desde os anos anos 1990

O curitibano Guilherme Caldas é ilustrador, quadrinista e artista plástico. Produziu, em parceria com Olavo Rocha, a série Candyland, que virou livro lançado pela Barba Negra/Caderno Listrado em 2010. Também publicou o livro 1968: Ditadura Abaixo, com a jornalista Teresa Urban. Caldas também é um dos editores do blog Baixa Gastronomia, da Gazeta do Povo, desde 2012. O paulistano Olavo Rocha é roteirista, redator e músico. Trabalha com Guilherme Caldas desde meados dos anos 1990. Também é letrista e vocalista do Lestics, banda independente com seis álbuns lançados.

Cidade das Águas

Guilherme Caldas e Olavo Rocha. Polen Editora. 68 páginas. R$ 25. Quadrinhos.

  • Ao discutir a opção pelos rios subterrâneos, HQ mistura ficção, registros históricos e depoimentos de personagens reais

A história em quadrinhos Cidade das Águas, do desenhista Guilherme Caldas e do roteirista Olavo Rocha, é um caso de linguagens artísticas que se cruzam.

O roteiro da HQ é inspirado na peça de teatro Origem/Destino, que a Cia. Auto Retrato encenou nas ruas de São Paulo em 2012.

Na montagem, os atores saíam da Praça da Sé, no coração da paulicéia, percorriam o centro velho e depois tomavam, junto com o público, um ônibus até o distante bairro de Santo Amaro, na zona sul paulistana, onde se concentram alguns mananciais.

Misturando ficção, registros históricos e depoimentos de personagens reais, o autor da peça, o dramaturgo Marcos Gomes, construiu uma narrativa alegórica em que os personagens se movimentam por sobre o traçado de rios que foram soterrados na duvidosa opção urbanística que São Paulo adotou no início do século 20 – e que foi seguida por muitas outras cidades, inclusive Curitiba.

Gomes quis transformar seu texto dramático em livro e optou por não publicá-lo literalmente, e sim transformá-lo em uma em história em quadrinhos.

Convocou para tanto a dupla formada por Rocha e Caldas, que já tinha produzido em parceria a elogiada série Candyland, nos anos 1990. Rocha adaptou o texto e Caldas fez a narrativa visual.

"Ele conhecia a peça de perto e eu não tinha nenhum conhecimento. Acho que isto ficou interessante, pois cheguei no projeto com um olhar sem vícios", avalia Caldas.

A narrativa criada pela dupla mostra uma São Paulo que vai desde sua formação histórica idealizada até a sua transformação em megalópole internacional e multifacetada por ondas imigratórias sobrepostas.

Há personagens translúcidos, personagem oníricos inventados por Gomes e histórias de pessoas reais captadas nas vivências e pesquisas que precederam a peça.

"A pira"

Graficamente, a geografia da cidade está respeitada e descrita com grande apuro visual. "Eu tenho esta pira com a paisagem urbana de São Paulo. Algo que Curitiba não tem. Ainda que tenhamos alguns pontos de densidade urbana, aqui ainda se pode ver o céu", conta o desenhista, que morou em São Paulo por nove anos.

"Nunca superei a sensação de ser um caipira na cidade grande, de ser estrangeiro. São Paulo sempre foi uma cidade que me assustou muito", confessa.

Caldas conta que o livro foi "bastante trabalhoso com relação à pesquisa e à referência visual. Ele explica que o processo de composição da HQ, "em que o visual e a narrativa precisam ter harmonia", durou cerca de seis meses.

Livro é lançado em meio à crise hídrica

O lançamento da HQ Cidade das Águas coincidiu com o anúncio do governador Geraldo Alckmin (PSDB) de que será preciso fazer revezamento no uso da água na grande São Paulo. "Não podíamos ser mais oportunistas para o lançamento do livro", brinca o desenhista Guilherme Caldas.

A coincidência, porém, serve para ressaltar o grande pano de fundo da história: o paradoxo trágico de uma cidade criada no encontro de três rios e cortada por alguns dos maiores do Brasil e que hoje está convulsionada pela falta d'água.

"O pior é que é só o primeiro capítulo, e isso deve se estender por outros centros. Estava com esperança de morrer antes das guerras pela água, mas não sei se terei essa sorte. Não que tenha pressa para morrer", avalia Caldas. No final do volume, Caldas desenha uma espécie de mapa hidrográfico de São Paulo sobreposto pelo mapa das ruas da metrópole. O leito carroçável substituindo o dos rios. Há ainda um texto de apresentação, do urbanista Nabil Bonduki, que conta como a cidade de água abundante foi se "impermeabilizando".

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