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Quem canta é Céu, a cantora de nome tão simples e vasto quanto sua música: "Minha natureza/ É mais que estampa/ É um belo samba/ Que ainda está por vir". Se esse samba que ainda está por vir viesse, como seria? De que compositor? Conjunto regional ou trio samba-jazz? Difícil dizer apenas ouvindo seu homônimo CD de estréia, que atiçou a curiosidade dos mais atentos ao ser lançado no fim de 2005. Mas o público carioca tem a oportunidade de procurar a resposta ao vivo. Depois de se apresentar em várias casas do circuito alternativo de São Paulo e na Europa (seu disco foi lançado antes lá), a moça de 25 anos faz seu primeiro show no Rio, cercada de expectativa, nesta terça-feira, no festival Humaitá Pra Peixe (saiba quem mais toca e quando ).

Mesmo ao vivo, não deve ser fácil dizer como será o tal samba que virá para sintetizar Céu. Mas dá para arriscar alguns palpites do que ele será feito.

- O que me interessa é a galera que vejo aqui em São Paulo: rap, Cidadão Instigado, Nação Zumbi, Instituto. Ouço também muito dub, afrobeat - lista Céu. - É engraçado, porque geralmente as pessoas me aproximam da MPB, que nem é o universo que eu busco. Na verdade, não sei bem qual é a minha prateleira (risos).

É claro, porém, que a tradição da música popular brasileira também a atrai, com nomes que vão de Nelson Cavaquinho a Villa-Lobos, passando por Elza Soares, Clara Nunes e (para equilibrar a exuberância das duas cantoras citadas com um toque de contenção) João Gilberto. Para quem ouve com atenção, todos esses artistas estão lá, do rap do Instituto à sensualidade de Clara. E o que é melhor: Céu faz isso sem nem passar perto do "ecletismo-de-cantora-de-MPB" que quase sempre gera CDs vazios de personalidade.

A unidade do disco passa pelos batuques (eletrônicos ou orgânicos), enfim, pelo groove que sustenta a maior parte das faixas, sob o comando do produtor Beto Villares.

- Adoro graves, a África e a maneira como sua música foi se desenvolvendo no mundo - explica a cantora , que também é autora (com ou sem parcerias) da maior parte das músicas do disco.

Assim, "Rainha" visita o afrobeat de Fela Kuti e o mojo de Moacir Santos - com bateria de Pupilo, do Nação Zumbi; as programações eletrônicas de Antônio Pinto (autor da trilha de "Cidade de Deus") ganham cara de batucada ancestral em "Ave cruz"; a base de rap de "Roda" serve de cama para a música melodiosa e a letra que cita Villa-Lobos (a guitarra é de Lúcio Maia, outro Nação Zumbi); scratches e cavaquinho dialogam com gosto na pop "Malemolência".

O disco inclui duas regravações: "Concrete jungle", de Bob Marley, e "O ronco da cuíca", de João Bosco e Aldir Blanc.

- "Concrete jungle" me faz pensar em São Paulo. E Aldir e João formam uma das maiores duplas de nossa música. A letra de "O ronco da cuíca" tem um peso incrível.

Caminhando então pela (estranha?) conexão São Paulo-África, Céu chega com originalidade ao populoso terreno das jovens cantoras de, vá lá, MPB. Sua trilha não é a de Marisa Monte, nem a de Maria Rita/Elis. Que siga.

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