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Maria e Aícha fazem par cômico com o qual é fácil se identificar | Divulgação
Maria e Aícha fazem par cômico com o qual é fácil se identificar| Foto: Divulgação

Contrariando o estigma de que a pesquisa teatral leva a espetáculos herméticos, Uma Vez, Nada Mais é uma prova viva de que a experimentação rende trabalhos palatáveis a todos os gostos.

Lotado pela metade – já que o primeiro bloco de assentos foi lacrado –, o Barracão EnCena recebeu as baianas Aícha Marques e Maria Menezes no último fim de semana com uma comédia que fez rir do começo ao fim.

O bom resultado da peça é totalmente calcado na representação corporal das atrizes, já que o espetáculo é mudo, com inspiração no cinema das primeiras décadas do século passado.

Quando Aícha entra em cena, o espectador enxerga Charles Chaplin. Os movimentos são velozes e exagerados, simulando a estética resultante da captação de imagens do cinema de comédia mudo, em que o uso de mais quadros por segundo resultava num efeito acelerado.

A atuação rendeu a Aícha o Prêmio Braskem de melhor atriz (o espetáculo também recebeu o principal prêmio). Seu personagem é uma costureira romântica à espera de um marido, cujo vilão é o telefone que não toca.

Maria não fica atrás com sua interpretação de uma noiva madame, cuja risada histérica – e muda – a chacoalha por inteiro e leva o público ao delírio. As longas conversas ao telefone com o noivo também encantam pelos beijos lançados ao bocal.

Mesmo sem palavras, surgem da relação entre as duas personagens conteúdos com os quais é fácil se identificar: o medo da solidão, a ansiedade nos relacionamentos, a inveja e a ira.

A narrativa ganha o reforço do áudio de músicas de época e radionovelas que simulam os folhetins dos anos 30 e 40 – como a história do sujeito que tem nove sobrinhas solteiras, a mais nova com 49 anos.

A mistura de eras continua quando o rádio emite uma trilha dos anos 80 e entra em cena uma telenovela moderninha. Quando as duas mulheres interpretam as novelas, em esquetes que ampliam o fator cômico, o único senão é o uso restrito do espaço cênico, que limita o resultado.

O anacronismo do vai e vem entre épocas funciona bem, tornando a brincadeira com a memória da interpretação cênica do século 20 um elemento consistente e deixando no ar um saudosismo bom. GGG

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