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A relação entre os homens e as máquinas sempre renderam ficções fantásticas, desde Tempos Modernos, de Chaplin, ao computador de 2001 – Uma Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick, inspirado em conto de Arthur C. Clarke.

As máquinas despertam em nós um medo apocalíptico.

E são dissimuladas. Basta prestarmos atenção nas maquinetas, os celulares, que hoje estão nas mãos de todos os viventes e que parecem inofensivas diante do tamanho daquelas que engoliram Chaplin.

De tanto ver gente com um celular grudado no ouvido – na rua, no elevador, nos restaurantes, nos automóveis, nas caminhadas – concluí que um dia, por formidável mutação genética, os seres humanos nascerão com um ouvido que sofreu um upgrade evolutivo. O ouvido será dotado de discagem à distância, recepção de sinais eletrônicos, e o ser humano se transformará em seu próprio celular, tablet ou notebook. Nascerá com um celular ao lado do rosto. Talvez nos dois lados, pois o número de celulares supera o de mortais.

Notável revolução. Dispensaria o uso de braços e mãos, livres não para amores e carícias – coisas arcaicas em tempos futuros – mas para digitar e cutucar telas.

Lembro que um cientista anunciou que o cérebro humano, com o tempo e o uso excessivo, se atrofiaria, crescendo demasiado. A cervical humana se curvaria e os homens andariam com a cabeça jogada para trás pelo peso. Espero que tal coisa não aconteça, como é destino de todas as profecias. Como sabemos, 2010 não foi o ano em que fizemos contato, a não ser que certas figuras hoje na direção do mundo tenham vindo de outras galáxias.

Mas acho que errei com essa história do crescimento do cérebro. Está visto que o cérebro não parece ter sido o órgão humano que mais cresceu nos últimos tempos. Ombros, coxas, bundas, seios, pescoços, bíceps é que têm se avolumado de modo notável.

Quem mudará serão os celulares, pois a cada dia incorporam novas funções – jogos, calendário, máquina fotográfica, despertador, internet, e-mail, redes sociais, caixinha de música, caixa de endereços, controle de televisão, de eletrodomésticos, de casas informatizadas etc. etc. Serão criaturas capazes de fazer tudo. Degustar vinhos, por exemplo. Escolher a cara metade. Selecionar óvulos e espermatozoides. Levar o usuário ao orgasmo. Organizar antologias de poetas românticos. E desenvolverão tato, olfato e visão, no mínimo.

Não crescerão em pernas e braços, coisas arcaicas. Flutuarão no ar, livres como pássaros e darão ordens aos humanos. Nada de novo. Já fazem isso. Já vi casais em restaurantes, frente a frente, mergulhados na telinha, digitando coisas. Não ligam para a comida, que pode ser qualquer uma, nem olham para o garçom, que parece ser sempre o mesmo. Falem um com o outro via Facebook.

E assim continuará até que, cansados das humanas imperfeições, os celulares nos trancafiarão num gueto, tomando conta do mundo.

Talvez seja a nossa salvação. Reaprenderemos a conversar sem celulares e, quem sabe, poderemos retomar as rédeas do planeta. Há alguma esperança.

O diabo é que essas maquinetas têm hordas de aliados.

Não vai ser fácil.

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