• Carregando...
Autor defende que palco seja ocupado por quem sabe atuar naturalmente, pois a interpretação não pode ser ensinada | Antônio More / Gazeta do Povo
Autor defende que palco seja ocupado por quem sabe atuar naturalmente, pois a interpretação não pode ser ensinada| Foto: Antônio More / Gazeta do Povo

Ensaios

Teatro

David Mamet. Tradução de Ana Carolina Mesquita. Civilização Brasileira, 179 págs., R$ 25.

Opinião

Leitor precisa conhecer universo descrito pelo autor em ensaios

O maior problema do livro Teatro, de David Mamet, são as referências aos palcos norte-americanos e russos. Todo o repertório de críticas feitas pelo dramaturgo pode passar em branco se os leitores não estiverem familiarizados com os temas nos quais o autor discute.

Para os brasileiros, os insights do escritor sobre a Broadway no começo da obra podem soar incompreensíveis. Até porque nossa produção teatral, em praticamente todo o país, não lembram em nada as montagens nos palcos nova-iorquinos. Ainda assim, alguns pontos discutidos pelo norte-americano resvalam em nossa realidade.

A mais forte delas é a crítica sobre o financiamento estatal, que pode ser fatal para garantir um espetáculo de qualidade. Sem precisar ter sucesso com o público, a peça pode se delimitar às reflexões conceituais sem entregar ao espectador o momento de distração que lhe foi prometido ao entrar no teatro. GGG

Uma peça teatral financiada com dinheiro público não precisa do aval do espectador para continuar em cartaz. Trata-se de um espetáculo imposto por artistas com tendências autoritárias herdadas de teatrólogos soviéticos bolcheviques que não pensavam na plateia. O ataque, que ecoa no cenário das produções nacionais, foi escrito pelo roteirista e escritor David Mamet.

Em seu novo livro, Teatro, o autor por trás de peças como American Buffalo (1975) e O Sucesso a Qualquer Preço (1984) mira suas críticas contra alguns cânones estabelecidos pelas escolas de teatro continente afora. Publicada recentemente pela editora Civilização Brasileira, a obra apresenta 29 ensaios que sintetizam sua maneira de pensar a arte da encenação.

Uma das afirmações mais polêmicas da obra de Mamet está presente no ensaio "A Falácia do Diretor". No texto, ele defende que atores e dramaturgos são os verdadeiros responsáveis por dar corpo a um espetáculo. O diretor é apenas um condutor, com peso insignificante no resultado visto no palco.

"Todos os profissionais teatrais tiveram a experiência de passar pelo processo de ensaio moderado por alguém que não fazia a menor ideia do que estava fazendo. E a peça mesmo assim engrenou", escreve. O autor havia feito uma crítica semelhante no livro Sobre Direção de Cinema, ao defender que o verdadeiro responsável por determinar como será um filme é o roteirista. O diretor cinematográfico só precisa seguir as instruções do roteiro.

Crítica

Mamet também usa seu livro para discorrer contra as escolas de teatro. "Um ator sabe atuar, ou não sabe", defende. A interpretação seria algo impossível de ser ensinada a alguém sem talento, portanto. A ideia o leva a refletir sobre o método do pedagogo e escritor russo Constantin Stanislavski (1863-1938).

O cânone, usado para ensinar interpretação, defendia que os atores precisavam se conectar com o personagem, interiorizando experiências e emoções em cena. Mamet não parece acreditar nisso. "Não existe personagem algum. Ele é só palavras de uma fala delineada na página, isso é tudo. O intercâmbio teatral existe para comunicar o texto da peça para os espectadores", critica.

Para se tornar um ator competente, o profissional precisa subir ao palco e trabalhar diante de uma plateia pagante. Se ele não for bem, verá a fúria nos olhos do público. "Como na maioria das coisas, o trauma do fracasso puro e simples é o estímulo necessário para alcançar o conhecimento", garante Mamet, que leva ao pé da letra o que prega em seus espetáculos.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]