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 | Miguel Nicolau/Especial para a Gazeta do Povo
| Foto: Miguel Nicolau/Especial para a Gazeta do Povo

Talvez o que mais delimite Portugal seja a comida. Sentimos a força do país nos seus pratos, que guardam uma gramática gustativa própria. Até na última cidade da fronteira com a Espanha, um ou outro ingrediente pode mudar de nome, influenciado pelo castelhano ou pelo galego, mas o gosto e o modo de preparar os pratos continuam sendo marcadamente portugueses. Muito azeite, muita batata, muita cebola, couves e broas.

O bacalhau, logicamente, domina esta área, porque o bacalhau não é apenas um prato típico, integrado ao paladar nacional, ele esta ligado à épica da navegação, identidade maior dos portugueses. Primeiro houve toda uma tradição de pesca desta espécie, levando os homens a se afastarem cada vez mais da costa ibérica. Foi nos barcos pesqueiros que os portugueses se fizeram mestres do mar.

Um ano no país, já temos uma lista de preferências no distrito de Braga.

Em Ponte de Lima, no restaurante Vaca das Cordas, referência a uma festa de touro que acontece na cidade, encontramos o melhor bacalhau com broa – um pão de milho rústico, que é esfarelado e cobre o lombo de bacalhau, levado ao forno com purê de batata, azeite e com grelos (umas folhas de nabo, couve ou nabiça).

Embora tenha comido em vários lugares polvo a lagareiro (assado com azeite, batatas, grelos e cebolas), todos razoavelmente bons, dois me conquistaram: do Dan José, em Guimarães, e o de Dona Júlia, aqui no morro de Falperra, de onde se tem uma vista fabulosa da região.

Nem só de culinária tradicional vive o ramo. Eu, que não sou propriamente um fã de hambúrguer, viciei-me nos sanduíches artesanais do Dgema. Todos maravilhosos, e com nomes e ingredientes da cultura local: “Tou barado”, “Mais belho que a Sé”, “Que grande mourrinha”, “Penico do céu”, etc.

Ainda no quesito inovação, temos as francesinhas – originalmente são do Porto. Um sanduíche em pão de forma, ingredientes típicos, nadando em molho de tomate apimentado, com um ovo mole por cima. Vai ao forno e chega pelando à mesa. É consenso como melhor francesinha de Braga a da Taberna Belga.

Há também as comidas de tasca. A nossa preferida é a Tasca do Carregal, na estrada para Taipas. Ali, em pequenas porções, vamos viajando por sabores portugueses: espetados (espetinhos) de polvo, lula e chouriço picante; favas com chouriço, feijoada branca e o nosso prato predileto – lasanha de bacalhau, que se desmancha na boca. A tasca é uma memória viva da região, com uma exposição de objetos antigos. Comemos sempre em uma mesa que fica no antigo lagar de granito, onde se pisava o uva para fazer o vinho. Os donos, Patrícia e Luis, se tornaram nossos amigos.

Em Póvoa de Lanhoso, batemos ponto no restaurante Vítor, numa aldeia minúscula e linda, São João de Rei. Chegamos a ela por acaso, em uma de nossas excursões rurais. E a descobrimos outrora frequentada por Jorge Amado, para quem aquele era o melhor bacalhau assado na brasa do mundo.

– Vocês gostam do bacalhau do Vítor? Já estão portugueses de gema... – brincou uma amiga que tem casa numa aldeia ao lado, Brunhais.

Miguel Sanches Neto tem 35 livros publicados. Ele vive em Braga e escreve a série “Cartas de Portugal” para a Gazeta.
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