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Casos policiais formam enredo de Um Toque de Pecado, de Jia Zhang-ke | Divulgação
Casos policiais formam enredo de Um Toque de Pecado, de Jia Zhang-ke| Foto: Divulgação

Uma pequena cidade litorânea da Côte d’Azur rouba a cena e se transforma em centro de irradiação cultural e celebração ao promover o mais icônico festival de cinema do mundo. Esta semana, passada a abertura vertiginosa proporcionada pelo turbilhão-flamboyant de O Grande Gatsby (lançamento brasileiro no dia 7 de junho), a 66.ª edição do Festival de Cannes entrou em seu ritmo normal e assim prossegue até o final, no dia 26.

Até quinta-feira, o brilho indiscutível foi do chinês Jia Zhang-ke com Um Toque de Pecado, que fez em seu país (a redundância é necessária) um raríssimo filme "baseado em fatos reais", todos ocorrências policiais – três assassinatos e um suicídio, ligados a casos de corrupção, abusos e outras distorções de comportamento social. A partir da crônica violenta desses acontecimentos, Zhang-ke entrega um filme importante para que se obtenha um retrato mais claro da vida contemporânea na China.

Com produção francesa, o iraniano Asghar Farhadi, diretor de A Separação, trouxe a Cannes O Passado, mais um drama sobre ruptura familiar. Ao contrário de seu multipremiado filme anterior, que discutia com efetividade as relações afetivas no casamento, desta vez Farhadi abusa de sua inegável capacidade dramatúrgica e constrói um filme com excesso de matizes, um patchwork de desdobramentos que parece não ter fim e que esvazia as melhores expectativas do espectador, buscando em demasia explicações para aquilo que, muitas vezes, se sabe estar por conta do inexplicável. Ainda assim, mesmo pecando na escritura, ele reforça a impressão de ser um grande diretor, especialmente ao dirigir seu impecável elenco.

Gerações

Curioso, o novo trabalho de Sofia Coppola que inaugurou a seção Um Certo Olhar. Quando as futuras gerações quiserem compreender como nós vivemos nesta aurora do século 21, nesta era inteiramente plugada e de privacidade zero, terão obrigatoriamente que dar uma boa olhada em The Bling Ring. O filme é baseado em reportagem de 2010 publicada na revista Vanity Fair, que relatou a onda de roubos cometida em 2008/2009 por adolescentes, estudantes tecnologicamente espertos, na região de San Fernando Valley, habitada por atores, modelos, ricos e famosos, como Paris Hilton, e que rendeu algo em torno de US$ 3 milhões em dinheiro, roupas e bens diversos.

Como todos os autores que se distanciam da mera condição de diretores de cinema, é através de seus personagens que Sofia Coppola fala de si mesma, o que ela vem fazendo desde sua estreia com As Virgens Suicidas. Sua proposta é interessante: indagar que geração é essa, que se mira no espelho de personalidades e quer se aproximar delas em roupas e atitudes para, afinal, ser exatamente uma réplica apenas de interesse midiático, uma vez que seus modelos também não são flores que se cheirem. The Bling Ring consegue passar com ironia, desencanto e a algum humor a ideia da vacuidade do que significa ser celebridade. O que não é pouco.

Acolhido com simpatia, Jovem e Bonita marca a volta à competição de Cannes, depois de 10 anos, do prolífico e nunca decepcionante François Ozon. O filme é um elegante, inteligente e bem-trabalhado estudo sobre a personagem Isabella, jovem mulher de 17 anos que percorre o espaço das quatro estações. Interpretado – melhor seria iluminado – pela manequim e atriz Marine Vacht, o filme mostra uma personagem que, como a belle de jour de Buñuel, se prostitui não porque precise de dinheiro ou goste de sexo. Ela rejeita uma moralidade convencional e transgride, talvez motivada pelo tédio. Há um preciso recorte familiar, o filme apenas parece patinar (uma revisão é obrigatória) na insistência em deixar sem muito amparo psicológico o comportamento blasé da heroína.

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