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Remexendo uns guardados em busca de recortes de jornais dos anos 60, abrindo e fechando pastas que se encontram na mais perfeita bagunça, dei com uma pilha de exemplares do jornal Correio de Notícias, publicados em junho de 1990. Errei por trinta anos, mas fiz um acerto com minhas memórias.

Por que guardara aqueles jornais?

Desmontei a confusão de páginas e descobri que se tratava do suplemento Jornal da Copa e do Copo, através do qual o caderno Bom Domingo acompanhou a Copa de 90, de triste memória. A Seleção da Copa era a do Lazaroni, o que já indicava que algo de errado iria acontecer. A Seleção do Copo era formada pelos diversos colaboradores: Reinoldo Atem, Edival Perrini, Luiz Geraldo Mazza, Valêncio Xavier, Francisco Camargo, Carlos Sanches, Ernani Buchmann, José Oliva, Werneck, Luiz Groff, Key Imaguire, Setto e este cronista – além de outros que não cito porque só tenho três dos cadernos; considerem-se todos citados. A Seleção do Copo prometia, como se vê.

Foi quando me lembrei da editora do Caderno e inventora da Seleção do Copo, a Rosirene Gemael. Esqueci a Copa e os pernas-de-pau do Lazaroni, entre eles um certo Dunga, de triste memória e que nos dias atuais me esforço para acreditar que seja treinador da seleção brasileira.

Fiquei me perguntando: onde andará a Rosirene? Jornalista agitada, editora criativa, texto competente, a Rosirene aparecia depois de um telefonema – hoje, os jornalistas no máximo telefonam. Aliás, já nem telefonam: passam e-mail.

Mas, voltemos ao que importa, no caso, a Rosirene. Ela acendia o primeiro cigarro e enchia o ambiente de fumaça, colocando no ar uma certa eletricidade que decorria de sua inquietação, de sua curiosidade, do seu prazer em fazer jornal.

Por onde andará?

Quase 20 anos depois, acendo um cigarro em homenagem a Rosirene. No meio da nuvem cinza, minha memória – acostuma­da a vadiagens – vai materializando outras criaturas que co­­nheci nestas andanças feitas de teclado, papel e tinta.

Lembrei do Oscar Volpini e da revista Panorama do início dos anos 1980. Ninguém pode imaginar algo mais surreal do que a revista Panorama daqueles tempos. Pois o Volpini, o editor, me recebia dando aquele sorriso enorme de sempre. Nunca parecia estar ocupado, afobado, aflito, estas coisas que jornalistas costumam cultivar. Sorria, contava causos, ouvia, e eu deixava com ele a crônica para a última página da revista, enquanto num sofá da sala o diretor da revista, senhor engravatado e pequenino, um cigarro apagado entre os dedos, ressonava. No mês seguinte, lá estava eu novamente, crônica em punho, enquanto o Volpini sorria. Ao lado, no sofá, o diretor ressonava.

Há alguns meses, encontrei o Volpini num café da Santos An­­drade. Continua sorrindo, agora ainda mais tranqüilo, aposentado. Quanto ao diretor, nem me atrevi a perguntar.

Outro a quem eu ia levar meus textos era o Reinaldo Jar­dim. Final dos anos 1970, ele publicava um pequeno jornal chamado Pólo Cultural. Lembro apenas de um cubículo ao fundo de uma gráfica, já não sei onde. Lá estava o Reinaldo, como se fosse um monge, trajando uma espécie de guarda-pó. Silencioso, concentrado. Eu, que tinha por aquela figura monástica, um renovador do jornalismo brasileiro, um respeito que me mantinha de bico calado, entregava a crônica, recebia uns trocados e sumia até o mês seguinte.

Mergulhado nessas memórias de papel jornal, lembrei do dia em que conheci o Mazza, o feroz, o implacável e admirável Luiz Geraldo.

Eu publicara meu primeiro livro e fui levá-lo no Canal 12 pa­­ra cavar uma divulgação. O Mazza me mediu de alto a baixo com sólido ceticismo, perguntou pelo livro, que passei as suas mãos sem que ele mostrasse muito entusiasmo; nem o abriu. Comentou que o título era interessante, irônico, curioso. "Críti­­ca da razão tupiniquim, resmungou ele. Do que se trata?" Mal costurei uma frase de explicação, ele me brindou, na meia hora seguinte, com uma longa dissertação a respeito do meu livro e do que ele pensava daquilo que achava que eu havia escrito. Era o Mazza.

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