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Joan Didion: discreta e tímida | Divulgação
Joan Didion: discreta e tímida| Foto: Divulgação
  • Talese: fãs no mundo todo.

A Turma Que Não Escrevia Direito tem pinta de ser um livro para jornalistas, mas a aparência engana. A história dos bastidores da notícia nos Estados Unidos dos anos 1960 e 70 parece um suspense envolvendo a imprensa norte-americana e os profissionais que viraram a reportagem do avesso.

O autor Marc Weingarten (ele também, jornalista) constrói uma narrativa direta e limpa a partir de uma bibliografia de 82 títulos e 76 entrevistas – tudo listado na parte final do livro –, além de consultar arquivos e do­­cumentários.

Entre os personagens da história, há nomes conhecidos que saíram da imprensa para produzir livros e, inclusive, tiveram obras traduzidas no Brasil. Gay Talese é o mais popular, em parte por causa da sua passagem recente pelo Brasil, quando veio à Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) e não teve site, jornal, revista e canal de tevê que não tenha falado dele.

Talese aparece logo nas primeiras páginas. Quem leu o texto curto "Origens de um Escritor de Não-Ficção" e as memórias Vida de Escritor, ambos de Talese, não vai encontrar informações novas sobre o ex-repórter do New York Times que se tornou obcecado por histórias de perdedores. Mas o objetivo de Weingarten é menos retratar personagens do que dar conta de uma época-chave para o jornalismo norte-americano, com mudanças que ultrapassariam os limites do país.

A Turma Que Não Escrevia Direito funciona como um panorama e descreve o que foi o clima de então, com os escritores buscando uma resposta do jornalismo para a efervescência histórica e cultural que animava aqueles anos. Weingarten fala um pouco de tudo e se aprofunda em poucos episódios. Um desses diz respeito ao uso de drogas e aos motoqueiros dos Hell’s Angels, ligados aos jornalistas Tom Wolfe e Hunter S. Thompson (1937-2005).

Quando surge o fanfarrão Wolfe, o livro começa a esquentar. Weingarten passa a tratar das disputas que ocorreram na imprensa nova-iorquina, com repórteres de um veículo (a revista New York) fazendo tudo para ridicularizar os do outro (a New Yorker). O autor do livro Radical Chique e o Novo Jornalismo comprou brigas com quem estivesse disposto a encará-lo e muitos que defendiam a tradição da chamada "pirâmide invertida", técnica para hierarquizar as informações dentro de um texto, abominavam as viagens de Wolfe. Ele, por sua vez, não hesitava em abrir um texto com uma onomatopeia impronunciável simulando o ronco de um motor de carro.

A certa altura, Wolfe – que mais tarde teria uma carreira de sucesso escrevendo romances, Os Eleitos e Fogueira das Vaidades são dois deles – cruza o caminho de Hunter Thompson. Ou melhor, Thompson cruza o caminho daquele. É quando Weingarten aborda o uso de LSD e o jornalismo gonzo, que pressupõe a escrita de um texto sob a influência de substâncias.

Pena, mas A Turma Que Não Escrevia Direito dá pouca atenção para Joan Didion (O Ano do Pensamento Mágico) e Michael Herr (Despachos do Front). Didion era mais discreta e tímida, e manteve uma distância prudente dos fatos. Herr foi o primeiro a deslindar a Guerra do Vietnã para os norte-americanos.

Os pontos altos do livro ficam por conta das disputas que eram capazes de alçar uma revista para o sucesso ou enterrá-la de vez. Um exemplo é a briga interna dos homens que comandavam a revista Esquire. Embora a New Yorker seja mais lembrada hoje, na verdade, foi a Esquire que bancou a publicação de textos ousados, alguns deles antológicos. Vide os perfis feitos por Talese, incluindo o do boxeador Floyd Patterson, e os trabalhos de Wolfe e Norman Mailer (O Super-Homem Vai ao Supermercado, sobre as convenções de partido que an­­tecedaram a eleição disputada por John F. Kennedy e Richard Ni­­xon, saiu na Esquire). GGG

Serviço:

A Turma Que Não Escrevia Direito, de Marc Weingarten. Tradução de Bruno Casotti. Record, 392 págs., R$ 54,90.

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