• Carregando...

Tem tanto extremista! Algum abre a boca e já vejo logo que é mais um daqueles para quem tudo é extremo: está extremamente feliz, ou extremamente isso ou aquilo. Num discurso, comecei a contar no terceiro "extremamente", e foram onze, quanto extremismo! Mas a pessoa que discursava era a imagem e a voz do conformismo e da medianidade...

Querendo expressar intensidade, repetem essa expressão que, de tão repetida impensadamente, fica extremamente insignificante. É o chamado chavão, lugar-comum ou idéia feita, palavras vazias porque ditas sem pensar nem sentir.

Alguém fala pela primeira vez, numa entrevista de tevê, e pronto, como praga a expressão se espalha.

"A sociedade como um todo" (mas a sociedade só pode ser como um todo, a palavra sociedade já quer dizer totalidade).

"A nível de" é expressão que não ofende a lógica, mas reduz tudo a uma visão nivelada. Tudo está num nível, como se a realidade fosse feita de níveis empilhados. E todos se nivelam quando falam a nível de.

É que a língua procura o menor esforço, a acomodação, o piloto automático das expressões feitas, em vez do trabalho (e do prazer) de pensar para falar. Mas acontece também que esse automatismo, se é útil e bom quando dirigimos um carro, na comunicação leva ao desastre de falar e não dizer; ser ouvido mas não sentido; entendido, mas não lembrado; tocando a superfície sempre mas nunca o fundo.

A simplicidade pode dizer mais. Se alguém diz que está muito feliz, com os olhos brilhando, diz muito mais que quem se diz extremamente feliz com os olhos indiferentes...

Mas quem diz mesmo é a originalidade, dizer de forma diferente a emoção a cada situação:

- Estou feliz como um passarinho num céu de primavera!

Não será esquecido quem confessar felicidade assim. Mas quem se diz extremamente feliz...

Imagine a Segunda Guerra, com a Inglaterra prestes a ser invadida pela Alemanha, e então Churchill falando ao povo:

– Não vos prometo nada além de uma luta extremamente ferrenha, com sacrifícios extremos, muitas provações...

As palavras entrariam por um ouvido do povo e sairiam pelo outro. Mas o que ele disse foi:

– Não vos prometo mais do que sangue, suor e lágrimas!

Então o povo soube que era uma situação a ser enfrentada com todas as forças e toda a alma. Mais que o desgaste das tropas, foi aquele discurso que fez Hitler adiar a invasão da Inglaterra. Não será fácil, pensou. Depois a situação mudou e a invasão nunca aconteceu.

Agora imagine César dizendo, em vez do famoso "vim, vi, e venci":

– Realmente, chegamos até aqui, examinamos detidamente a situação e, diante da conjuntura com que deparamos, tomamos as decisões corretas, apoiados pela liderança de nossos generais e pela bravura de nossos soldados, e enfim conseguimos a vitória.

Ora, quem chega, só pode chegar onde está, aqui. Só se examina detidamente, ou não seria exame mas observação. Quem está diante duma conjuntura, não precisa repetir que está deparando com ela. Quem toma decisões, supõe que sejam as corrretas. Generais são sinônimo de liderança, outra repetição. Se César falasse assim, não pensaria como César, não teria sido César.

Napoleão, diante das Pirâmides, disse à tropa:

– Soldados, diante dessas Pirâmides, quarenta séculos vos comtemplam!

Se algum soldado tinha dúvidas de porque lutar nas areias da África, ali sentiu-se justificado, grande conquistador não daquele país pobre, mas de quarenta séculos! Imagine se Napoleão dissesse:

– Soldados! Fiquemos extremamente felizes por conquistar um país cuja História remonta a mais de 4 mil anos, conforme demonstram essas Pirâmides!

Em casa (ou no âmbito familiar, como diria um extremista) a comunicação também emperra quando o pai diz ao filho:

Estou falando para o seu bem! No meu tempo...

Claro, para o mal é que não falaria. E o tempo do filho é este, não aquele. Mas o pai aponta o dedo, o filho vira as costas. Imagine se o pai mudasse o tom e o estilo:

– E aí, cara, chegando de madrugada de novo, hem? Ouviu o que o galo cantou?

E o que é que o galo cantou, pai?

É ho-ho-ho-ho-ho-hooooora!

Hora do que, pai?

– Hora de pensar no tempo, cara, na vida. Cada madrugada acordado é uma manhã perdida... Você não ia fazer um curso de manhã pra conseguir aquele emprego?

Mas a conversa pode dar em nada se o filho responder que sim, está extremamente preocupado com o emprego mas...

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]