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Banda trocou as guitarras pelos sintetizadores nas canções do novo álbum | Divulgação
Banda trocou as guitarras pelos sintetizadores nas canções do novo álbum| Foto: Divulgação
  • CD - Comedown Machine - The Strokes. Sony/BMG. R$ 29,90. Rock

A primeira música de Comedown Machine, disco novo dos Strokes lançado ontem (e "vazado" uma semana antes), apareceu no site da banda em janeiro passado. "One Way Trigger" parecia desconstruir cada um dos elementos que fizeram dos Strokes uma banda fundamental na história recente do rock. Em vez de guitarras secas e marcadas, sintetizadores. O barítono arrastado de Julian Casablancas dava lugar a um falsete piegas e azucrinante. No lugar de tentar emular Velvet Underground, eles pareciam uma banda de casamento tocando um cover acelerado de "Take on Me", do A-ha. Falou-se até em "tecnobrega paraense".

Comedown Machine soa alienígena e bizarro porque faz uso do estilo musical de uma década intelectualmente repulsiva (e estigmatizada no âmbito artístico de cultura de massa como sendo superficial), os anos 1980. O legado cultural dessa década é quase sempre apreciado de modo irônico e desprovido de qualquer valor que não a nostalgia juvenil.

Isso explica porque Comedown Machine recebeu tratamento tão pejorativo: o solo de guitarra em "Tap Out" (que abre o disco) é "Human League demais", e ninguém que deseja ser levado a sério deveria sucumbir a Human League, a versão inglesa do Trio Los Angeles.

Soar como A-ha e não deixar claro que se trata de uma piada faz sentido apenas se você mora na Noruega, tem 36 anos, toca numa banda de final de semana com seu cunhado e ainda lê histórias em quadrinhos. O provável segundo single do álbum, "Welcome to Japan", lembra Technotronic em sua melhor forma e não se pode jamais, em sã consciência, admitir a influência de algo tão tosco como Technotronic (do hit "Pump up the Jam").

O desapontamento generalizado com o álbum, bem como a rapidez com que ele foi descartado como sendo um Strokes "menor", sugere o seguinte: é como se público e crítica estivessem esperando algo como o novo filme de Darren Aronofsky (de Cisne Negro), mas acabassem vendo Clube dos Cinco, de John Hughes (um clássico de 1985 dos "filmes de adolescentes", repetido à exaustão em sessões da tarde dos anos 1990).

Parentesco

Embora seja considerado um cineasta "menor" por fazer sucesso com filmes sobre o estranhamento e a ansiedade juvenis na entrada da vida adulta, Hughes definiu como poucos uma geração, a dos anos 1980 (também chamada de Geração X). E fez isso com histórias de personagens que pareciam não ter nada de extraordinário para contar.

Para entender o parentesco artístico entre Comedown Machine e o cinema de Hughes basta selecionar algum trecho de Clube dos Cinco em que a trilha sonora faz as vezes de fio condutor para a trama, tirar o áudio e substituir por alguma faixa do novo disco dos Strokes. A ordem cronológica do álbum funciona muito bem: o começo do filme poderia igualmente fazer uso da primeira música, "Tap Out", com seu climinha Michael-Jackson-dançando-de-luvas-brancas perfeito para estampar o nome do filme em letras garrafais.

Já a cena em que os cinco adolescentes dançam na biblioteca da escola – na qual são forçados a passar um sábado inteiro por mau comportamento – pode ter a música original substituída por "50 50", quinta faixa do álbum. Fica até difícil acreditar que eles não estão dançando ao som dos Strokes.

O fim, em que os jovens voltam para casa transformados, poderia muito bem usar uma das melhores canções do disco, a deliciosa "Happy Ending", e não deixaria nada a desejar para a original e não menos esperançosa "Don’t You (Forget about Me)", dos Simple Minds.

Talvez os Strokes de Co­medow Machine sejam isso mesmo: uma banda de trilha sonora para filmes adolescentes dos anos 80. Talvez agora eles estejam mais para John Hughes/A-ha do que para Darren Aronofsky/Velvet Underground. Eles soam como se estivessem se divertindo de verdade. E não há nada de errado nisso.

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