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Para a ex-advogada, Edu Krieger escreveu “Blonde Lilly”: “apenas me interessa o que eu não vivi” | Divulgação
Para a ex-advogada, Edu Krieger escreveu “Blonde Lilly”: “apenas me interessa o que eu não vivi”| Foto: Divulgação

Não a música, mas o Direito ocupava a rotina de Beatrice Mason antes de sua entrada tardia no mercado fonográfico, com o lançamento recente do disco Mosaico. Aos 38 anos, a estreante combate a sensação de falta de tempo "correndo atrás". Para isso, conta com a ajuda de amigos badalados da tão comentada nova MPB.

Até seis anos atrás, os dias dessa carioca descendente de alemães e italianos passavam às voltas com processos jurídicos envolvendo o mercado de capitais, fusões e aquisições. Um estilo de vida cansativo, que ela interrompeu com uma licença e uma gravidez. O tempo livre recém-adquirido abriu a possibilidade de resgatar a paixão antiga pelas aulas de canto, iniciadas aos seis anos, em um coral regido pela mãe Heidi. A responsável, ao lado do pai, pelo ouvido da cantora ter se habituado desde pequena à música erudita, entremeada pelas vozes de Chico, Nara, Cae­ta­no e Elis, que escapavam do rádio da empregada Alzira.

Ainda na infância, Beatrice (a última sílaba se pronuncia como o nome do revolucionário "Che" Guevara) havia soltado a voz no coro de crianças do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, on­­de conheceu o compositor Edu­ar­­do Krieger e participou de montagens das óperas Carmen, La Bohème e Werther. A música – lírica, erudita – sempre esteve à espreita, quando não pelo canto, tocando em uma orquestra de flautas ou em um trio barroco do instrumento de sopro.

Novo rumo

Mas, à altura em que a advogada se encontrava ao paralisar sua carreira, as atividades de um coral já não eram suficientes para lhe satisfazer. Trocou, então, definitivamente, a legalidade das movimentações financeiras por notas e arranjos. E o canto lírico, pelo popular.

Armou seu primeiro show com a ajuda da amiga Roberta Sá, que, naquela época, também estava começando. Roberta lhe indicou o músico Cyro Telles pa­­ra cumprir as funções de arranjador e diretor musical de Coração Tranquilo, espetáculo que se compunha de canções de nomes consagrados da MPB, tentando driblar as escolhas óbvias do repertório dos compositores óbvios. "Sempre gostei da pesquisa e dos hits não tão hits", diz Beatrice.

Em uma dezena de apresentações, iniciadas em agosto de 2005, no Mistura Fina, ela cantou "Raça Humana", de Gilberto Gil, "Nego Maluco" e "A História de Lilly Braun", de Chico e Edu, "A Medida da Paixão", de Lenine, e ainda uns sambas de Cartola. Depois, partiu para um segundo show, Alumbramento, que duraria três ou quatro noites apenas. Suas conversas com Rodrigo Campello (produtor dos dois discos de Roberta Sá, apresentado a Beatrice por ela) avançavam para a feitura do seu primeiro CD.

Outro amigo de um amigo, o músico Marcelo Caldi, que conheceu por intermédio de Edu Krieger e se tornou integrante de sua banda, incutiu na cantora a ideia de se concentrar em um repertório de compositores contemporâneos – como, aliás, o próprio Caldi, parceiro de Krieger e Campello. Composições dos três autores, mais Ana Paula Horta, se juntaram no disco a releituras de "Foi no Mês Que Vem", de Vitor Ramil, e "Na Beira do Rio", de Chico Pinheiro, e de duas presenças estrangeiras, "Caramel", de Suzanne Vega, e "Madre Tierra", de Jorge Drexler.

"Com o tempo, fazendo a pesquisa de repertório, fui vendo que estava realmente com um material muito bom de contemporâneos amigos, conhecidos ou amigos dos amigos", diz Beatrice. Para reunir esse material, seguiu mais uma vez o conselho de Roberta: "Ligue para os compositores e se apresente, diga que você está procurando repertório, que funciona".

Mosaico

O disco começou independente, ganhou a parceria do selo Centro Cultural Carioca Discos depois de pronto e, por fim, a distribuição pela Universal. Foi batizado de Mosaico por mirar uma variedade de estilos musicais. "Eu queria uma sonoridade com um colorido que não fosse monótono e repetitivo", diz. Recorreu às particularidades de instrumentos divergentes. A tuba e a gaita, o pandeiro, o piano e o acordeão encontram programações eletrônicas, responsáveis pelo toque contemporâneo do conjunto.

Não segue, porém, exatamente a mesma linha de cantoras como Roberta Sá e Mariana Aydar, e sua bem-sucedida química entre velho e novo. "Há um pessoal fazendo um trabalho muito bom de pesquisa e de mistura de sons tradicionais e contemporâneos. Talvez o que me diferencie é que eu não sou tanto do samba".

A voz límpida de Beatrice, educada pelo canto lírico, guarda ainda reminiscências da precisão técnica daquela época. "Apesar de dar muita importância à técnica, reconheço que a interpretação e a desenvoltura no palco são pontos fundamentais para a boa apresentação do trabalho", admite. O lado intérprete é o que ainda se mostra mais cru em Mosaico, um disco cujos pontos altos são mesmo os arranjos coloridos preparados por Rodrigo Campello. Sentimentos aparecem contidos, as intenções, suavizadas.

Ainda falando de acertos, o álbum revela uma ótima canção de Edu Krieger (que, a propósito, canta na faixa "Canto Só", de Raphael Gemal), "Lilly Blonde", escrita especialmente para Beatrice.

"Eu pedi a ele, anos atrás, uma ‘Lilly Braun’ para mim. Achei que não sairia nada dali, mas, dois anos depois, quando a seleção do repertório já estava bem adiantada, ele me mandou a música de presente por e-mail." A história da moça que não é "tão Madre Teresa nem tão Beyoncé Knowles", mas quer soltar seu "lado Blonde Lilly", tem graça e personalidade. GG1/2

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