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 | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

Faz sol em Curitiba. Foi uma semana inteira assim, para a surpresa daqueles que não sabiam muito bem como reagir a uma sequência rara e implacável de dias de céu azul. E então, empolgadas com os últimos eventos na cidade, pessoas saíram às ruas, ainda mais. Na XV, houve um desfile de guarda-chuvas, "licença", que, "opa", de súbito se transmutaram em guarda-sóis. Havia chopes nas mesas, suando ao contrário, de tão gelados. E sol.

Nesta semana, veja só, o vizinho me deu bom dia e, numa atitude repentina e inesperada, segurou a porta do elevador. Vitamina D.

Mas algumas coisas não mudam, mesmo que Curitiba vire do avesso. Os congestionamentos na Vicente Machado, por exemplo – que agora tem asfalto novo e lisinho para não sei quem usar, já que todos ficam parados como poste.

Ali, motoristas de carros velhos ligaram o ar no 2, mas, puxa, a coisa pareceu ficar ainda pior. Tentaram o nível 3 e o ar era quente, um verdadeiro budum. Então abriram toda a janela, a ventarola, colocaram os braços para fora e bufaram, insatisfeitos, mas compreensivos.

Motoristas de carros novos, por sua vez, ligaram o ar condicionado, fecharam os vidros insufilmados e mantiveram o foco no trânsito, empacado. Claro que com a ajuda de uma garrafinha de água gelada, porque ninguém é de ferro. Uma buzina aqui, outra ali. E sol.

Durante a semana, saíram às ruas bicicloativistas sem camisa, que apreciavam o vento na cara, sim, mas tinham também de limpar a testa do suor salgado. Durante estes sete dias, os ônibus, os grandes, os mais modernos e maiores ônibus do mundo, bem que poderiam estar sem janelas. Na verdade alguns deles quase as perderam, tamanho o esforço de passageiros suados e encaixotados em fazer com que mais vento entrasse, forçando as vidraças, inclusive as de emergência. Em um ato de desespero, veja você, leques foram vistos balançando por aí, para a surpresa de quem nunca viu esse ventilador manual e egoísta.

Até as baratas acusaram os muitos graus. Não suportando a quentura dos subsolos, os insetos arriscaram suas antenas nas calçadas de petit-pavé, ora enfrentando uma fresta, ora escalando uma calçada solta. Até serem esmagados (sem querer) por algum sapato bem lustrado, preto e quente, elegantemente quente. Porque sol fazia.

Nas canchas de futebol, a pelada da gurizada durou menos essa semana. Muito sol faz mal pra cabeça, dizem as mães. Mais ainda para quem não está acostumado a tanta quentura, a quem sempre leva uma malha na mochila para se proteger do vento frio do fim de tarde. Mas não, parecia que fazia sol até à noite.

Olho para fora agora e vejo que não há uma nuvem sequer no céu, que brilha. Sinal de que o bom tempo continua. Penso se seria mais fácil viver em Curitiba se todo dia fosse assim, marcado por esse calor dos infernos. Em um exercício futurista, imagino uma piscina no bondinho, vendedores ambulantes oferecendo o kit protetor solar/ pão com verde e o Oil Man finalmente fazendo jus aos seus trajes mínimos.

Não haveria mais cachecol, sobretudo e tênis molhado. Seria uma vida sem cinza e sem aqueles pisões nas calçadas soltas, que sempre mancham a calça com sua água barrenta. Imagine Curitiba sem alagamentos, sem queda de energia. Sem aquele cumprimento protocolar que se inicia com "tá frio, né"? Curitiba não seria a mesma, entretanto, sem uma cara carrancuda a nos observar, sem o vazio nas ruas digno de um domingo zero grau, aqueles em que se come pinhão na chapa. Mas calma. Faz sol, muito sol. Ao menos por enquanto.

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